30.12.05

O Natal

Passei a noite de Natal na casa de um primo, junto com mais de 60 pessoas, incluindo gente de nossa família e parentes da esposa dele. Uma mega-festa. Rolou uma brincadeira de amigo-ladrão com 45 (!) participantes, que durou quase duas horas, entre as escolhas na pilha de pacotes e os roubos, até que todos conseguissem os seus presentes. Camisas, bolsas e até livro foram os mais disputados, volta e meia mudavam de mão, roubados o tempo todo pelos participantes.

Os primos que moram em São Paulo trouxeram várias guloseimas e novidades na bagagem. As malas foram extraviadas no vôo da véspera, durante a conexão em Brasília, mas felizmente foram devolvidas a tempo de vestí-los para a noite e fornecer alguns artigos para a ceia, entre vários tipos de nozes, frutas secas e frutas exóticas.

A noite toda fiquei bebericando espumante Don Giovanni Brut, premiado em vários concursos. Uma pérola da vinicultura nacional. O anfitrião, conhecedor e apreciador de vinhos, manda buscar as caixas diretamente no Rio Grande do Sul.

As crianças encenaram o nascimento de Jesus, em um pequeno palco improvisado no grande apartamento.

Na parte das comidas, havia vários tira-gostos interessantes: conserva de pimentões vermelhos, patê de gorgonzola e carne fatiada ao vinagrete com pãozinho delícia. No jantar rolou uma salada de camarão e lula que estava deliciosa, além dos tradicionais peru e pernil assados. Para sobremesa, uma gentileza muito interessante e simpática: um enorme bolo confeitado no qual constava o sobrenome de cada família presente.

No domingo foi a vez de uma feijoada na casa de outra prima, irmã do primo e anfitrião da noite. Papos e mais papos com tios e primos de diferentes gerações, regados a cervejinha e com direito a banho de piscina. Almocei e jantei o saboroso feijão, pois cheguei às 13h30 e saí às 22h, direto para a rodoviária, onde fui deixar outros primos que retornariam para Ilhéus. Isso é que foi festa. Agora é boca fechada para perder o peso. Isto é, até a festa do reveillon.

Ode à pechincha

Não existem adolescentes que não tenham fascínio por roupas de marcas famosas, as tais griffes. Mesmo aqueles que fazem a linha alternativa, esportiva ou roqueira, têm lá as suas preferências. Mesmo se não for pela marca, haverá desejo por algum tipo de indumentária que os caracterizem por pertencer a um grupo. Batas indianas, indefectíveis camisetas pretas - lisas ou com estampas de grupos de rock’n’roll. Os moderninhos, quase sempre seguidores das batidas eletrônicas, talvez herdeiros dos clubbers, tem o visual bastante pensado, pois a vestimenta quer revelar a novidade, a invenção, o futuro.

Não escapei e não escapo do fascínio com as roupas, mas nunca fui fashion victim, desses que se endivida para comprar calças, camisas e acessórios hypados - para usar um termo próprio do mundinho. Enquanto morava com a família, eu me permitia maiores arroubos fashion-gastadores. Amadurecendo, morando por conta própria e tendo que pagar condomínio, luz, telefone, combustível, mercado e vários impostos, o consumo modístico (existe essa palavra?) teve que ficar em escala secundária.

Dou preferência a peças mais baratas, mas sempre de qualidade. Observo que o avanço da tecnologia tem permitido a confecções menores fazer artigos de qualidade e a preços bem menores. Sei que as lojas caras tem vários profissionais de gabarito por trás do alto preço. Desde o estilista até o vitrinista, passando pelo programador visual das campanhas publicitárias.

Mas eu tenho contas a pagar e saio feliz quando economizo nas compras. Como aconteceu antes do Natal. Comprei uma camisa bacaninha em uma loja simples. Em uma outra loja, uma confecção local com pose de bacana, uma camisa idêntica custava 100 reais a mais. Eu me recuso a pagar.

24.12.05

Os dias

Aproveitando o dia nublado para pôr as leituras em dia. Estou na companhia de “Até amanhã, outra vez”, livro de crônicas de Nélida Piñon. Adoro crônicas. Me veio na mente o “Crônicas de Viagem”, de Cecília Meireles. Fiquei comparando. Nélida é mais cerebral, racional, filosófica. Cecília é pura sensibilidade, profundidade, quase magia. As duas são fantásticas.

Ontem, no final da tarde, fui me desvencilhar do calor nas águas da praia do Porto da Barra. Ah, que saudade daquele mar quase piscina. Havia marcado com alguns amigos. E. chegou com os últimos raios de sol. Tomamos banho novamente, agora com a praia iluminada pelos refletores.

Não me canso de falar do Porto da Barra. É a praia mais bacana que conheço, quando se reúne beleza, águas tranqüilas para banho e pôr-do-sol no mar, o que é uma raridade no Brasil, pois o sol normalmente se põe do lado do continente.

Hoje estou me preparando para a confraternização em família, que será em um local diferente. O costume é sempre passar em Ilhéus. No almoço, fiquei restrito a uma saladinha de trigo no almoço, para não engordar e poder ficar à vontade no jantar. Nham nham.

Segundo as colunas de astrologia - aquelas mais confiáveis, que elencam a posição dos astros -, o cenário hoje está bom. Estou me sentindo revigorado, depois de um período de chateações profissionais. Tudo passa, ficam as lições. Sem querer ser ingênuo, acho que todas as experiências, prazerosas ou dolorosas, têm sempre uma faceta importante. Agora é só festa.

E, para que o Natal seja pleno, brindarei pela memória daqueles que sempre estiveram por perto, mas que desta vez não estarão: meu avô, meu pai e minha avó, que se foi este ano. Para mim, homenagear os mortos não é cultivar a tristeza da perda. A boa lembrança é pensar como eles foram importantes e como estariam felizes por estarmos juntos. Mesmo que em planos diferentes.

Feliz Natal, caro leitor.

22.12.05

Fim de ano, festas e cansaço

Pessoas correndo pelas ruas em busca dos últimos presentes e eu me mantenho querendo paz, conforto e descanso. É tudo que eu desejo. Terça-feira fui ao aniversário de um amigo que, como de costume, serviu um lauto jantar aos convidados.

Várias pessoas queridas foram abraçá-lo. Fui apresentado a uma atriz baiana que eu só conhecia de nome e de fotos. Ela atualmente trabalha em São Paulo. Dona de um belo par de olhos claros, é de uma simpatia contagiante.

No cardápio da noite, um camarão ao creme com manga. Uma delícia, o camarão estava apenas ligeiramente cozido. Para acompanhar, um risoto de cogumelos secos e nozes. Foi pena que estava tarde e não pude esperar a sobremesa. Não tenho mais pique para virar a noite e trabalhar no dia seguinte. Hoje em dia, o desconforto de acordar com sono fala mais alto do que o prazer de curtir as festas até o final. Prefiro sair antes.

Este ano vou passar o Natal em Salvador. A família vai vir toda para cá. Que bom que não vou precisar pegar a estrada.

Amor sobrenatural

David (Mark Ruffalo) aluga um apartamento, mas surge uma jovem bonita e controladora, Elizabeth (Reese Whiterspoon, de Legalmente Loira), que insiste que o apartamento é dela. Ela aparece e desaparece sem deixar vestígios, o que faz David acreditar que se trata de um fantasma.

E Se fosse Verdade (Just Like Heaven, EUA,2005) é uma comédia romântica que aposta na dupla Ruffalo-Reese para conduzir uma história que não pode ser levada ao pé da letra, pela razão lógica, mas simplesmente aceita. David irá descobrir que ela está em coma e vai lutar para que os aparelhos não sejam desligados.

Um filme leve, água-com-açúcar, com destaque para o roteiro bem amarrado e diálogos espirituosos. A dupla de protagonistas tem um bom entrosamento. Lembra vagamente Ghost. Alguém se lembra?

18.12.05

Camarões no mar espesso

Havia, em um reino hoje distante do meu bolso, um restaurante italiano no qual majestosamente reinava um prato de macarrão com camarão ao molho branco. Eram tempos nos quais eu ainda não tinha me iniciado nos segredos das massas.

Aquela massa era saboreada de uma maneira delirante, com a prática da pesca de camarões de bom tamanho em um lago espesso de molho branco com aroma de noz-moscada.

O tempo passou, aprendi algumas nuances do preparo das massas e dos molhos, e, de vez em quando, vou às panelas para matar as saudades. Os molhos italianos não são muito complicados e tem preparo rápido. Portanto, nos dias que correm, ao sair para almoçar ou jantar, prefiro experimentar pratos com os quais não tenho intimidade no preparo ou que não me disponho a fazer. Não é por esquecimento das massas, de forma alguma.

Tanto que ontem fiz um espaguete com camarão ao molho branco. Os camarões vieram de Ilhéus e dormitavam no meu congelador há algum tempo, contando com a minha pouca disposição para retirar-lhes as cascas.

Armado de coragem, paciência e persistência, eis que parto ao trabalho minucioso de descascamento sem desmanchar a carne. Aprendi que primeiro deve-se ferver os camarões para depois descascá-los. Fica mais fácil.

Piquei cebola e pus um pouco de manteiga para refogá-la. Mais um dente de alho picado e um pouco de sal. A seguir os camarões, para tomar gosto. Mexe-mexe, para lá e para cá. Um tantinho de salsa picada. Depois, o creme branco. Leite com um pouco de maisena, para garantir a textura, e mais um pouquinho de manteiga, para a untuosidade. Por fim, uma caixinha de creme de leite.

Eis o meu segredo para os molhos de base cremosa. Adiciono leite com maisena ou farinha de trigo e um pouco de manteiga. Fica mais leve e menos enjoativo do que se somente for usado o creme de leite.

O toque final ficou por conta da noz-moscada ralada na hora. Ah, e do queijo parmesão também ralado no momento de servir.

15.12.05

Mais beleza americana

Sob a aparência de normalidade, uma típica família norte-americana esconde várias crises. Abalados pela perda do filho, campeão de natação, Sandy (Sigourney Weaver), a mãe, passa a usar drogas; Ben (Jeff Daniels), o pai, está à beira da depressão; Tim (Emile Hirsch), o filho mais novo, passa pelas angústias da adolescência. E Sandy está prestes a revelar um segredo doloroso, capaz de dividir a família.

Heróis Imaginários (Imaginary Heroes, Eua, Alemanha, 2004), escrito e dirigido pelo novato Dan Harris, é um filme denso, que aborda temas difíceis e traz um ponto de vista ácido e irônico sobre a vida familiar, pontuado pelo tom de sarcasmo em cima do drama.

Sandy possui um comportamento infantil, até engraçado, e mantém uma tocante relação de cumplicidade com o filho mais novo. Os diálogos são bem construídos e convincentes. Um filme até certo ponto triste, mas sempre com uma ponta de esperança.

11.12.05

Na praia, com reclamações

Ainda há tempo para ir à praia em Salvador com certo sossego, sem engarrafamentos monstruosos. A temporada da porteira aberta para os visitantes ainda não começou. Os turistas estão fazendo as compras de Natal e esperando para passar as festas de final de ano com as famílias. Depois, é salve-se quem puder.

Não se consegue estacionar, não se consegue um lugar para sentar. "Não há mesas disponíveis". Preços altos. Como se não bastasse, há um fenômeno acontecendo em Salvador. De tanto vir passear na cidade, os argentinos resolveram se tornar donos de bares. Sei de pelo menos uns três que pertencem aos vizinhos. Não tenho nada contra eles, mas, exatamente em uma das minhas poucas idas à praia, um incidente bobo, mas chato, aconteceu justamente em uma barraca gerenciada por argentinos.

A cobrança indevida de uma cerveja a mais. Só isso. Foram pedidas duas cervejas e cobradas três. Na barraca Aquarela Beach, no final da badalada praia de Stella Maris. O que me chamou a atenção não foi nem a cobrança indevida, mas o modo incisivo como o garçom (se é que aquilo era garçom, estava mais para fugitivo da Febem) afirmou o consumo, e pelo modo como o gerente (argentino, argh!) pareceu conivente com o argumento do garçom. Tudo porque havíamos mudado de mesa. Mas o pedido havia sido transferido de uma para a outra. Ora, duas cervejas não deixam ninguém tonto o suficiente para esquecer como se conta. De nada adiantou mostrar as duas garrafas vazias que jaziam debaixo da mesa.

O gerente me mostrou as comandas. Havia o pedido das três. Mas como garantir a veracidade? Ele perguntou se era a primeira vez que eu frequentava o local. Eu disse que sim e que provavelmente ia ser a última. Ele se mostrou atento, ofereceu até uma sobremesa da casa para levar, o que prontamente recusei.

Tive a impressão de que foi esperteza do garçom ou, pelo modo como se comunicaram, há um acordo para situações desse tipo. Eles pareciam dizer que o cliente nunca tem razão. Quis acreditar que se a gerência fosse brasileira, o tratamento seria melhor. O que também não é nenhuma certeza.

Evite aquela barraca. Se fazem isso com clientes que pedem duas cervejas, imagine com grupos grandes de beberrões. Os argentinos devem ser acostumados com os seus compatriotas, famosos pelo mau comportamento como turistas. Os corretores de imóveis bem sabem. Alugar apartamentos ou casas para temporada a grupos de argentinos é a certeza dos consertos que vão precisar ser feitos depois.

10.12.05

Festas de fim de ano

Final de ano e ruas do comércio infestadas de gente atrás dos presentes. Alguma novidade? Nenhuma. Festas de confraternização. Blá blá blá. Cansaço. As férias estão longe, mas nem tanto. Sonhar é preciso. As baterias da imaginação precisam de recarga.

A programação musical de Salvador vai esquentando com o calor do verão. Para quem tem tempo e disposição, o som rola em todo canto da cidade. Este ano, a promessa é o grupo Afrodisíaco, liderado pelos cantores Jauperi e Pierre Onassis, oriundos de outros grupos de axé. Os ensaios são concorridíssimos, eles estão ocupando o espaço deixado por Margareth Menezes de esquentar a folia antes do Carnaval. Vi o show na festa corporativa promovida pela empresa em que trabalho. Sim, eles estiveram lá animando a noite, no Solar do Unhão, na Avenida Contorno.

O som é bom, eles retomam alguns sons da MPB dos anos 80 e 90. Mas não há nada muito criativo. Eles não se dão ao trabalho nem de mudar a sequência das músicas. É sempre o mesmo roteiro em todo show. Que obedece à mesma sequência do disco. Falta de imaginação ou preguiça de inovar?

7.12.05

Libelo anti-semita

No século XVI, na cidade de Veneza, Bassanio (Joseph Fiennes) pede um empréstimo ao amigo Antonio (Jeremy Irons) um empréstimo para que possa cortejar Portia (Lynn Collins), uma rica herdeira. Antonio tem recursos, mas o seu dinheiro está comprometido em empreendimentos no exterior. Os dois então recorrem ao judeu Shylock (Al Pacino). O agiota impõe uma condição absurda: se o empréstimo não for pago em três meses, Antonio, enquanto avalista, entregará um pedaço de sua própria carne. O naufrágio das suas embarcações deixa Antonio em situação complicada. O caso é levado à corte para que se defina se a condição será mesmo executada.

O Mercador de Veneza (The Merchandt of Venice, EUA,2004), dirigido por Michael Radford, é baseado na peça teatral de William Shakespeare. A história é claramente anti-semita. O judeu é mostrado como usurário e desumano.

A tradução manteve a língua portuguesa formal, com a utilização da segunda pessoa do verbo. Várias frases em ordem inversa mantêm o caráter poético de Shakespeare, mas exigem esforço de compreensão. O time de atores é de primeira, no entanto a atuação mais destacada é de Al Pacino. O filme tem primorosos e premiados figurinos.

1.12.05

Oásis

É interessante ler textos antigos publicados no blog. Acho um bocado de alhos e bugalhos: erros de português, bobagens, fatos interessantes, lembranças, frases mal escritas, outras mais inspiradas. Tem coisa que dá vontade de apagar. Tem coisa que dá vontade de reviver. Há certo prazer em ver os textos publicados. Consolo para intervalos de secura criativa.

Elas, os sapatos e a poesia

Maggie (Cameron Diaz) é infantil, desordenada, beberrona e não consegue ficar em nenhum emprego. Rose (Toni Collette) é advogada de sucesso, recatada e organizada. Em comum, além da paixão pelos sapatos, o fato de serem irmãs. Em seu Lugar (In Her Shoes, EUA, 2005), direção de Curtis Hanson (8 Mile – Rua da Ilusões), começa com cara de comédia romântica, mas se estabelece no drama familiar das duas irmãs que perderam cedo a mãe e buscam resgatar o passado. Para isso vão ter a ajuda da recém-descoberta avó Ella (Shirley MacLaine), que elas pensavam estar morta. A avó mora em um agitado retiro para idosos, em uma cidade litorânea.

Mesmo centrado no drama, o humor perpassa todo o filme, o que reduz o peso dos conflitos familiares causados, em boa parte, por dificuldades de comunicação. Fica evidente a mensagem de que a experiência de pessoas idosas pode ser útil na resolução de conflitos da juventude. Bom roteiro, que poderia ser adaptado para novela ou seriado de TV. Imperdíveis as cenas em que Maggie lê poemas de Elizabeth Bishop e E.E. Cummings.