28.2.05



O dia em que consegui ver Vixe Maria
Na última quinta-feira fui ver Vixe Maria, Deus e o Diabo na Bahia, no Teatro Acbeu. Depois de duas tentativas frustadas de conseguir entradas na temporada da Sala do Coro, finalmente os ingressos na mão.

Saí do trabalho e dei um tempo no Icba. Ir ao teatro ou ao cinema durante a semana, direto depois do dia de labuta, é para mim uma das coisas mais bacana e mais representativas da urbanidade, da vida em cidade grande. É coisa que só acontece em cidade com quantidade relativa de bons eventos.

Um vez em São Paulo fui assistir a uma comédia do Cacá Rosset, no meio da semana. Um dos atores ficava na porta do teatro, recepcionando o público e fazendo gozação. Entrou um senhor de terno, acompanhado de uma mulher com cara de ser uma pessoa mais simples. O ator não perdoou: "Ah, o senhor saiu do trabalho e trouxe a secretária, hein?". O casal ficou totalmente sem graça. O ator havia capturado a verdade da situação - e trouxe ao público em som alto.

Voltando ao teatro baiano, o Acbeu estava lotado. E eu senti falta da sala vazia. A realização de diretores, atores, produtores e companhia ilimitada é ver as salas tomadas de gente. Em uma visão egocêntrica, prefiro a sala menos conturbada, com menos barulho, menos fila, mais facilidade para escolher o assento.

Mas a peça é sucesso total e para vê-la é necessário comprar com antecedência e chegar cedo para disputar um local com boa visão. Vixe Maria já chegou naquele estágio em que o boca-a-boca é mais forte do que qualquer publicidade. Resultado: lá estão os estudantes, os senhores e senhoras da tradicional família baiana, que só vão ao teatro unicamente quando a peça ajudar a rir das tristezas da vida. Compareciam no dia também as peruas, as periguetes e os putões. Ok, ok, menos, menos. As patricinhas e os mauricinhos com ar inteligente de "Eu freqüento o teatro, tá?". Todos reunidos dando gargalhadas estrondosas. Deu saudade do teatro-cabeção.

A peça é intensa e frenética. Música, dança e bom texto, mesmo com vários clichês da cultura de Salvador - o que tem a vantagem de provocar risadas e a aproximação rápida com o público baiano. Mais interessante - e forte - é a crítica à intolerância religiosa, tornada menos dolorosa pelo humor escrachado. É o que mais chama a atenção no texto.

A peça é bem dirigida por Fernando Guerreiro. Há cenas marcantes, como o vestido-mar de Iemanjá, que se estende por todo o palco. É genial. O elenco em sintonia completa um grande espetáculo.
And the Oscar goes to...
Não gostei de o Oscar de melhor filme ter ficado com Menina de Ouro. Preferia O Aviador, ainda que o primeiro seja um filme muito tocante, gostei muito das cenas de narrativa em off. O filme de Scorcese, no entanto, conseguiu me envolver mais. Se DiCaprio - olha que eu nem gosto muito dele - não tivesse encontrado Jamie Foxx pela frente, certamente levaria a estatueta.

Renato Machado pagou mico dizendo que o filme brasileiro Diários de Motocicleta havia ganho o Oscar de melhor canção. Prontamente foi corrigido por José Wilker, que emendou que era um filme latino-americano. Não é nem isso, é uma produção de vários países. Wilker, por sinal, na condição de comentarista, não fez sequer uma observação inédita, que chamasse a atenção. Deviam ter chamado Rubens Ewald ou qualquer outro com mais articulação entre o conhecimento de cinema e a elaboração de comentários. Ficou parecendo que o ator e apresentador sentiu falta de um script.

27.2.05

Suspense psicológico
David Callaway (Robert De Niro) é um psicólogo que recentemente perdeu a esposa e vive agora apenas com sua filha Emily (Dakota Fanning), de 9 anos. Para mudar de ares, eles decidem se mudar para uma casa no campo. Emily cria um amigo imaginário chamado Charlie, com quem costuma brincar de esconde-esconde. Só que aos poucos Charlie se revela como alguém malvado e vingativo.

O Amigo Oculto (Hide and Seek, EUA, 2005) é puro suspense psicológico que vai segurando a atenção de forma inteligente até que perde o rumo, do meio para o final do filme. Há muitas brechas no roteiro, na tentativa frustrada de elaborar uma trama engenhosa com desfecho original. O diretor iniciante John Polson não conseguiu um bom resultado. Há uma longa distância até chegar ao sucesso de Sexto Sentido, por exemplo.

Robert De Niro podia ter escolhido um papel melhor, ainda que haja bons momentos em sua atuação. O desempenho interessante é da garota Dakota Fanning.

22.2.05

Alguém aí assistiu a Garrincha? No único texto que li, o jornalista (sempre ponderado) desceu a marreta. Vale a pena pagar para ver André Gonçalves vestido de Coalhada?
Cansado. Ainda bem que as férias estão à porta. No final de semana fui ver Mar Adentro e Menina de Ouro. Que coisa, quanta coincidência entre os filmes. Javier Barden fenomenal. Hilary Swank também maravilhosa. Os filmes falam de dores, do corpo e do espírito. Além dos candidatos aos Oscars, muitos lançamentos de filmes de suspense e terror, um atrás do outro, semana após semana, em sequência inimaginável. O que isso quer dizer quando vem dos Estados Unidos? Uma forma de exorcizar (sorry pelo trocadilho) os medos de uma nação?

Cinema cheio na segunda-feira para ver Robert de Niro em Amigo Oculto. Uma pequena bomba que quase explode na testa do ator. Um enredo que se atrapalha e não consegue uma saída honrosa. Uma idéia até interessante e bem conduzida de início, sem finalização coerente. Fuja.

20.2.05

O Aviador (The Aviator, EUA, 2004), dirigido por Martin Scorsese, com Leonardo DiCaprio no papel-título, é a história real do magnata Howard Hughes e as suas duas grandes paixões: o cinema e a aviação. Herdeiro de uma empresa de poços de petróleo, Hughes tornou-se produtor cinematográfico de sucesso e poderoso empresário da aviação norte-americana.

Um dos fortes concorrentes aos Oscars deste ano, reúne 11 indicações, entre as quais: filme, diretor, ator principal e atriz coadjuvante (Cate Blanshett). Em termos cinematográficos, a obra é impecável. DiCaprio está fenomenal na pele do homem corajoso e com visão de futuro, mas que vai sendo consumido pelos transtornos obsessivos-compulsivos.

Baseado no livro O Aviador - A História Secreta de Howard Hughes, do jornalista Charles Higham, o diretor Scorsese fez um filme para agradar ao público e à academia de cinema americano, deixando de lado uma das suas principais características autorais: o olhar cáustico sobre personagens e a sociedade do país. Apesar do retrato de Hughes como louco, não há menção às orgias bissexuais que o milionário costumava participar e nem aos seus amores mais duradouras, com mulheres que não eram atrizes de cinema. Em O Aviador, o foco são as relações com as estrelas Katherine Hepburn, Ava Gardner e Jean Harlow.

17.2.05

Fotos de lambe-lambe

Fui tirar fotos 3x4 para uma nova carteira de identidade. A atual está chegando na maioridade: quase 18 anos de estrada. Hoje em dia, a cada dez anos é preciso tirar uma nova identificação. Acho meio exagerada essa medida, mas fazer o quê?

Sondei os preços nos stands das máquinas digitais. Caros. Lembrei daqueles fotógrafos antigos, os famosos lambe-lambes na Praça da Piedade, perto de onde trabalho. Será que eles ainda existem? Aquelas antigas máquinas suportadas em tripés, nas quais o retratista se escondia atrás de um pano escuro para registar as imagens, com várias pequenas fotos coladas pelos lados, esquecidas pelos clientes que pagaram e não voltaram para pegá-las. Pequenos pedaços de recordações desbotadas.

Depois que a Piedade foi cercada pelas belas grades com desenhos de Caribé, os fotógrafos ambulantes sumiram do local. Perguntei a uma colega de trabalho que sabe tudo sobre serviços no centro da cidade, uma verdadeira Sebastiana Quebra-Galho, se ela sabia se eles ainda existiam.

Ela me falou onde ele estão: em um beco na Avenida Sete, junto do Edifício Totônia (isso é lá nome de prédio?) quase em frente à praça, o antigo local de trabalho. Fui lá para conferir. Dezesseis fotos a cinco reais. Uma pechincha.

No pequeno estúdio montado com cortinas, lá fui eu posar de modelo 3 por quatro. Uma velha máquina fotográfica Pentax K1000, de lente levemente amassada. Igualzinha à que tenho, só que a minha está mais conservada, com certeza viu menos rostos sem graça pela frente. Por um instante, quase decido tirar uma foto de mim mesmo, recortar em formato 3 por 4 e levar para fazer o documento. Depois, em um lapso de sensatez, percebi que ia ser impossível fazer um serviço desse tipo e fui adiante na pose.

"Para identidade tem que tirar o brinco", disse o fotógrafo com cara emburrada. E eu, que estava contente de ter uma foto na identidade com o meu minúsculo brinco prateado, tive que tirá-lo imediatamente. Um outro fotógrafo, mais idoso, que parecia ter sido o verdadeiro lambe-lambe, muito mais simpático, sugeriu: "Não acha melhor tirar com o fundo preto? Você é branco, está de camisa clara, não vai sair nada!"

Por alguns instantes me imaginei flutuando na foto, minha cabeça pairando sobre uma nuvem. E aí logo pensei no fundo preto da foto. Alguém já viu foto de identidade com fundo escuro? Preto? Preferi não arriscar e continuei com a parede branca ao fundo. Para mudar de cor, bastaria baixar um dos vários panos coloridos que ficam enrolados junto da parede. Uma tecnologia avançadíssima.

Foto tirada, não doeu coisa alguma. No máximo um pouco de desconforto, com o fotógrafo ajeitando minha cabeça para lá e para cá, mas nada comparável a uma espetada de agulha em laboratório médico. Pagamento adiantado, o cliente recebe um cartão carimbado e assinado, no qual consta o valor pago. Se esquecer de voltar lá, o fotógrafo não fica no prejuízo.

Imaginei que na época dos lambe-lambes devia ser assim: aquelas fotos que ficavam perdendo a cor e enfeitando a máquina eram de clientes que haviam pago o serviço e esqueceram de - ou não puderam - ir pegar o resultado. E as pequenas fotos ficavam lá, divertindo os passantes, embelezando as ruas, perdendo a cor e marcando a passagem do tempo. Como pequenos tesouros, pequenas almas captadas e presas em um instante infinitesimal.

Quem quiser saber a origem do termo lambe-lambe, tem um texto bacana aqui.

14.2.05

Terra do Nunca

Depois de um longo tempo sem empreender passeios a roteiros distantes, no próximo intervalo de descanso vou a paragens diferentes.

Vou ouvir outros sotaques, perceber novos sabores, sentir outros ares e ver novas cores. Vou testar novos limites, vou criar outras imagens mentais. Vou absorver novas energias e mudar de mundo, pelo menos por alguns dias.

Vou abandonar a rotina e me tornar o mais aventureiro dos mortais. Vou seguir uma trilha encantada. Vou continuar um caminho que sempre sonhei perseguir. Vou desatar vários nós pela estrada de pedras. Vou chegar até onde os dragões dobram o vento. Vou emendar tempos e campos.

Se a chuva quiser me impedir, eu nem vou ligar. Vou sair cantando e cantando. Vou mesmo é ouvir música diferente, sentir o cheiro dos vinhos e das uvas tintas. Vou abraçar o céu com as pontas dos dedos. Vou chegar até o lugar onde só estive em sonho. Vou deixar que brisa fria e seca me envolva e me convide para ensaiar uma outra dimensão.

Vou além do que pensei, do que quis, do que relutei em aceitar. Vou correndo buscar novas letras e palavras para compor mais um fragmento da música desafinada que insisto em compor. Vou lá, vou procurar mais peças para o quebra-cabeça de centena de milhares de pedaços, sem roteiro para me guiar.

Vou lá, vou tentar mais uma imagem. Vou atravessar o bosque para procurar o tesouro e completar o encanto. Vou à procura das águas de diamante. Vou passar por dentro de um filme e continuá-lo após a sessão das cinco. Vou ser estrela de uma comédia romântica. Vou despachar os vilões para o purgatório das almas desiguais. E, então, só assim e por assim dizer, voltar como se nada tivesse acontecido.

9.2.05

Carnaval, chuva e matérias de jornal

A chuva veio com força no fim do Carnaval, esfriando o pouco que restava da minha animação. Na segunda e na terça-feira, fiquei em casa vendo filmes, lendo e escrevendo. A proximidade das férias e de uma viagem a local distante colaborou ainda mais para me fazer ficar em casa, evitando sair, tomar chuva e pegar desagradável gripe.

Neste Carnaval nenhuma música lançada me chamou a atenção. Se no ano passado hits como Maimbê Dandá e Toté de Maiangá disputaram a preferência do público, este ano poucos lançamentos marcaram presença.

Os ventos rasgaram a cobertura do camarote de Daniela Mercury, que foi transferido para dentro da Associação Atlética e montado em poucas horas. Já no Camarote do Oceania, soube que certo dia faltou luz e que os convidados foram gentilmente solicitados a abandonar o local, justamente enquanto a rua estava também escura. Muita gente reclamou.

O jornal A Tarde fez uma cobertura "engraçadinha" da grande festa, com o nome de "Carnaval do Papão". Sob pseudônimos, os repórteres fizeram matérias satíricas abordando aspectos e personagens da festa. A idéia ficou interessante, pois mudou por alguns dias a cara do jornal. Mas acho que faltou espírito mordaz. Isso sem contar que não havia nada de muito novo. A Tarde deveria ter feito uma seção menor com os textos, na qual os jornalistas pudessem ser mais venenosos e engraçados.

O resultado ficou no meio do caminho: nem o escracho total - pois os retratados devem ser respeitados - nem a informação precisa, pois ficava sempre a dúvida sobre o que era verdade e o que era proveniente da imaginação do repórter. As matérias ocuparam os espaços de várias editorias. De qualquer modo, deve ter sido um bom exercício para os que fizeram os textos.

5.2.05

Calendário de Festas

Salvador está em chamas. No bom sentido, é claro, fervendo no Carnaval. O sol está radiante e fervilhante. A água da torneira da cozinha da minha casa desce quente.

Na quarta-feira foi dia da Festa de Iemanjá, aqui no Rio Vermelho. Pela manhã fui tirar fotos. Na Praia da Paciência, muitos balaios com presentes e uma fila enorme para colocar mais presentes nos barcos que vão para o alto mar. Muitas baianas vestidas a caráter. Rodas de samba. Mães e pais-de-santo dando passes. Muitos gringos e nativos com máquinas fotográficas a postos.

O dia havia iniciado triste, com a notícia da explosão do rojão na mão do nosso amigo, o jornalista Gil. Ele foi operado e passa bem. Parece que tem boas chances de ficar sem maiores problemas. As pessoas estão se articulando para ajudar com os custos da cirurgia, já que o jornalista não pussui plano de saúde. Jornais de Salvador divulgaram notas pedindo colaboração.

A tradição do arroz de polvo foi mantida. Desta vez foi preparado por A., que agora mora no Rio de Janeiro, dividindo casa com um amigo e "chef de cuisine". Se ele já cozinhava bem, agora parece estar com ainda mais competências. A. preparou também um refogado de ostras. Várias caipiroscas depois, almoçamos. O resto da turma ficou na farra. Vim para casa dormir. Não aguento mais hard reggae. Tinha que trabalhar no dia seguinte.

Na quinta, a saída do bloco Os Mascarados, na Barra. Com o tradicional atraso, o bloco saiu às duas da manhã. Em cima do trio, a presença de uma loura cabeluda e saltitante, mais tarde identificada como Elba Ramalho. Achei o som meio chocho, sem animação. Só melhorou quando chegou próximo ao camarote de Daniela (próximo das câmeras?), quando Margareth Menezes (foto) cantou Dandalunda.

O bloco estava com público gigantesco, composto de muita gente da gringolândia. Gente que não tem o astral de produzir fantasias. A maior parte estava fantasiada com o uniforme bermuda-e-camiseta, assim como boa parte das pessoas da terra, que depois de pagar R$ 300,00 para sair dentro das cordas, ficam sem graça e sem grana para a fantasia. Dá para perceber que o bloco está ficando menos bonito, pois ver a produção criativa das fantasias conferia uma diversão a mais.

Fui dormir às cinco da matina para acordar às sete e ir trabalhar. A sorte é que iria ser somente meio turno, até o meio-dia. Resultado: nem saí na sexta.

2.2.05

Reality show sangrento

Dois homens estão presos em um porão. Entre eles está um cadáver estendido no chão. Aos poucos, vão percebendo que fazem parte do jogo armado pela mente doentia de um serial killer, que força os seus prisioneiros a cometerem atos de violência. Em Jogos Mortais (Saw, EUA, 2004), dirigido pelo estreante James Wan, a referência é direta aos video games e reality shows.

Produção independente, inicialmente exibido no Festival de Sundance, o filme ganhou distribuição no circuito comercial e vem sendo bem recebido pelo público e pela crítica especializada. A trama é envolvente, aterrorizante e traz algum conteúdo crítico ao modismo dos programas televisivos do tipo Big Brother e similares, apesar das muitas cenas de sangue e violência.

No elenco estão o novato Leigh Wahnnell (também co-roteirista), Cary Elwes (A Sombra do Vampiro), Danny Glover (Os Excêntricos Tenenbaums) e Monica Potter (Na Teia da Aranha).

1.2.05

Uau

Notei que o número de acessos no Festa dos Sentidos vem se mantendo, mesmo sem a publicação diária de textos. Fui ao Nedstat pesquisar e detectei que alguns visitantes eram provenientes do Blowg, um dos mais bacanas e mais lidos da internet brasileira. A autora gentilmente havia me incluído entre os seus favoritos.

Dá para imaginar a minha alegria?

Aproveitei a ocasião e incluí os blogs Outros Dias e Cadernos Grampeados entre os meus favoritos. Também atualizei o endereço do The Shadow Club e do Cinematográfica. Só tem gente boa no pedaço.