15.11.04



Aula de cinema

Má Educação (La Mala Educación, Espanha, 2004) é um filme que só poderia ter sido realizado por um diretor consagrado como o espanhol Pedro Almodóvar. Até poderia ter sido feito por outro cineasta, mas dificilmente alcançaria a divulgação e o sucesso que vem obtendo. Talvez ficasse restrito às salas do circuito cultural.

O mais novo trabalho de Almodóvar é um filme que trata de assuntos difíceis e delicados, que não são abordados com frequência e coragem, mesmo no cinema autoral. Pedofilia na Igreja Católica, homossexualismo, travestismo, consumo de drogas são mostrados de forma clara, direta e ousada.

O mexicano Gael García Bernal, no papel de Ignácio, reafirma que veio para ficar no panteão dos grandes atores. A sua sensibilidade ao interpretar um travesti cantando (dublando?) a música Quizás, Quizás, Quizás é intensa e delicada. Bernal também protagoniza de forma convincente cenas eróticas fortes.

O diretor soube extrair o melhor do ator. Segundo Almodóvar, "a câmera busca Gael". O resultado são perfeitos enquadramentos de câmera em close-up, seja com o ator travestido ou na versão sem maquiagem. Bernal, que recentemente compôs o herói Che Guevara na juventude, agora se transforma em um baixinho frágil, dissimulado e intensamente sexual.

O roteiro, que levou vários anos para ser elaborado por Almodóvar, é simplesmente genial. As narrativas se intercruzam e vão sendo magistralmente costuradas pela direção, com desfecho coerente e bem-feito, que consegue articular todas as peças.

Má Educação não tem o apelo emocional de Fale com Ela, trabalho anterior do espanhol. Desta vez, o exercício intelectual do texto fala mais alto e é o ponto forte do filme. Almodóvar reforça o seu lugar entre os maiores do cinema atual. O talento é ainda mais brilhante pela conjugação do roteiro e direção na mão da mesma pessoa.

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