Se for assim, auto-ajuda já!
Quase tudo o que a escritora gaúcha Lya Luft escreve parece óbvio. Só que ela escreve e descreve o óbvio com muita propriedade. De uma forma gentil, que nos faz sentir quase uma carícia. É uma das poucas vozes que se levanta para criticar as pequenas ditaduras que a moda, o consumismo e a vida moderna nos impõem de forma cruel.
Talvez por ser mulher, com sensibilidade apurada, sinta mais profundamente algumas das pequenas tragédias que a vida nos traz todos os dias. Perceber que estamos envelhecendo, sentir que não ficaremos ricos, constatar que não teremos os corpos malhados dos homens ou mulheres estampados nas revistas, observar que precisamos mais ouvir que falar, que precisamos ser menos exigentes com nós mesmos e com as outras pessoas, e que todos nós- ricos ou pobres, feios ou bonitos, famosos ou anônimos, cultos ou incultos - teremos o mesmo fim. Que não é preciso nem dizer qual é.
O que Lya Luft argumenta passa distante das polêmicas midiáticas. Ela sempre procura um tom sensível, sem agredir o leitor ou procurando agredir o mínimo possível. Ela comenta pequenos detalhes que os escritores mais jovens e os articulistas das revistas não têm interesse em combater. Há alguma revista feminina que tenha uma linha de pensamento crítico semelhante ao da escritora? Ou é mais fácil produzir matérias de moda, beleza e comportamento de consumo, quase sempre estimuladas por empresas?
E o que tem acontecido com o senso crítico das pessoas em relação ao seu próprio umbigo? Na falta de eco para as suas reclamações, precisam de analista para reforçar as suas opiniões e posicionamentos contrários ao modo vigente de viver, modos de consumir, modos de se comportar, modos de raciocinar. Ou mesmo para conseguir forças para lutar contra suas próprias dificuldades de perceber o mundo de forma clara. Para enfrentar tudo que normalmente é tido como o esperado pela sociedade conservadora - sempre pouco complacente com a subjetividade alheia.
Uma vez presenciei um comentário interessante. Alguém ganhou um livro da escritora de presente. Se não me engano, foi o Perdas e Ganhos. Outra pessoa não se conteve: "Ah, Lya Luft! Soube que é livro de auto-ajuda". Em um tom levemente depreciativo.
Ah, se todos os escritores brasileiros, de auto-ajuda ou não, tivessem a capacidade de tradução (ela também é tradutora de alemão!) das alegrias e dores da vida cotidiana como a gaúcha tem...
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