2.12.12

Falando português

O dia começou cinzento e com o termômetro apontando para cima de zero. A neve da véspera, no último dia de novembro, que chegara como uma prévia do inverno, já tinha sido derretida pelos cristais de sal espalhados nas ruas pelos caminhões da Prefeitura. Ainda restavam pequenas pedras de sal que estalavam sob os pneus da bicicleta.

Consegui vencer o receio de pedalar no tempo frio e tomo como limite a sensação térmica de -5 graus para enfrentar as ruas durante outono e inverno. Olhei no site de previsão do tempo e gostei do que vi. Temperaturas em torno de 5 graus e nenhuma precipitação. Neve caindo incomoda menos do que o terror do corpo úmido e resfriado pela chuva em baixas temperaturas.

Peguei a bicicleta e parti rumo à região portuguesa. Objetivo: Meetup de Português. Encontro para praticar português, conversar, socializar, tomar café e apreciar acepipes da cozinha lusitana e brasileira.

Cheguei antes do horário e me acomodei com calma em uma das mesas da aconchegante padaria portuguesa que mais parece uma casa de chá ou de café. Pedi água e um caffè lungo, que lá é chamado de café americano, tirado na hora, na máquina, forte e encorpado. Pedi um pouco de leite que, em vez das costumeiros mini copos lacrados de plástico, me foi servido em uma minúscula leiteira de aço inox, que me chamou atenção e me fez sentir a diferença e o charme de estar em um ambiente de cultura europeia.

É um tipo de serviço inimaginável nas grandes e práticas redes de café norte-americanas, nas quais o leite, o creme e o açúcar ficam disponíveis em um balcão e quem quiser que se sirva.

Peguei o café e mais água para me recuperar dos cinco quilômetros de percurso, vencidos com a proteção de touca de lã, luvas, casaco, calça e long john esportivo. Esqueci o capacete em casa.

Duas da tarde e ninguém à vista. Pouco depois vi que uma senhora loura chegou e se sentou em uma mesa próxima e ficou folheando uma revista, enquanto eu também olhava um jornal português editado em Toronto. Em formato tablóide, o jornal era colorido e cheio de fotos. Fiquei pensando no custo da produção e impressão.

Vida pessoal de dirigentes de futebol português, incentivos ao turismo na Ilha da Madeira, o lauto jantar comunitário em Toronto da festa da Matança do Porco, a aquisição de um caro apartamento em São Paulo, no Brasil, pelo jogador lusitano Cristiano Ronaldo. Os emigrantes saem do país, mas a cabeça lá permanece.


Dei uma olhada para a senhora na mesa ao lado. No site em que o encontro é combinado, nem todas as pessoas colocam foto, fica difícil reconhecer alguém. Ela me olhou de volta e eu perguntei se tinha vindo para o evento de português. Ela confirmou e se mudou para minha mesa, que era maior.

Começamos a conversar e ela me contou que nasceu em Portugal e se mudou criança para o Brasil, para o Rio de Janeiro, onde cresceu e estudou. O seu sotaque de português não tinha nada, era bem brasileiro e, de vez em quando, mostrava os erres e esses cariocas. Ela me disse que estava esperando mais uma amiga, que não tinha se inscrito no evento, mas estaria vindo mesmo assim.

Logo depois chegou uma garota morena-clara, de cabelo bem liso, tipo índio, parecia brasileira. Era canadense, filha de pais do Sri Lanka. Daí aparência indiana  Ele já esteve no Brasil duas ou três vezes, em Salvador(!), onde foi estudar e praticar português.

As pessoas começaram a chegar. A amiga da loura chegou e ela tinha uma história bem semelhante. Nasceu em Portugal, viveu no Brasil durante a juventude e mora no Canadá há bastante tempo.

Um canadense careca se aproximou meio sem jeito e se apresentou. Ele é professor de inglês, morou no México por dois anos, fala espanhol melhor do que o francês aprendido no Canadá e se vira bem em português. Depois é a vez de um outro brasileiro chegar. Ele que foi um dos organizadores do encontro.  Um senhor de Sao Paulo que mora em Toronto há pouco tempo. Ele vivia antes em Windsor, cidade mais ao sul da província, perto da fronteira com os Estados Unidos.

Delicias
A essa altura, as duas mesas iniciais não eram mais suficientes,  Mudamos a posição, para poder juntar mais mesas e cadeiras.

Assim a lista foi aumentando até completar umas treze ou catorze pessoas. Perdi a conta de quantos vieram, pois contei até doze, mas sei que chegaram mais uma ou duas pessoas bem mais tarde. O papo ficou rolando, eu mudei de lugar na grande mesa para conhecer mais gente.

Lá pelas quatro da tarde os primeiros a chegar começaram a ir embora. Pedi mais um café, um pastel de natas e um rissole de camarão. Não tinha mais coxinha de galinha, uma pena.

Pão português em Toronto
Fiquei mais um pouco conversando com uma canadense filha de portugueses. Ela falava muito bem a língua dos antepassados, algo que nem sempre acontece com os filhos de imigrantes lusitanos. Ela me disse que aprendeu e praticou muito com a avó portuguesa, que não falava inglês.

Umas cinco da tarde, depois de muita conversa, dia curto de outono já escurecendo, alcancei o meu casaco e mochila, vesti toda a parafernália para o frio, peguei a bicicleta e parti para casa com o vento gelado batendo sem piedade no rosto.

3 comments:

Olga said...

gostei muito do seus comentarios, achei engracado o Senhora, mas que fazer... e que nunca tinha escutado esta palavra em portugues... Bom adorei o encontro e acho que havia umas 23 pessoas. Ate a proxima.

Anonymous said...

Eu gostei muito o Meetup de Português, e tambem o seu blog. Obrigado!

danilo said...

Oi Olga, que bom que você gostou! Até o próximo encontro. Olá Evan, vi o seu blog, muito bom! Vou ler com mais calma nos próximos dias. Abraços!