31.3.04

Do que não assisti
Comida de dendê em família ou o esbelto bacalhau à Gomes de Sá, com batata e azeite de oliva, preparado por mim mesmo? Qual será o pedido da Sexta-feira Santa? Bem verdade que a decisão é outra: viajar ou não viajar? Should I stay or should I go? Algumas vezes, a inércia é uma forma de dizer não.

Gostaria que o acesso à família fosse mais fácil. Que estivesse lá a no máximo 2 horas, viajando de carro. Que não tivesse que sentir que abro mão de alguma coisa para estar perto de gente que gosto muito.

A Semana Santa não é mais uma semana. Restringe-se ao feriado da sexta-feira. É um período curto. Semana sem ânimo para encarar A Paixão de Cristo, de Mel Gibson. Vários amigos e críticos que respeito desceram a marreta no filme.

Não estou nem um pouco com vontade de assistir "tortura em câmera lenta", como a película (tenho que aproveitar para utilizar este sinônimo enquanto os filmes digitais não chegam!) foi definida por alguém. Nem assistir a sequências violentas, que acabam por estimular a raiva e o rancor. Ninguém merece. O sofrimento alheio nunca deveria ser motivo para convencer a fé de alguém. Parto do princípio que estamos no mundo para aproveitar - sem passar por cima de ninguém e sem precisar "pagar" por nada.

Sou absolutamente contra a culpa que a Igreja tenta incutir em seus fiéis: "Você é sempre pecador, não importa o que faça", pois "Ele" precisou sofrer para que você reflita sobre os seus atos. Sinto muito, mas não preciso de nada disso. Penso que somos livres para traçar nossos caminhos, sempre respeitando o limite: aquele lugarzinho onde começa o que "o outro" sente e merece. E tchau, um abraço.

30.3.04

O anjo gourmet
A revista Gula de março traz uma reportagem sobre o paladar e a vida de Nélson Rodrigues. O grande jornalista, escritor e dramaturgo brasileiro teve suas preferências alimentares relembradas pelo irmão, Augusto Rodrigues, também jornalista. No cardápio, cuscuz de tapioca, canjiquinha, galinha ao molho pardo e pãozinho de minuto, preparados pela mãe. Nelson almoçava todos os dias na casa dela, chovesse ou fizesse sol.

Figura polêmica, Nelson Rodrigues foi cronista excepcional e o dramaturgo que impôs a marca da criação brasileira no teatro e no cinema - com a transformação de seus livros em filmes. Maldito para uns, adorado por outros, ele teve uma vida de altos e baixos, tanto profissionais quanto financeiros. Para ler mais clique aqui.

29.3.04

Várias lições
Em Lições para Toda Vida (Secondhand Lions, EUA, 2004), um garoto de 14 anos, Walter (Haley Joel Osment, de Sexto Sentido), é deixado pela mãe para passar as férias na fazenda de dois tios idosos e rabugentos, Hub e Garth McCaan (Robert Duvall e Michael Caine), e tentar descobrir onde escondem uma fortuna. O filme estréia na próxima sexta em Salvador.

O que era para ser pura monotonia, acaba por ser um período de muito aprendizado para o garoto, assim como alegria na vida dos tios idosos. Eles dão ao garoto um mundo em que a honra e a virtude valem mais do que dinheiro e poder - as lições que ele não recebeu da mãe. Comédia para agradar crianças e adultos de todas as idades.

O agora adolescente Haley Joel Osment conserva o brilho da atuação como o garotinho em Sexto Sentido, quando recebeu vários prêmios da crítica e indicações para o Oscar e ao Globo de Ouro. Destaque também para o trabalho de adestramento dos animais.
Pequenos prazeres da urbanidade
Sair em plena segunda-feira à noite para assistir a um filme, e depois passar em um drive-thru da vida para pegar um lanche, são pequenos prazeres que só tem quem mora em cidade grande. Parece simples - e é. Grandes prazeres da vida são os mais simples. Também há um certo ar de transgressão na saída pela noite de ruas vazias. Dá certa impressão de posse do espaço urbano.

Normalmente não consumo sanduíches na rua. De vez em quando é que, na saída da sessão da segunda-feira, passo naquele fast-food de comida árabe da orla e pego um kit de primeiros-socorros: quibe, esfirra aberta de carne e de queijo. Sai quentinho. Vim salivando da Pituba até o Rio Vermelho, sentindo o cheiro que se expandia no carro. O quibe do Habib's é genial. Crocante, sequinho e macio, é dos melhores que já comi. E olha que fui acostumado com a boa cozinha árabe do Sul da Bahia, aquela que Jorge Amado imortalizou em Gabriela. No quesito esfirra de queijo, no entanto, prefiro a do Mister Sheik, na Barra. É mais suculenta.

Idéia genial essa de preparar petiscos da cozinha árabes e vendê-los em lojas de fast-food a baixo preço. Particularmente, não gosto de ficar no restaurante. É tudo muito barulhento e iluminado demais, a luz chega a doer nos olhos. Prefiro comprar e carregar para consumir na tranquilidade do lar.

A cozinha árabe é uma das mais elaboradas e perfumadas que existem. Hortelã, canela, pimenta-do-reino, limão, amêndoas, gergelim e azeite de oliva inebriam paladares das mil e uma noites.

28.3.04

Ao cair da tarde
Nada melhor do que passar um bom tempo conversando com gente esperta e que gosta de bater papo. O que as pessoas andam fazendo que não param para conversar? Os cafés do final da tarde, servidos em casa, tão comuns nas cidades do interior, perdem força nas cidades grandes. O pessoal do nordeste adora se reunir em cafés, da manhã ou da tarde. São quase refeições completas: pães, bolos, cuscuz, biscoitos, beijús, tapioca, sequilhos, torradas, frutas, sucos, chás, café coado, iogurte, queijo coalho e o que mais aparecer.

Tomar café e ficar conversando longamente é um prazer que não pode se esquecido. Aproxima as pessoas, conduz ao diálogo tranquilo. Não há aquela certa ansiedade dos almoços, na expectativa do prato e da sobremesa, seguida da inércia causada pelo estômago cheio. A refeição da noite, leve e lenta, dá sensação de aconchego.

Melhor ainda quando se tem por perto gente amiga que gosta de conversar. Aí o papo não termina nunca. O assunto não se esgota. Parece também ser uma ocasião propícia a dar risadas sobre situações tragicômicas do passado. Para relembrar e reforçar laços de amizade e bem-querer. Bem-querer? Que palavra antiga! Quase esquecida, parece nome de flor.

26.3.04

Praia Grande
Big Beach Boutique II é o título da festa e do DVD do DJ inglês Fatboy Slim, que esteve há pouco tempo no Brasil. Ao vivo na Praia de Brighton, sul da Inglaterra, um show que atraiu uma multidão, em uma das maiores festas do país. No set do DJ, basicamente música eletrônica leve, alguns vocais, house, sempre uma delícia de ouvir - e também ver, no caso do DVD. Alguns clássicos (se é que já podem ser chamados assim), como Born Slippy, do Underworld. Norman Cook, 40, é o nome real de Fatboy Slim.

Brighton fica a 80 km ao sul de Londres. Tem gente que vai para lá só para curtir as boates e raves. Pouco conhecida no Brasil, a cidade atrai muitos turistas, ingleses e de outros países da Europa. Com vida noturna movimentadíssima, Brighton tem uma grande lista de casas noturnas, bares e restaurantes. É uma espécie de San Francisco ou Los Angeles da Inglaterra.

Estive em Brighton em 97, com o pretexto de complementar os estudos de inglês. Passei um mês por lá estudando. Isto é, quando dava, pois saía de segunda a segunda, conhecendo a vida noturna e a música eletrônica que, naquela época, já tinha dez anos de estrada na Europa. Tive a sorte de estar lá durante o verão. A cidade tem em torno de 200 mil habitantes e é muito, muito, bonita. Diferente das imagens cinzentas de várias cidades da Inglaterra. O DVD de Fatboy Slim me trouxe boas lembranças.
Dos felinos, por e-mail
"De todas as criaturas de Deus, somente uma não pode ser castigada. Essa é o gato. Se fosse possível cruzar o homem com o gato, melhoraria o homem, mas pioraria o gato."
Mark Twain

"O gato possui beleza sem vaidade, força sem insolência, coragem sem ferocidade, todas as virtudes do homem sem vícios."
Lord Byron

"O gato é o único animal que conseguiu domesticar o homem."
Marcel Mauss

"O menor dos felinos é uma obra-prima."
Leonardo da Vinci
Rango corporativo
As empresas modernas, depois de sugar todas as forças dos funcionários, distribuem verbas e mais verbas para tentar melhorar o relacionamento interno, o famoso clima organizacional, que é mais um jargão da Administração. Recursos mensais e anuais, além daqueles eventuais para almoços com clientes.

Hoje é o dia de utilização da verba mensal na equipe em que trabalho. O dinheiro é minúsculo, mas sempre dá para organizar algum almoço. Setor de gestão (digestão?!) de pessoas, nada mais justo que compartilhar. Só há verba para os funcionários, mas entram também os estagiários, atendentes e faxineiros. O pirão é repartido.

Eventualmente aparecem convidados extras, não esperados. O terror é sempre o mesmo: será que a comida vai ser suficiente para todos? Durante o almoço, dá para imaginar a alegria: barulho, chefes contando piadas odiosas, funcionários com sorriso amarelo rindo das piadas, gente se engalfinhando na mesa do bufê, gente repetindo o prato três vezes, sobremesa disputada a tapa. Afinal, é de graça.

A BBC inglesa lançou um seriado que mostra o cotidiano das relações dentro de uma empresa. A produção é campeã de audiência. Por mais que existam situações "cômicas", como é o caso do almoço relatado, parece uma tarefa árdua ter criatividade suficiente para extrair tanto texto sobre o assunto. Ou será que a realidade é tão infame assim?

25.3.04

Movimento do cabelo
A primeira década do terceiro milênio. Como o período será chamado daqui a dez anos? Os anos zero-zero, os anos zero ou a primeira década do século XXI? Os meios de comunicação precisam de delimitar - e acabam por generalizar - os períodos da história: os anos oitenta, os anos setenta, os anos vinte. Então vamos lá.

O cabelo volta a ter força, no universo masculino, agora nos anos zero-zero. Depois de bom tempo usando cabelo bem curto, arriscando no máximo um topete, o homem brasileiro aposta novamente no comprimento médio. Mas nada que lembre aquele corte horripilante, longo na parte de trás e batido nas têmporas, imortalizado por Chitãozinho e Chororó.

O cabelo masculino atualmente tem um corte mais uniforme, com aspecto levemente desleixado. Nada que lembre aquele cabelo rebelde dos anos setenta, nem aquele chanel masculino - médio e todo do mesmo tamanho - dos mais arrojados dos anos oitenta. Amparado no modismo do metrossexual - o homem hétero e vaidoso, ávido consumidor de moda e produtos de beleza -, não há receio de usar géis e cremes para domar a juba do leão.

O cabelo, assim como a moda atual, permite ampla variação. Não existe, felizmente, um estilo dominante. Dos cabelos compridos, passando pelos médios e pelos black power, até os raspados de lâmina, tudo é praticamente aceito. Dentro das possibilidades capilares de cada um, é claro.

24.3.04

Sexo liberado
A sexta e última temporada da série Sex and the City estréia agora no Brasil. A série foi encerrada em fevereiro nos Estados Unidos, com um público estimado em 13 milhões de pessoas durante a exibição do último episódio.

Sex and the City é um marco. O cotidiano feminino, moderno e urbano, nunca foi retratado com tanta fidelidade. Habitantes de Nova York, quatro mulheres resolvidas profissionalmente, curtem festas, moda e têm vida sexual movimentada. Mas, ao chegar aos 30 e poucos anos, elas se deparam com aspirações iguais a qualquer outra moça de outras épocas e lugares: amar, casar, constituir família e ter filhos. Não necessariamente nessa ordem.

O seriado tem cenas bem ousadas de nudez e sexo. A sociedade americana é muito estranha. A produção cultural mostra, no cinema e na TV, uma boa parte da população completamente desprovida de culpa sexual. Por outro lado, ouve-se falar de um povo puritano e conservador, com passeatas de jovens em prol da virgindade - ainda que muitos não cumpram o acordo.

Até o início dos 80, da época da ditadura, a censura brasileira não permitia a nudez frontal e total nas revistas. A nudez era de costas. De frente, aparecia no máximo um seio. Eu era pré-adolescente e lembro que quando algum conhecido ia aos Estados Unidos, sempre aparecia com alguma revista de nudez. Completa, total, escancarada. Eu achava que aquele era o país mais lascivo que poderia existir.

23.3.04

Guerra
Pequenas criaturas vêm com a chuva. Bactérias, virus, protozoários, bacilos, estreptococos. Seres invisíveis e indefensáveis. Animais minúsculos e poderosos atacam a população. Invasões bárbaras, sem chamadas, ataques-surpresa, blitzekrieg.

Animais famintos que devoram tudo. Bestas que lançam bombas de hidrogênio na atmosfera terrestre. Bombas destiladoras e degeneradoras que povoam o ar de SO2, NOx e CO2.

Quem irá combatê-los? Armas em punho, princípios ativos a caminho. Em dosagens múltiplas e persistentes. Ataques estratégicos e armas químicas, sistêmicas e genéricas. Ataques por envenenamento.

O mundo, infelizmente, hoje e sempre, resume-se a pequenas ou grandes batalhas. Quem dera ainda fossem de confete.
O pessoal do Bloglist escolheu o Festa dos Sentidos como Alvo da Semana. Olha que texto gentil:

"Crônicas e comentários do Jornalista Danilo Menezes. Os textos tratam de assuntos variados, em sua grande maioria enfocando a cultura do Estado da Bahia, onde reside. Música, cantores, comidas típicas, personalidades, cinema brasileiro. Tudo no maior requinte. Um canto aconchegante repleto de boas informações.
Vale a pena dar uma chegadinha nessa festa."






Mais uma vez, obrigado.

21.3.04

Bodes, avestruzes e outros bichos
Na orla de Salvador, bem em frente ao mar de Itapuã, um restaurante anuncia carne de bode e de avestruz. Ansiando experimentar a carne daquela ave que parece um animal pré-histórico, deixo de lado o regime vegetariano que faço durante a semana e vou atrás dos bifes.

O restaurante é simples, teto coberto por telhas de metal. A cozinha é anunciada como sertaneja, por conta da variada opção de pratos com carne de bode. O avestruz (ou a avestruz, tanto faz) está sendo aos poucos incorporado ao paladar sertanejo, pois a cultura tem se adaptado bem ao clima do Nordeste.

Para servir de tira-gosto, ou mesmo como refeição completa, há dois pernis inteiros, um de porco, outro de carneiro, que ficam à disposição dos clientes. Em suportes de metal, como jamón espanhol, para o corte em pequenas fatias e o deleite dos consumidores.

A carne da avestruz parece carne de boi. Escura, fibras grossas, mas muito macia. Parece um bife comum. Antes de experimentar, pensava que a textura era mais próxima da carne de ave. O sabor também não me surpreendeu. Os petiscos de porco e carneiro estavam mais saborosos. Quero acreditar que ainda vou experimentar ou preparar o avestruz para ter um resultado melhor.


O restaurante também funciona como bar. É aí que vem a parte mais saborosa da história. O bar se chama "Coquetel Carmem Miranda" e tem um poster da cantora pendurado, bem junto das fotos de bodes que se espalham pelo recinto. Abaixo do poster, um pequeno globo elétrico gira espalhando luzes multicoloridas. Na parte superior de uma das paredes, há coletes de couro e bainhas de facão penduradas, para não deixar dúvida do clima sertanejo do local.

Há uma TV pendurada, exibindo DVDs com shows de Gonzagão e Gonzaguinha e clips de axé music. Ao lado um cartaz: "Sua presença aqui é muito importante". Na parede atrás da TV, para dar o toque cosmopolita, há um poster das três panteras: Cameron Diaz, Drew Barrymore e Lucy Liu. As panteras estavam de olho, prestes a atacar os bodinhos. Ah, para não esquecer, em cima da TV, tinha um brinquedinho de bolas coloridas que ficava girando, para um lado e para o outro. Que tal?

20.3.04

Carangas noturnos
Comer caranguejo é uma arte. Quebrar peça por peça da carapaça, catar e sugar a carne e sorver o líquido. Ao abrir a cabeça do bicho, mais um desafio: o que pode e o que não pode (ou não deve) ser comido das vísceras, aquelas partes moles, algumas mais escuras, outras mais claras. Algum desavisado - e não é pouca gente - ao se deparar com aquele bicho inteiro não tem a mínima idéia do que fazer para começar a comer.

Na Bahia, na parte litorânea, aprende-se a apreciar caranguejo desde cedo. Quando os pais gostam do petisco, vão logo ensinando aos filhos o manejo dos martelinhos de madeira. Quebra aqui, quebra ali, até a destruição total. Muita gente não tem paciência e acha que o tempo gasto não vale a pena pela quantidade de carne obtida. Para quem pensa assim, é melhor pedir um casquinho de caranguejo - já catado, acompanhado de farofa - ou comprá-lo catado, em pacotes, e fazer uma boa moqueca ou ensopado. Mas, para os caranguejeiros de longa data, o trabalho de quebrar e obter pequenos tesouros de carne adocicada é um grande prazer.

O caranguejo é encontrado na lama dos mangues, mas é limpinho: vegetariano, só come folhas e frutos. Em Salvador o crustáceo é figura cativa nos cardápios das barracas de praia. Há bares maiores, em que o caranguejo faz o papel principal no cardápio. Cozido com cebola e temperos verdes, principalmente coentro, acompanhado ou não de pirão, atrai clientes e mais clientes.

O povo de Salvador gosta tanto de caranguejo que sai à noite em busca do crustáceo nos bares especializados.O problema é que o petisco suja bastante as mãos e o cheiro não sai facilmente. Sair à noite para comer caranguejo, com todo respeito a quem gosta, é um programa prá lá de cafona. Como sair do bar e ir para outro lugar com aquele cheiro impregnado nas mãos? O paladar da noite merece respeito. Pelo menos um prato que não suje tanto.

19.3.04

Diva
Já tinha ouvido muito falar nela. Vários conhecidos já haviam escrito o seu nome em cartas ao vento. Uma vez procurei algum disco em catálogo e não achei nada. Até que, passando por uma loja com vários discos em promoção, encontrei um CD da cultuada cantora: Nina Simone.

Uma voz de timbre pouco comum. Rouca, aveludada, profunda; música negra americana. Forte e suave ao mesmo tempo. Música para namorar, bebericando vinho. Puro jazz e blues. Música que transporta para dentro de filme.

Nina Simone nasceu Eunice Waymon, em 1933 na cidade de Tryon (estado norte-americano da Carolina do Norte) e ficou muito conhecida pela intensa militância em causas de combate ao racismo.

Nina costumava fazer shows no Brasil e tinha São Paulo e Rio de Janeiro no roteiro de suas apresentações. Em julho de 1997, a cantora levou mais de 35 mil pessoas ao show Música para amantes, na Praça da Paz, no Parque Ibirapuera.

Ainda no Brasil, a cantora fez participação especial no disco Maria Bethânia 25 anos (1990). Ela interpreta, junto com Bethânia, a faixa Pronta pra Cantar, de Caetano Veloso. No total, Nina Simone gravou mais de 60 discos, entre produções ao vivo e de estúdio.

A cantora faleceu em 21 de abril de 2003, aos 70 anos, em Carry-le-Rouet (sul da França)

=x=x=x=

Tem gente nova chegando no pedaço: jornalistas blogueiros. É só conferir aí nos links: Luciana (jornalista online) e Jamille (cyberjornalista).

18.3.04

Chove
Chuva inesperada alaga ruas. Alaga destinos, umedece relações. Chuva forte e grossa desaba como o desamor. Chuva é constante e encharca. É chuva que esfria. Chuva torrente de emoções. Um dilúvio sobre as cabeças.

Chuva que deságua em destinos indefiníveis, indecifráveis e infinitos. Chuva que pede conforto. Chuva que desanda o caminho e a receita do bolo. Chuva que interfere no fermento. Chuva que nutre, que alegra e entristece. Chuva que interrompe e atrasa. Chuva que amedronta. Chuva que traz desconforto e desabamentos. Chuva que chora as mágoas da população.

17.3.04

Gorduras e sabores
Ao experimentar um prato novo, parto do princípio que não existe comida ruim. Existe, sim, comida mal feita. Os estudiosos dizem que os nossos gostos são estabelecidos pela nossa experiência, pela bagagem cultural que cada um carrega. Tentando acreditar nisso, busco experimentar cada prato desconhecido como um novo universo a ser explorado.

Atualmente, por conta de cuidados com a saúde e com a estética, as pessoas procuram evitar as comidas "pesadas", ou seja, gordurosas: feijoada, rabada, sarapatel, vatapá, moqueca, etc. O problema é que os pratos quase sempre são mal preparados, com gordura excessiva.

São os temperos que dão gosto a um prato. Não adianta entupir uma feijoada de gordura, se não estiver bem temperada, nunca ficará saborosa. E os temperos são todos de origem vegetal. A gordura, no entanto, ajuda a dar textura macia em alguns alimentos. O abará é mais macio que o acarajé, pois a gordura está entranhada em toda a massa, não somente na superfície, como é o caso do bolinho frito.

Quando se pergunta qual a comida que as pessoas não gostam, muita gente afirma: jiló. O coitado do jiló é tido como exemplo de mau sabor, por causa do amargor característico. Pois até o jiló pode ficar saboroso. Ouvi falar que tem gente que o prepara frito, em pequenas fatias. Dizem que fica crocante e perde totalmente o amargor.

16.3.04

Não deixe a vida te levar
O cantor Zeca Pagodinho acabou saindo com a imagem arranhada na briga entre as cervejarias. Um exemplo rápido, a jornalista Danuza Leão, da Folha de São Paulo, fez um comentário agudo e pertinente, comparando a propaganda feita por Pagodinho àquela nefasta do "levar vantagem", que imortalizou o craque Gérson como garoto-propaganda de uma furada.

Nunca se sabe ao certo o que motivou o cantor a mudar de marca de cerveja e de publicitário. Com certeza, as altas cifras do cachê - fala-se em 3 milhões de reais - têm grande peso na mudança da Schincariol para a Brahma. Mas, daí a não prever que haveria tamanha repercussão sobre o assunto é ingenuidade ou muita burrice.

Uma revista nacional de cultura, há pouco tempo, colocou Zeca Pagodinho na capa, para analisar a aproximação da cultura popular com a alta cultura. Não cheguei a ler, mas dá para imaginar que a discussão seria algo do tipo: é preciso o distanciamento no tempo para que um sambista seja acolhido como um gênio da música popular, como é o caso de Noel Rosa?

Nizan Guanaes, o mentor da transferência de Zeca Pegodinho para a nova marca, chegou a afirmar, a plenos pulmões: "Nunca mais, neste país, Noel Rosa vai morrer de fome". Como se a ajuda de publicitários fosse indispensável para que os talentos do país não sejam esquecidos.

Até parece que Zeca Pagodinho estava em ostracismo e precisava da ajuda de marketeiros. O pagodeiro é best seller da Universal, e foi escolhido, junto com Sandy e Júnior e Ivete Sangalo, para receber as maiores verbas de divulgação da gravadora. Com certeza, não necessitava da preciosa ajuda que Guanaes deu à sua imagem, transformando-o em falso e usurário. Noel Rosa, com certeza, não passou por isso.

15.3.04

Tem link novo aí ao lado. Shaggapress é o blog bacana de Daniela Henning. Além do texto inteligente, ela manja bastante de diagramação. Vale pena dar uma olhada.
Benjamim - o filme
Noite de pré-estréia nacional de Benjamim, em Salvador, durante o III Panorama Internacional Coisa de Cinema. O filme é adaptado do livro homônimo de Chico Buarque e dirigido pela baiana Monique Gardenberg, de Jenipapo (1996). Produzido por Paula Lavigne, o filme marca a estréia de Cléo Pires, que ganhou prêmio de melhor atriz no Festival do Rio. No elenco, Paulo José, Danton Melo, Chico Diaz e Guilherme Leme.

Paulo José vive o modelo fotográfico Benjamin na maturidade, que reconhece na ninfeta Ariela (Cléo Pires) o amor reencarnado da sua juventude. O filme tem fotografia bem bacana, especialmente nas cenas do passado, em torno da década de 60: imagens granuladas, cores fortes, luzes quase estouradas e figurinos que compõem uma bela reconstituição da época.

O roteiro foi feito a seis mãos: o tarimbado Jorge Furtado (Tolerância), o jornalista gaúcho Clênio Póvoas e a própria Monique Gardenberg. Demorou dois anos para ficar pronto e teve 11 versões, recebendo eventuais consultorias de Chico Buarque. A narrativa é não-linear, cheia de idas e retornos, composta de fragmentos que vão dando pistas aos espectador para montar o quebra-cabeça.

Só que falta carga emocional mais densa ou mais ação para segurar o interesse pelo filme. No meio da narrativa, o roteiro torna-se monótono, um tanto cansativo, melhorando no final, quando há mais movimentação. Um filme como 21 Gramas, por exemplo, de ritmo até mais lento, tem uma carga de dramaticidade tão alta, que segura bem a atenção de quem o assiste.

Sem dúvida, a iniciante Cléo Pires adiciona bastante ao filme - e ao marketing em torno dele - , surpreendendo em sua atuação. Ainda que em alguns momentos mais relaxados carregue demais nos "esses", delatando a garota carioca que existe dentro dela, em detrimento da mulher fatal da personagem Ariela.



Após subir as escadas do Multiplex Iguatemi, me deparei com um monte de câmeras da TV e de fotógrafos. Por grande sorte, cheguei 3 minutos antes dos artistas e da diretora. Com a chegada das estrelas, holofotes, máquinas em punho e flashes. Escapei ileso, detestaria estar por perto, com tanta luz. Cléo Pires é linda, linda, ainda que baixinha. A seguir, na abertura da sessão, a diretora disse algumas palavras, rendendo homenagens a Chico Buarque e aos atores presentes: Cléo, Paulo José, Chico Diaz e Guilherme Leme.

14.3.04

Perdido na tradução
A dificuldade de comunicação é um dos principais aspectos do filme Encontros e Desencontros (Lost in Translation, 2003), da diretora Sofia Coppola, que levou o Oscar de melhor roteiro original de 2004. O título em inglês dá uma boa pista do que o filme quer retratar.

O ator americano Bob Harris (Bill Murray) vai para o Japão gravar um comercial de uísque. Solitário, hospedado em um hotel de luxo e com insônia, amarga as dificuldades do idioma e das diferenças com a cultura japonesa, tanto no trabalho quanto nas horas vagas. No mesmo hotel está hospedada Charlotte (a bela Scarlett Johansson), americana, também com dificuldade para dormir. Ela acompanha o marido fotógrafo de celebridades, que passa ausente longos períodos, em trabalho no país.

A solidão propicia a aproximação. Juntos, partem para conhecer a vida noturna de Tóquio. Logo de início, o filme parece demonstrar certo estranhamento irônico à cultura japonesa. Aos poucos, a aproximação do casal conduz ao entrosamento com a vida local.

Cores fortes, luzes noturnas, letreiros de neon, painéis digitais, videogames, karaokês, bares com cantores estrangeiros e trânsito frenético retratam a megalópole com lirismo, como raramente é mostrada, mesmo pelo cinema oriental. A vida urbana é o pano de fundo para a relação que vai se estabelecendo sutilmente entre estrangeiros em uma terra estranha. O roteiro tem o mérito de mostrar a construção dessa relação em um modo delicado e bem pensado.

12.3.04

Aniversário
Jornalista, colega de faculdade, comemora aniversário. Boa parte do corpo de repórteres do Correio da Bahia presente. Rolam papos jornalísticos entre colegas de faculdade e outros repórteres atuantes no mercado. A redação do Correio da Bahia atualmente só tem gente com pouco tempo de casa. O que andam fazendo os mais antigos? Muitos estão dando aulas em Faculdades. Em breve todos os jornalistas terão que se tornar professores para sobreviver aos solavancos do mercado de trabalho?

Soube que a redação do Correio da Bahia tem planos de abandonar a sede da Paralela e se juntar ao restante da rede Bahia, na Federação. O grande prédio está bem vazio, depois de tantas demissões. Como o mercado vai absorver a quantidade de novos profissionais que têm se formado e que ainda vão se formar? Mistério...

Os jornalistas efetivamente mudaram de perfil. Levei de presente o livro Acqua Toffana, de Patrícia Melo. Antes de ir à festinha, pensei que todos os presentes seriam CDs e livros. Talvez, quem sabe, tratados revolucionários e escritos subversivos. Doce engano. Vi o meu livro e mais um CD entregues como lembranças. O restante dos presentes, dados por outros jornalistas, foram camisas y otras cositas más. É, realmente, não há mais jornalismo engajado. O jornalismo se tornou mais uma profissão como outra qualquer. Será que, pelo menos, os jornalistas ainda gostam de ler?
Vida no campus
Qualquer faculdade de Comunicação é um prato cheio para análise comportamental. Há uma ampla diversidade de tipos. Há desde o mauricinho e a patricinha - via de regra fanáticos por televisão - até os ripongas, passando pelos roqueiros, axezeiros e pelos modernos-internéticos-eletrônicos.

Fiz o curso de Comunicação já em uma faixa de idade e de experiência um pouco acima da maioria da turma. Já trabalhava e carregava o exercício de uma outra graduação. Mesmo assim, passei alguns anos de grande aprendizado. Curtia tudo que podia e dava tempo de aprender. Peguei matéria optativa em Belas Artes, fiz análise, curso de espanhol e de roteiro.

Durante os períodos de aulas, senti falta de ter tempo para me aproximar mais dos colegas. Fiz boas amizades, mas não podia ficar depois da aula tomando uma cervejinha, pois tinha que trabalhar. E nunca consegui me encaixar em nenhum dos rótulos: assim como gosto de música eletrônica, gosto de axé de boa qualidade e de rock - não muito pesado.

Nunca avalie um estudante de comunicação pela primeira impressão. Aquele que fica lá no fundo, e parece que nem está aí para o mundo, de repente chega com um texto maravilhoso, melhor que qualquer outro. Outra característica do habitat dos futuros jornalistas é que não há tempo livre suficiente entre as aulas para que eles comentem todos os temas "interessantíssimos" que vivenciam. Não há espaço de silêncio suficiente entre as conversas para que cada um expresse a sua opinião - coisa que todos querem fazer. É uma barulheira, uma babel.

11.3.04

Conforto
A revista Vida Simples é publicada pela Editora Abril. Com diagramação minimalista, apresenta reportagens sobre temas de bem-estar e saúde. A edição de fevereiro traz a meditação como reportagem de capa. Na Vida Simples, os assuntos são abordados superficialmente - como em qualquer outra revista não-científica. Mas há alguma bibliografia e endereços de sites em que o leitor interessado pode se aprofundar no que lhe interessa.

A reportagem de capa informa que existem diferentes versões da meditação. São listadas oito linhas diferentes da prática: desde a zen-budista até a da respiração. Esta última seria a mais comum e simples. Aliás, a meditação não tem nada de muito complexo. Consiste simplesmente em esvaziar a mente e não pensar em nada. Parece simples? Tente. É difícil, é necessário ter bastante prática.

Grande parte do desconforto físico corporal - a exemplo de tensão muscular - é causado pela atividade da mente agitada. A meditação trata de disciplinar a mente para viver o momento presente, sentindo cada movimento ou atividade, sem se ater ao passado ou se preocupar com o futuro. Portanto, é possível meditar ao caminhar, lavar pratos ou tomar banho. A percepção do ritmo da respiração é fundamental para o relaxamento e ajuda a controlar a atividade mental. O resultado é o bem-estar, que se prolonga do espírito para o corpo.

9.3.04

Quejos e ratos
Carne de búfalo, avestruz e cordeiro. Cogumelos shitake e shimeji. Salmão, truta e badejo. Camarões, queijos franceses e vinhos italianos. Tortillas mexicanas, pimentões em conserva, berinjelas e cuscuz marroquino. Fatias finas de carpaccio com mostarda. Alcaparras e alcachofras. Flores e frutos, talos e folhas. Das frutas exóticas até a simples jabuticaba, tudo perto dos olhos e longe do bolso. O consumidor glutão sente-se como uma criança babando em uma loja de brinquedos.

As lojas de comidas finas atraem pelo belo visual. Vinhos e queijos bem arrumados, conservas coloridas. Queijos gigantes, daqueles que fazem qualquer mortal querer ser um ratinho e ficar ali dentro roendo tudo, só acabar quando a barriga estiver bem redonda de cheia. Aqueles enormes buracos, não tenha dúvida, são feitos por esses consumidores-ratos, apenas com o olhar.

Aí o glutão continua a sua peregrinação atrás de algum pacote de massa italiana mais em conta. A atividade é árdua e ele quase desiste. Enquanto isso, experimenta aqui e ali uma amostra grátis e pensa: "Esse é um horário bom para vir aqui". Compra um iogurte e um pacote de biscoitos, para cumprir o prazer da compra, feliz da vida. O sabor? Melhor impossível.
Trabalhos
Descobri uma escola de informática, escondida no centro da cidade, que cobra R$ 1,90 por uma hora de acesso em alta velocidade à internet. A escola fica no Largo do Rosário, próximo ao colégio Mercês. É de lá que estou postando agora, antes de ir para a empresa, para o trabalho formal. Aquele que paga as contas. Blogar também é um trabalho, ainda que mais prazeiroso. Ou alguém acha que é moleza ficar escrevendo textos e editando figuras?

A próxima quinta-feira será o dia de reabilitar a panela espanhola azul e fazer uma paella para algumas pessoas que vão jantar comigo. Kit para paella na Perini, mais camarões, arroz parboilizado, alguns temperos, açafrão e - voilà - eis o prato.

O arroz demora mais de quarenta minutos para cozinhar na paellera. O prato tem que ser feito na hora. O jeito é ficar bebericando e conversando enquanto se revolve o conteúdo da panela. Trabalho difícil esse...

8.3.04

Mulheres
O jornal A Tarde publicou hoje vários comentários sobre o Dia Internacional da Mulher. O de Aninha Franco, dramaturga, merece destaque, pela poesia e sensibilidade: “Parceiras, hoje é dia de festejar a existência dos seios, das curvas, das ancas, dos cabelos fartos, do sexo protegido, da emoção à flor da pele, do óvulo e dos neurônios aveludados. Mas eu sei que chegará o dia em que festejaremos o bom uso de tudo isso”.

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No show realizado em São Paulo, comemorativo da data, a sempre polêmica - e lúcida – Rita Lee disse que não via muito sentido em um dia especial das mulheres, afinal de contas elas são maioria no mundo. Disse que fica parecendo algo como o “Dia do Mico-Leão-Dourado”. Já que é para separar em compartimentos, ela pergunta por que não há também o Dia do Homem.

Zélia Duncan, que também participou do show, discordou e disse que "muita gente pensa que o mundo foi feito para os homens. A data serve para lembrar que o mundo é nosso também".

Fonte: Uol

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Particularmente, concordo com a Rita Lee.

7.3.04

Rave do Barnabé
O Trapiche Barnabé é o que resta de um antigo armazém na região do Comércio, em Salvador, que hoje funciona como estacionamento e como eventual espaço de festas. Não há água nem luz no local. Os empreendedores que se aventuram a promover eventos por lá têm que arcar com toda a infra-estrutura: gerador, sanitários químicos, e tudo mais.

A rave Paradise aconteceu ontem no Trapiche. Surpreendente a decoração: coisa de profissional. Logo na entrada, a projeção de uma imagem de São Jorge sobre um tecido branco fino. A festa era em homenagem a Oxóssi, orixá sincretizado com o santo que luta com o dragão. Enormes balões coloridos, em forma de ouriços, foram colocados em cima de pilares do Trapiche, que não tem teto, e por cima da pista de dança.

O palco do DJ tinha estrutura de show profissional. Coroando a ação dos magos das pick-ups, havia um altar com uma imagem de São Jorge, toda iluminada. Bacana mesmo. Segundo o que foi divulgado, a produção contou com a ajuda de Marcelo Marent, um cara que tem experiência de promover algumas das melhores festas eletrônicas em Belo Horizonte.

Junto com alguns novos DJs que se aventuram na cena eletrônica da cidade, os experientes Chiquinho e Márcio Santos seguraram o pique da festa. Bom público, mas que não chegou a lotar o local.

6.3.04

Pizza de jornalista
Há uma pizzaria na Barra, próxima ao Cristo, que possui uma bela vista da praia e do Farol. A pizza não é nenhuma excepcionalidade, mas o preço é bem convidativo. No cardápio, há um sabor chamado de Helô Sampaio, professora da Faculdade de Comunicação, presidente do Sindicato dos Jornalistas e maior cronista de gastronomia da Bahia.

Em torno da pizza, mezzo portuguesa, mezzo supreme (calabresa e pimentão), cinco jornalistas recém-formados e uma quase formada conversavam sobre o mercado de trabalho difícil e rememoravam o Carnaval de Salvador - ou, pelo menos, o que viram dele. Uma delas, apesar de formada, ainda recebe salário de estagiária em um canal de televisão local.

Enquanto grande parte dos normais se diverte, durante o Carnaval boa parte dos jornalistas de Salvador consegue trabalho. Muita gente se virou na cobertura da festa, para os mais diversos meios de comunicação. Até este cronista, que oficialmente não trabalhou, fez a sua coberturazinha particular, metendo o bedelho e comentando o que via.

5.3.04

Flores e homenagens
Segunda-feira, oito de março, é o Dia Internacional da Mulher. Já começou o corre-corre atrás de textos e imagens para fazer cartões que serão distribuídos às mulheres da empresa. Parece que o texto que escolhi será utilizado. Mas por que mesmo que tem de existir um dia especial para as mulheres? A sugestão seria criar algo como "Dia da Consciência Feminina".

Um dia especial para as mulheres é continuar tratando-as como seres diferentes, que conseguem fazer mágicas para associar emoções e atividades profissionais e familiares. Se ninguém duvida do poderio feminino, muitos homens tem que se reportar a chefes mulheres, por que ainda insistir em separá-las em um compartimento? Tenho certeza que feministas compartilham este pensamento.

Tenho uma colega de trabalho que diz que nunca se identificou com aqueles textos que comparam mulheres a flores. Ela percebe que nunca se sentiu frágil e delicada a ponto de ser comparada a uma flor. E todo ano é a mesma coisa: por conta do marketing intracorporativo, lá vem as flores de lembrança e mais mensagens em cartões que, com certeza, trarão metáforas de flores. O texto que escolhi, ainda bem, escapou da armadilha.

4.3.04

Mercado de rua
Apesar do tamanho e do desenvolvimento, Salvador por vezes parece uma cidade interiorana. No Rio Vermelho, conhecido como o bairro boêmio da cidades, o tráfego é intenso nas avenidas principais. Mas há várias ruas internas, em que a movimentação é menor. É aí que o bairro muda de cara.

Logo do início da manhã, lá pelas 6h30, na rua em que moro, passa uma mulher cantando (ou gritando?): "Olha o cuscuz e a pamonha". A voz da criatura tem um alcance inacreditável. Ela está no início da rua e já se ouve o seu berro escandaloso. É um horário em que não há tráfego, portanto o barulho é menor. A voz ecoa longe. Pode ter certeza que se a janela estiver aberta, aquele que dorme será acordado para comprar pamonha, mesmo que não queira.

Quase todo dia passa uma kombi vendendo frutas e verduras, no meio da manhã. Como sempre acontece nas kombis e vans, há um motorista e um atendente, que também faz o papel de megafone, bradando alto, anunciando batatas, laranjas, cebolas, bananas e o que mais houver. A feira ambulante é bem requisitada, dizem que os preços são melhores que no mercado.

Os caminhões de venda de gás são os mais insistentes. Passam várias vezes, ficam dando voltas, subindo e descendo pela rua, anunciando e insistindo na venda do gás, funcionários gritando a plenos pulmões: "Olha o gaêeeeeeeees". Parece até que os moradores compram botijões de gás todos os dias. Pelo menos aboliram aquelas musiquinhas tétricas que eram tocadas antes.

Por falar nessas musiquinhas, lembro que, durante as comemorações do aniversário de São Paulo, alguém comentou que a música mais característica da cidade não é Sampa, de Caetano. É "Pour Elise", de Beethoven, tocada ininterruptamente nas ruas pelos caminhões de venda de gás.

3.3.04

Candomblé e folia
Uma espécie de gripe pós-festa assola a cidade. Tem gente sem trabalhar e blogueiro sem postar. A gripe - ou virose - é das brabas. Derruba mesmo, tem gente de cama. Já inventaram um nome para ela? Será Maimbé Dandá?

O Correio da Bahia fez uma reportagem bacana sobre a polêmica na apropriação dos termos de candomblé pelas músicas do Carnaval. Maimbé Dandá e Toté de Maiangá são exemplos de expressões de candomblés da nação Angola. Tem gente de terreiro que não concorda com o uso nas festas profanas. Essas expressões serão agora entoadas no terreiro com certo desconforto (ou risos contidos), já que viraram refrões de Carnaval.

Gerônimo, autor da letra de Toté de Maiangá, afirma que a apropriação de termos religiosos no Carnaval é antiga. O hino do Senhor do Bonfim não é cantado quase todo ano? Durante a saída dos Mascarados, algumas pessoas começaram a cantar, em forma transgressora: "Derrama Senhor, derrama Senhor, derrama sobre nós o seu amor". Junto com a versão de chacota: "Dê Brahma Senhor, dê Brahma senhor, dê Brahma, que a Kaiser acabou".

O que se vê nas ruas de Salvador é que as músicas de refrão do candomblé vêm enfeitiçando as pessoas, que cantam versos que não sabem o significado. Termos africanos, longínquos, que perduram com o tempo, por conta da tradição religiosa. Mas que causam um transe de animação no público.

1.3.04

A cidade e o sexo
O fim de semana começou com chuva em Salvador. No sábado, trovões e raios pareciam bradar que o verão está terminando. Muita festa de "ressaca" do Carnaval deve ter sido prejudicada. Pretendia sair à noite, mas desisti. Dizem que baiano é festeiro, mas que quando chove não sai da toca.

Aproveitei para ver em DVD a primeira fase do seriado "Sex and the City", já que não tenho TV por assinatura. Doze episódios, mais de cinco horas de duração. Inspirado no livro homônimo de Candance Bushnell, o seriado é muito interessante, relatando a vida de quatro mulheres americanas, que vivem em Nova Iorque. Solteiras, festeiras e bem de vida, não conseguem se livrar das neuras dos seus relacionamentos. Tudo é mostrado por um viés cômico e ousado.

Em geral não gosto de enlatados (ainda são chamados assim?), esses seriados importados, com aquelas risadinhas fajutas da claque. "Sex and the City", por sua vez, tem um humor inteligente e eficaz - sem as risadinhas. Uma grande vantagem de assistir em DVD é não ter que esperar a semana seguinte para assistir o próximo episódio.