Para quem vive fora da America do Norte, hamburguer eh praticamente sinonimo de McDonald's. Isto significa sanduiche sem graca, gorduroso, com um sabor que beira algo entre plastico e borracha. Quando se conhece mais profundamente o que eh um verdadeiro hamburguer, o gosto muda e a experiencia se intensifica.
Aqui no Canada existem restaurantes especializados na iguaria, nos quais fica dificil ateh escolher os ingredientes, entre os diversos tipo de carne, queijos e molhos sem fim. Ateh o simples hamburguer que se compra congelado para preparar em casa tem algo de excepcional, como o que acabo de devorar agora, com carne defumada, estilo barbecue feito com lenha de hickory. Para acompanhar, nada mais do que o pao, queijo Cheddar, catchup de boa qualidade e mostarda Dijon. E basta, eh alegria geral.
Crônicas e comentários de Danilo Menezes. Jornalista brasileiro da Bahia, atualmente morando em Toronto, Ontario, Canada.
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6.8.12
12.5.12
O cheiro e o mau cheiro
Não lembro se foi alguém que comentou comigo, ou se li em algum lugar. Cada estação do ano tem um cheiro diferente. Eu nunca tinha percebido isso, até que essa impressão me veio forte nos últimos dias, ao caminhar pela cidade e sentir um aroma diferente.
Não sei dizer se era bom ou ruim. Acho que o cheiro vinha do pólen recém-nascido nas árvores e flores. Ou talvez seja o cheiro dos brotos de alguma árvore em particular, que me fazia lembrar vagamente o aroma de palha molhada. Então isso pode ser agradável ou não, a depender de cada nariz. O cheiro invadia as ruas e era como se estivesse marcando a instalação da primavera e afirmando que o verde chegou definivamente para ficar. Pelo menos pelos próximos sete meses.
Em outro local, em uma das ruas na rua por onde caminho para chegar em casa, neste época em que a temperatura começa a subir, sempre há um cheiro adocicado e agradável que todo ano chega junto com a primavera. Lembra o cheiro de lírio, mas é mais forte. Parece ocupar a rua inteira. Olho para as árvores, suspeito que seja uma variedade com pequenas flores brancas. Naquela rua estreita e residencial há varios exemplares dessa espécie, então é bem provavel que seja ela a reponsável pelo cheiro.
Se a primavera é a estacão das flores, para mim tambem é a estação dos perfumes. Flores e cheiros estão intimamente ligados, não é nenhuma novidade. Mas não conseguiria dizer se as demais estações teriam cheiros, como ouvi alguém afirmar, ou li em algum canto. Não consigo sentir cheiro da neve. No entanto, percebo o cheiro marcante da chuva na terra seca e quente, por exemplo. O mais marcante da neve é o barulho que faz quando se anda sobre ela. Para quem nunca teve a experiência, é semelhante ao som de pisar na areia fofa da praia.
Neste país de clima frio, as sensações térmicas na pele falam mais forte que os aromas, principalmente quando se está ao ar livre. A sensação de umidade do outono e a secura dos ambientes fechados no inverno são muito marcantes. A secura é provocada pelos aquecedores e pelo vento frio que resseca e parte os lábios,
E, para piorar a época fria, com a pequena circulação de ar, em ambientes fechados e com pouca ventilação, qualquer cheirinho vira uma explosão. Os canadenses são bem tolerantes a tudo mas detestam cheiros fortes. Em muitos locais de trabalho, como hospitais, por exemplo, os perfumes são proibidos. Até o cheiro da comida é criticado. Os indianos, pobres coitados, com seus condimentos e aromas fortes, que invadem os ambientes e mudam o cheiro da pele, vivem sob o exame cuidadoso e detalhado dos chatos de plantão.
Então todo mundo toma - ou deveria tomar - muito cuidado com os cheiros corporais. E com os incidentes. Qualquer pum vira um torpedo nuclear de grandes proporções na nação canadense.
Não sei dizer se era bom ou ruim. Acho que o cheiro vinha do pólen recém-nascido nas árvores e flores. Ou talvez seja o cheiro dos brotos de alguma árvore em particular, que me fazia lembrar vagamente o aroma de palha molhada. Então isso pode ser agradável ou não, a depender de cada nariz. O cheiro invadia as ruas e era como se estivesse marcando a instalação da primavera e afirmando que o verde chegou definivamente para ficar. Pelo menos pelos próximos sete meses.
Em outro local, em uma das ruas na rua por onde caminho para chegar em casa, neste época em que a temperatura começa a subir, sempre há um cheiro adocicado e agradável que todo ano chega junto com a primavera. Lembra o cheiro de lírio, mas é mais forte. Parece ocupar a rua inteira. Olho para as árvores, suspeito que seja uma variedade com pequenas flores brancas. Naquela rua estreita e residencial há varios exemplares dessa espécie, então é bem provavel que seja ela a reponsável pelo cheiro.
Se a primavera é a estacão das flores, para mim tambem é a estação dos perfumes. Flores e cheiros estão intimamente ligados, não é nenhuma novidade. Mas não conseguiria dizer se as demais estações teriam cheiros, como ouvi alguém afirmar, ou li em algum canto. Não consigo sentir cheiro da neve. No entanto, percebo o cheiro marcante da chuva na terra seca e quente, por exemplo. O mais marcante da neve é o barulho que faz quando se anda sobre ela. Para quem nunca teve a experiência, é semelhante ao som de pisar na areia fofa da praia.
Neste país de clima frio, as sensações térmicas na pele falam mais forte que os aromas, principalmente quando se está ao ar livre. A sensação de umidade do outono e a secura dos ambientes fechados no inverno são muito marcantes. A secura é provocada pelos aquecedores e pelo vento frio que resseca e parte os lábios,
E, para piorar a época fria, com a pequena circulação de ar, em ambientes fechados e com pouca ventilação, qualquer cheirinho vira uma explosão. Os canadenses são bem tolerantes a tudo mas detestam cheiros fortes. Em muitos locais de trabalho, como hospitais, por exemplo, os perfumes são proibidos. Até o cheiro da comida é criticado. Os indianos, pobres coitados, com seus condimentos e aromas fortes, que invadem os ambientes e mudam o cheiro da pele, vivem sob o exame cuidadoso e detalhado dos chatos de plantão.
Então todo mundo toma - ou deveria tomar - muito cuidado com os cheiros corporais. E com os incidentes. Qualquer pum vira um torpedo nuclear de grandes proporções na nação canadense.
12.3.12
Sabores que rodam o mundo
Ainda não foi por agora que a famosa comida da Etiópia passou a fazer parte do rol das minhas experiências gastronômicas. Mais uma vez o tal restaurante estava fechado. Para as férias de março. Eu nunca ouvi falar nessas férias.
Os donos do restaurante não devem ser bons administradores, de acordo com o que li em comentários na internet. Em um deles, a pessoa anotava que o atendimento não era bom, apesar da cozinha "de diamante". Ele dizia ainda que se o restaurante se preparasse para vender comida para levar para casa, como é bem comum por aqui, poderia ganhar uma fortuna. Mas talvez isso faça a diferença do local. O modo slow food. Comida lenta e bem feita.
Já que a comida etíope estava de férias, talvez tenha ido passear nas suas origens africanas, fiquei em dúvida entre os galetos assados portugueses - e seus pratos gigantescos - ou a "cozinha caribenha de Pam", que eu já havia provado e aprovado. Fui visitar a simpática madame Pam, originária da Guiana, que se apoderou da cultura do Caribe para ganhar os seus trocados. Tudo bem, a Guiana está ali na beira do Mar do Caribe, faz parte da liga dos países da região, mas será que o Brasil também não poderia requisitar do mercado turístico a sua porção caribenha?
O pouco lembrado Amapá está ao lado da Guiana francesa, tem um litoral gigantesco, mas, pelo que pude pesquisar, já que nunca andei por aquelas terras, o Estado não incorpora elementos da cultura do Caribe. O prato mais forte é o tacacá, típico da regiao norte. Dominante como a cultura brasileira é, a feijoada e o churrasco devem ser mais comum por lá do que o "jerk chicken" caribenho. O Estado brasileiro que parece mais dialogar com o Caribe é o Maranhão, com a intensa paixão popular pelo reggae jamaicano.
Na cozinha de Pam provei o prato principal da casa: o roti. Uma espécie de crepe recheado com opçoes de carne, frango, camarão ou legumes, com batatas, grão-de-bico e bastante temperado. O sabor do cominho (ou seria curry?) é bem intenso. Pedi a versao jerk chicken e, como da vez anterior, aquele molho escuro do frango estava delicioso. O "envelope" de roti é muito bem feito, o molho não encharca o invólucro nem vaza.
Fui buscar mais informaçoes sobre o roti. Na verdade é um pão sem fermento, de origem indiana, que recobre o que achei com cara de crepe. As Guianas, tanto inglesa, como holandesa e francesa - isso é algo novo para mim -, receberam muitos imigrantes chineses e indianos. Os sabores indianos passaram a fazer parte da cultura da América do Sul. Então ficou explicado o sabor apimentado e marcante de curry que havia no prato.
Barriga cheia, mas sempre existe espaço para o café e o doce. E, em plena região portuguesa, nada mais imediato do que pensar em pastel de nata, acompanhado pelo café expresso da padaria. Voltei para casa carregando um daqueles sacos de papel marrom cheio de pães portugueses, crocantes por fora e macios por dentro, como os das melhores padarias brasileiras. Mas com um sabor de qualidade portuguesa dificil de copiar.
Os donos do restaurante não devem ser bons administradores, de acordo com o que li em comentários na internet. Em um deles, a pessoa anotava que o atendimento não era bom, apesar da cozinha "de diamante". Ele dizia ainda que se o restaurante se preparasse para vender comida para levar para casa, como é bem comum por aqui, poderia ganhar uma fortuna. Mas talvez isso faça a diferença do local. O modo slow food. Comida lenta e bem feita.
Já que a comida etíope estava de férias, talvez tenha ido passear nas suas origens africanas, fiquei em dúvida entre os galetos assados portugueses - e seus pratos gigantescos - ou a "cozinha caribenha de Pam", que eu já havia provado e aprovado. Fui visitar a simpática madame Pam, originária da Guiana, que se apoderou da cultura do Caribe para ganhar os seus trocados. Tudo bem, a Guiana está ali na beira do Mar do Caribe, faz parte da liga dos países da região, mas será que o Brasil também não poderia requisitar do mercado turístico a sua porção caribenha?
O pouco lembrado Amapá está ao lado da Guiana francesa, tem um litoral gigantesco, mas, pelo que pude pesquisar, já que nunca andei por aquelas terras, o Estado não incorpora elementos da cultura do Caribe. O prato mais forte é o tacacá, típico da regiao norte. Dominante como a cultura brasileira é, a feijoada e o churrasco devem ser mais comum por lá do que o "jerk chicken" caribenho. O Estado brasileiro que parece mais dialogar com o Caribe é o Maranhão, com a intensa paixão popular pelo reggae jamaicano.
Na cozinha de Pam provei o prato principal da casa: o roti. Uma espécie de crepe recheado com opçoes de carne, frango, camarão ou legumes, com batatas, grão-de-bico e bastante temperado. O sabor do cominho (ou seria curry?) é bem intenso. Pedi a versao jerk chicken e, como da vez anterior, aquele molho escuro do frango estava delicioso. O "envelope" de roti é muito bem feito, o molho não encharca o invólucro nem vaza.
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Era a cara desse da foto. Bom, né? |
Barriga cheia, mas sempre existe espaço para o café e o doce. E, em plena região portuguesa, nada mais imediato do que pensar em pastel de nata, acompanhado pelo café expresso da padaria. Voltei para casa carregando um daqueles sacos de papel marrom cheio de pães portugueses, crocantes por fora e macios por dentro, como os das melhores padarias brasileiras. Mas com um sabor de qualidade portuguesa dificil de copiar.
3.2.12
Receita de família
Delícia das delícias! Receita
de família, típica da região cacaueira, herança da terra, modo de
preparo com a "tecnologia" dos índios, misturada com o dendê afro-baiano,
folha de bananeira embalando o pescado do rio Cachoeira. Prato cantado em
prosa por Jorge Amado, receita resgatada por sua filha Paloma, passada
de geração em geração, alegria de domingos, de família reunida, imagem
de um tempo que a memória não deixa ir embora. Prato de resistência dos
Cardoso. Recordação de vários daqueles que já se foram, que tanto nos
amaram e que tanto amamos. Para quem não conhece, a famosa, a inesquecível, a sublime Moqueca de peixe na folha, que merece letra maiúscula.
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Foto: Veronica Barreto |
28.9.11
Os santos gêmeos
As lembranças sao intimamente ligadas aos sentidos: aromas, sabores, imagens, sons, sensaçoes táteis. Talvez as recordaçoes que restem mais intensas sao ligadas a comida. Cozinhar, ou mesmo ofertar alimentos para outras pessoas, é um ato de bondade e generosidade. A mae passa amor e proteçao aos filhos quando oferece o que comer. E essa impressao parece ficar registrada no cérebro indefinidamente. Quem oferece um banquete, além de ampliaçao de relaçoes diplomáticas e celebraçao do prazer de festejar, está abrindo as portas da casa e também da alma.
A cozinha da Bahia e os seus pratos dourados pelo dendê vao além do simples prazer. A maior parte das receitas tem origem nas oferendas aos deuses do candomblé. Cada orixá tem as suas preferências e cabe aos devotos agradar da melhor maneira possível. O sincretismo religioso expandiu a cultura do paladar. As promessas feitas aos santos católicos sao pagas com comidas aos seus respectivos orixás, os deuses das religioes que vieram da Àfrica.
O caruru completo dedicado a Sao Cosme e Sao Damiao vira um banquete: vatapá, caruru, xinxim de galinha, arroz branco, farofa de dendê, feijao fradinho, cocadas, acarajé, abará. A lista é grande e pode aumentar, de acordo com o gosto e a disposiçao de quem o oferta. A culinária do dendê, apesar de restrita à Bahia, tem ares de prato típico nacional. Popular entre todas as camadas sociais da naçao baiana, é uma cozinha refinada e específica. Como um simples exemplo, um dos temperos utilizados é o camarao seco e defumado, transformado em pó.
Apesar de parecer ser uma cultura dominante, os pratos feitos com dendê nao sao unanimidade em toda a Bahia. Ao viajar para o interior do Estado, além do clima mais seco do sertao, a culinária também vai mudando e os hábitos alimentares ficam mais parecidos com o nordeste brasileiro: carnes, queijos e manteiga entram no cardápio.
Na época de Sao Cosme e Sao Damiao online, fica mais difícil esquecer da data e da comida especial. Um vídeo de Maria Betânia cantando e declamando a bela oraçao dos santos gêmeos virou sucesso na internet e suas redes sociais. Baianos exilados prolongam as lamúrias da saudade de casa.
Mas tem gente que nao se rende e continua cozinhando para relembrar e celebrar suas origens, as pessoas queridas e os sabores inesquecíveis. Para felicidade geral da naçao baiana em Toronto, um amigo meu tem preparado - já é o segundo ano da tradiçao - um caruru completo para Sao Cosme e Sao Damiao. Com azeite de dendê e camaroes secos trazidos da Bahia, o que é mais incrível. Aos baianos juntam-se outros brasileiros que nunca haviam provados pratos de dendê. Até canadenses se rendem àqueles pratos amarelos.
Que alegria poder desfrutar,a tantos quilômetros de distância da terra natal, os sabores deliciosos, que trazem tantas lembranças, que acariciam o coraçao e que fortalecem as relaçoes sociais e de amizade.
A cozinha da Bahia e os seus pratos dourados pelo dendê vao além do simples prazer. A maior parte das receitas tem origem nas oferendas aos deuses do candomblé. Cada orixá tem as suas preferências e cabe aos devotos agradar da melhor maneira possível. O sincretismo religioso expandiu a cultura do paladar. As promessas feitas aos santos católicos sao pagas com comidas aos seus respectivos orixás, os deuses das religioes que vieram da Àfrica.
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Sao Cosme e Sao Damiao |
Apesar de parecer ser uma cultura dominante, os pratos feitos com dendê nao sao unanimidade em toda a Bahia. Ao viajar para o interior do Estado, além do clima mais seco do sertao, a culinária também vai mudando e os hábitos alimentares ficam mais parecidos com o nordeste brasileiro: carnes, queijos e manteiga entram no cardápio.
Na época de Sao Cosme e Sao Damiao online, fica mais difícil esquecer da data e da comida especial. Um vídeo de Maria Betânia cantando e declamando a bela oraçao dos santos gêmeos virou sucesso na internet e suas redes sociais. Baianos exilados prolongam as lamúrias da saudade de casa.
Mas tem gente que nao se rende e continua cozinhando para relembrar e celebrar suas origens, as pessoas queridas e os sabores inesquecíveis. Para felicidade geral da naçao baiana em Toronto, um amigo meu tem preparado - já é o segundo ano da tradiçao - um caruru completo para Sao Cosme e Sao Damiao. Com azeite de dendê e camaroes secos trazidos da Bahia, o que é mais incrível. Aos baianos juntam-se outros brasileiros que nunca haviam provados pratos de dendê. Até canadenses se rendem àqueles pratos amarelos.
Que alegria poder desfrutar,a tantos quilômetros de distância da terra natal, os sabores deliciosos, que trazem tantas lembranças, que acariciam o coraçao e que fortalecem as relaçoes sociais e de amizade.