28.12.04

Come-come
A festa de Natal foi cheia de gente. Gente que não acaba mais. Em uma bela e gande casa, mais de cinquenta pessoas. A família vai aumentando, as crianças de ontem vêm com seus pares. Já trazem até filhos.

Uma brincadeira de amigo-ladrão para agitar. Uma mesa de entrada com uma conserva de berinjela e picles, com pouca acidez. Pãezinhos delícia, que são os pães de queijo da Bahia. Uma guloseima que só por aqui se acha e que um dia ainda vai se tornar expressão da cozinha baiana. É um pão de massa delicada, que desmancha na boca. Quase sempre vem acompanhado de recheio de queijo e polvilhado com queijo ralado. Nas festas, os pãezinhos são também utilizados sem recheio, para que os convidados os preencham com frios, patês ou conservas

Um lauto e belo jantar para agradar aos olhos e ao estômago. Apesar de arriscado, o costume de cada ala da família trazer um prato diferente acaba dando certo. As saladas foram o destaque da noite. As pessoas quase não chegaram no peito de peru, pernil, presunto e no bacalhau.

Salada de massa em formato de grão de arroz, com tomate seco, amêndoas, um pouco de maionese, temperos e coroada por folhas de manjericão. Salada de maçã, kani e mais outras coisas. Uma salada de molho escuro, agridoce, com queijo e presunto em cubos, mais uvas, ameixas, amêndoas, damascos e outras coisinhas indefiníveis - ou não recordáveis. Uma salada de frango defumado com presunto, abacaxi e maionese. A grande quantidade e variedade era justificável pelo batalhão de pessoas presentes.
Espírito de Natal
Na atualidade que nos cerca, o Deus Consumo parece ter ocupado o lugar anteriormente dedicado a outras forças mais elevadas. Em época de festas de Natal, o fato fica ainda mais visível.

Aumento de assaltos, conflitos domésticos, stress, energia conturbada nas ruas e centros de compras. Em uma época em que a paz deveria reinar, as necessidades afetivas, mais do que nunca, parecem vir à superfície. Não é fácil para a sociedade lidar com um espírito natalino desvirtuado.

Os ladrões estão soltos, ativos e operantes. Pudera, eles também querem reverenciar o Deus Consumo. As oferendas modernas são os presentes de shopping. Sejam comprados, roubados ou trocados em feiras-de-rato. Incensado pela TV e cultuado pelos comerciantes e pessoas de marketing, é no Natal que a adoração do consumo se torna mais intensa. Tristemente.

23.12.04

Entre a praia e a avenida
Uma grande cidade litorânea é um local de contrastes. Salvador, nem se fala. É uma terra incomum. Ao lado de engarrafamentos e de carros fechados em seus ares condicionados, na praia ao lado, a menos de 50 metros, pescadores, mergulhadores, bebedores, banhistas e jogadores de futebol passam o dia como se nada ocorresse no mundo vizinho.

A praia de Amaralina é um bom exemplo. Caminhar na beira da praia é passear no limite entre dois universos. Ônibus e carros passam atentos ao radar de velocidade. Na beira do mar, pescadores vêm puxando uma grande rede. Procurando os peixes e atraindo os olhares dos passantes, repetindo uma atividade que vem da Antiguidade, mas que não perde a beleza e a poesia, já cantada por mentes privilegiadas.

Na rua tranquila, garotos inventam um novo esporte. No país que não pára de gerar pés de talento, aparece o futevôlei sem a rede. Basta marcar o quadro no chão, times a postos, chutes e cabeceios de cá para lá, diversão garantida. Está criado o próximo esporte olímpico. Invenção genuína brasileira.

A maré está baixa, a areia é extensa. Forma-se uma pequena ilha cercada pelos recifes de coral. É espaço suficiente para atrair uma pessoa tocando atabaque e outros dançando ao redor. Ritmo religioso? Diversão? Em uma terra musical como Salvador, podem ser novos talentos - ou simplesmente gente que sabe apreciar as coisas simples da vida.

O sol vai sumindo, chamando para o conforto de casa. O prédio estabelecido ao longe, emoldurado pelas luzes do fim de tarde, sobre a grande pedra e olhando para o mar, é o exemplo mais puro dos contrastes da vida urbana. A caminhada vai terminando. O ritmo das pernas parecer ajudar a arrumar as idéias e a queimar as calorias extras das festanças de fim de ano.

22.12.04

Natal
Estarei alguns dias fora da cidade. Não estranhem se o blog voltar mais gordo.
Crimes no cinema pornô
Baseado em fatos reais, Crimes em Wonderland (EUA, Canada, 2003) retrata John C. Holmes (Val Kilmer), um lendário astro do cinema pornográfico norte-americano dos anos 60 e 70, que viu sua carreira ruir pelo vício em drogas pesadas. Holmes associa-se a um bando de traficantes e ladrões conhecidos como a gangue de Wonderland, que atuava nos subúrbios de Los Angeles. Para pagar uma dívida, ele articula com a gangue um assalto à casa de Eddie Nash (Eric Bogosian), criminoso libanês. O assalto torna-se violento e Nash prepara sua vingança contra o bando, provocando uma sangrenta chacina testemunhada pelo ator.

A trilha sonora regada a rock and roll e a bela edição de imagens não são suficientes para fazer um filme atraente, de narrativa cativante, já que o desenrolar dos fatos é conhecido ou facilmente previsível. A estratégia da direção foi abusar dos recursos de flash-back, o que acabou tornando o filme monótono e cansativo, mesmo com várias cenas de violência. O filme só vale mesmo como registro histórico do ator John Holmes, que morreu em 1988 vítima de AIDS.

20.12.04



A saga do garfo continua
Ontem jantei mais do que nunca. Amigos reunidos, o ciclo de festas etílico-gastronômico-comemorativas em continuação. No bufê da casa do aniversariante, uma fantástica mesa de entradas. Um enorme pernil de porco transformado em presunto defumado. Feito em casa!

A carne passou dias e dias maturando, depois em banho de temperos, depois em leve cozimento, a 80 graus centígrados. Segundo as informações obtidas, antes do cozimento a peça já tinha virado um presunto cru, estilo jamón espanhol ou presunto de Parma. Depois do cozimento ficou parecido com um Tender, só que mais saboroso e com mais personalidade. O interessante é que mesmos os pedaços internos do pernil estavam bem temperados e saborosos. Era o resultado da longa maturação e da infusão em ervas.

Além disso, na mesa de entradas ainda havia patê de fígado (tipo terrine) e de salmão. Barquetes de camarão e queijo.

O prato principal foi um bobó de camarão acompanhado de arroz branco. Uma delícia, com camarões enormes. Completando a mesa, havia salada verde com manga e kiwi e um molhinho especial, de alho, cebola, ervas, azeite de oliva e vinagre balsâmico. Simples e eficaz.

Os doces, ah, os doces. Um torta-merengue com suspiros, morangos e cerejas. Um outra torta de massa de pão-de-ló recoberta de doce de leite com coco. Quase não havia mais espaço em meu estômago, mesmo assim, não fugi da batalha e segui firme adiante, assim como os demais persistentes guerreiros do garfo que estavam no recinto.

Vários monstros reunidos, o que significa muitas risadas. Encontro com ex-professora da faculdade. Também havia gente ligada à moda baiana. Algumas pessoas de teatro. Isto é, um total de muita gente bacana. Conversei com este dramaturgo e blogueiro, com quem, nos últimos tempos, só trocava informações virtualmente. Também conheci este blogueiro.

18.12.04

Personal trainer impresso
Para quem nunca ouviu falar, Lian Gong não é nenhuma nova atriz-sensação do cinema oriental. É um método de ginástica terapêutica excelente para compensar dores causadas por má posturas ou movimentos repetitivos de trabalho. Alguma lembrança do seu computador?

Estou fazendo os execícios seguindo as instruções de um livro. Já viu algum maluco fazer ginástica seguindo um livro? Só é possível porque os movimentos são feitos lentamente.

O método Lian Gong foi criado por um médico chinês e já tem milhões de praticantes no mundo. Inspirados nas lutas marciais orientais, os movimentos têm ação focada em ombros, pescoço, costas, braços, pernas. Há algumas sequências que prometem alívio de dores lombares e até de problemas de hipertensão. Por conta dos bons resultados, os exercícios têm sido utilizados em empresas, para reduzir os problemas causados por LER (lesões por esforços repetitivos) dos funcionários.

Os exercícios trazem relaxamento de corpo e mente e alívio para aquelas incômodas dores após longas digitações ou leituras no computador. É ótimo. O desafio é persistir na prática.

17.12.04

Por e-mail
Sou o mais novo e empolgado proprietário de um exemplar de O Caderno de Cinema de Marina W. O livro chegou pelo correio e me trouxe pulsos acelerados.

Tive uma surpresa ao ler o texto introdutório. Eu já o havia lido antes no blog da autora, não lembro quando. É uma delícia: "Filmes são como livros. Eu gosto, você não. Você gosta, eu nem vejo. Eu gosto da palavra HELP escrita no céu no fim de Celebridades, do Woody Allen. Acho aquilo lindo. (...) Fred Astaire flutuando no ar. O carteiro gravando todos os sons para o poeta. Che Guevara atravessando o rio a nado. Os beijos!"

Esse texto tem um significado especial para mim. Quando o li pela primeira vez, era encerrado com "Os beijos, os beijos." Talvez a autora nem lembre disso. Achei o máximo, pois ela quebrava uma sequência de cenas de cinema e dava uma idéia de exaltação ainda maior, como se tivesse escrito rápido, quase arfante, para não esquecer. Como se estivesse a dizer: "Caramba, como fui esquecer de listar os beijos?".

Quando li o texto novamente, ela havia trocado por "Os beijos!", a expressão ficou mais assertiva. E também ótima, definitiva.

Para mim, ficou aquela impressão que ela decidiu apagar. "Os beijos, os beijos". Como se a emoção da lembrança dos beijos fosse ainda maior do que o texto pode conter.

Nada como ganhar um livro. De quebra, vindo pelo correio e com dedicatória.

De Fome Zero a Regime Total

O governo Lula vai ter que se virar para continuar justificando o Fome Zero. A pesquisa do IBGE veio como uma pá de cal em cima do programa federal: 40,6% dos brasileiros estão acima do peso. A fome, no entanto, continua presente, concentrada nas mulheres do Nordeste rural. Pela pesquisa, foi detectado que o mais grave, na população com 20 anos ou mais, é o excesso de peso.

O IBGE aponta que a pobreza no Brasil não se manifesta por meio da fome, mas sim em termos de qualidade de vida e de desigualdade de rendimentos.

A doação de alimentos é só a primeira fase do Fome Zero. O programa vai além e procura incentivar o desenvolvimento regional sustentável. Mas o nome não dá mais. É demagógico e populista. E agora revela pouco embasamento na ação e cai em descrédito.

Você doaria alimentos para um país em que a população está acima do peso?

16.12.04

Simoninha, Fernanda Porto, Cláudio Zoli e Max de Castro
Para quem quiser saber mais sobre as atrações programadas para o Festival de Verão e decidir se vale a pena ou não dar uma chegada por lá, é só clicar aqui. O dia que achei mais interessante é a sexta-feira, quando o pessoal da bossa eletrônica, leia-se gravadora Trama, se apresenta.
Projeto Sesi Comédia
Em janeiro, entram em cartaz os espetáculos Ciderela Black Power, Mirandolina (leia texto lá no site Claque) e Só o Faraó Tem Alma, no Teatro Sesi, no Rio Vermelho.

Vi Só o Faraó Tem Alma na Sala 5 da Escola de Teatro. O texto é muito interessante. Uma crítica mordaz ao mau uso do poder político.

15.12.04

Sedução atualizada
Alfie é um inglês que ganha a vida dirigindo limusines em Nova York. Conquistador inveterado, descarta as suas conquistas amorosas sem o menor remorso. Alfie - O Sedutor (EUA, Inglaterra, 2004) é a refilmagem de um sucesso dos anos 60 com Michael Caine no papel-título. Na versão atual, o desempenho é do inglês Jude Law (de Capitão Sky).

O Alfie dos anos 60 era cafajeste e lidava com as mulheres que eram reféns da ditadura dos costumes sociais antes da revolução sexual. O Alfie moderno valoriza roupas caras e mantém o desempenho de conquistador, mas se torna quase uma vítima de alguns exemplares poderosos do sexo feminino. Ele se reavalia o tempo todo e revela a sua fragilidade.

O filmagem mantém um certo clima dos anos 60, principalmente na trilha sonora, que é um dos destaques do filme. O Rolling Stone Mick Jagger é a voz que embala algumas cenas. Jude Law tem boa atuação, em papel inicialmente recusado por Brad Pitt.

14.12.04

Mau humor
Acho amigo secreto de Natal uma coisa desnecessária. Entra ano, sai ano, as pessoas, quase sempre as mulheres, inventam a tal brincadeira meio sem graça. Em ambientes formais, com várias incompatibilidades, a chatice é maior ainda. É um festival de artificialidades. Aquela modalidade em que um rouba o presente do outro é até engraçada. Outras são o cúmulo da babaquice. Uma vez participei de uma em que a pessoa tinha completar a frase: "Se o meu amigo secreto fosse um carro seria...", até descrever a pessoa para que os demais descobrissem de quem se tratava. Dá para imaginar as pérolas que vinham daí.

O chato da brincadeira é que sempre é uma coisa meio imposta. Alguém dá a sugestão, a maioria não fica a fim de participar, mas quase ninguém ousa recusar, pois fica chato se não colaborar. Vixe, até rimou. Mesmo todo mundo achando um saco. Deve ser para combinar com o do Papai Noel.

Na entrega dos presentes, sempre tem um que não gostou do que recebeu. O outro esperava uma coisa diferente. Outro achou que pagou caro e levou presente barato. A melhor opção é colocar o valor o mais baixo possível, o que simplifica tudo e dá o tom de gozação aos presentes. Fica mais na realidade e na brincadeira.

12.12.04

Destino
Os gatinhos estão prestes a sair de casa e ganhar o mundo. Um já foi embora e parece que se adaptou bem, surpreendentemente, ao lado de um cachorro. Os outros cinco correm por todos os lados espalhando energia pela casa. A maior pena é imaginar a gata-mãe miando e procurando os filhotes pelos cantos. O gato-pai é carinhoso que só. Abraça, lambe, mordisca os pequenos. Ainda assim, ele sentirá menos falta.

Sem se contentarem somente com o leite da gata, os pequenos já avançam sobre a ração dos pais. O resultado da gula fica pela casa e haja paciência e limpeza. Nem todos estão adaptados com a argila sanitária. Estão, portanto, prontos para o mundo.

O destino dos gatinhos está definido. As incertezas prometem criá-los sob seus cuidados. A natureza é sábia e em pouco tempo os deixa independentes. Enquanto seres humanos demoram vários anos para ficarem prontos para lutar pela sobrevivência - e às vezes chegam nos trinta anos sem conseguir - os animais são mais espertos. Em algumas semanas viram-se sozinhos.

10.12.04

Invasão bárbara
A revista Trip fez uma reportagem hilária. Convocou alguns artistas meio esquecidos pela mídia para invadir a Ilha de Caras, o paraíso das celebridades. A Ilha estava fechada, diga-se de passagem. Olha só quem foi: a cantora Perla, a modelo e cantora Regininha Poltergeist (bombshell dos anos 90), Lacraia e MC Serginho (da Eguinha Pocotó). O cantor Biafra (aquele da música "Voar, voar, subir, subir...") foi convidado, mas não pôde ir.

Para sair do lugar-comum dos bufês servidos por chefs estrelados, o banquete servido aos invasores teve biscoito de polvilho, bolo Ana Maria e espigas de milho. Guaraná Caçulinha e vinho Sangue de Boi, em copos de plástico, mataram a sede. E, para aliviar o frio, uma garrafinha de bolso cheia de cachaça que a reportagem da revista dividiu com Perla e Lacraia.

E não foi só isso. Os invasores ainda ganharam o tradicional kit-jabá que a Caras oferece aos seus convidados. Desta vez providenciado pela Trip, veio embrulhado em papel celofane e tinha raquetes plásticas, touca de banho, pistola de água, elásticos de cabelo, conjuntos de maquiagem infantil.

Confira a reportagem com fotos aqui.

9.12.04

Travestismo na polícia
Em cartaz há algumas semanas, a comédia As Branquelas (White Chicks, EUA, 2004) traz os atores e irmãos Shawn Wayans e Marlon Wayans nos papéis de Kevin e Marcus Copeland, dois atrapalhados agentes negros do FBI. Para investigar uma denúncia de sequestro, eles se disfarçam de mulheres louras. O filme é dirigido por Keenan Ivory Wayans ( de Todo Mundo em Pânico), também irmão dos atores.

Ao mostrar policiais negros transformados em louras, o argumento e o trailer dão impressão de comédia abobalhada. A surpresa é constatar uma história bem contada e engraçada, que não descamba para a baixaria e com várias referências ao mundo do cinema, música eletrônica, hip hop e moda.

Mais do que comédia, é uma aventura cômica com notas de romance, em duas horas de projeção, algo pouco comum no estilo besteirol. É sinal de que o filme tem assunto a abordar. Os irmãos Wayan têm ótima atuação, com garantia de proporcionar muitas risadas ao público.

7.12.04

Preparo físico para a gastronomia

A maratona de festividades promete. Neste final de ano, acabei ganhando a incumbência de dar sugestões e ajudar nos eventos lá de onde trabalho. Resultado: consegui convencer o povo a ir jantar em churrascaria-gourmet, além de descobrir que havia verba suficiente para o Chester da confraternização da equipe. Ainda vai ter festa de grande porte, com direito a show de música baiana e tudo mais. Isso só no plano corporativo.

Há almoços agendados com os amigos e a previsão é de festança de Natal no interior, organizada por familiares que quase competem para ver quem cozinha melhor. A preparação é tão caprichada que alguns ingredientes são levados daqui de Salvador. Eu aguentarei? Além disso, ainda há datas especiais e aniversários em dezembro.

Já estou em preparação física para as compensar as atividades estomacais extras. O dia em que houver evento, compenso bebendo chá de jiló (argh!) na outra refeição. Será o único jeito da barriga não retornar ào patamar em que já esteve.

Como se tudo não bastasse, ainda tenho a doce incumbência de pensar em um cardápio para aproveitar as ervas finas secas, o curry e as sementes de endro e de cominho que a minha amiga V. gentilmente trouxe de São Paulo para mim. Acho que só vou poder pensar nisso em janeiro. Se bem que, ao assistir no cinema o novo episódio de Bridget Jones - uma bomba por sinal, que transformou a jornalista inglesa quase em debilóide -, registrei que ela fala em um "peru com curry" na festa de Natal. Hmmm.

Com exceção da "apple pie", a famosa torta de maçã, alguns dos melhores pratos da cozinha inglesa são de origem indiana. Fiquei curioso e com vontade de experimentar o prato que leva curry. Quem sabe ainda em dezembro?
A Festa dos Sentidos superou os 10.000 acessos. Valeu, você!

4.12.04



Há algo de podre no reino mágico das celebridades
Olha a Luma novamente. Quando todo mundo pensava que a passista de escola de samba e expert em escândalos já havia se superado, lá vem ela de novo em seu requebrado. Volta às capas de revistas por causa da revelação do segredo do seu caso de amor. Que bombeiro, que nada. O espertão era outro dos modelos do calendário que ela patrocinava. Um policial chamado de Sigmar, que parece nome de cigarro.

A revista Caras mandou um fotógrafo aos confins de Itacaré para flagar a doce e arrojada Luma no dolce far niente com seu amor em um hotel de luxo. O casal percebeu e, ,junto com a direção do hotel, resolveu tirar satisfações com o pobre do enxerido paparazzo. Câmeras e arquivos digitais confiscados, ameaças e muita porrada depois, o fotógrafo volta à redação e escancara o ocorrido. Segundo a Caras, no interrogatório sofrido pelo fotógrafo, perguntaram se ele era contratado pelo ex-marido de Luma.

Será que a passista e o policial (parece até nome de filme da Boca do Lixo), além dos seus assessores, não imaginavam a propagação que a agressão iria tomar? Será que os fotógrafos só servem para quando as celebridades querem mostrar as suas novas casas e vestidos?

Qual a diferença de estar na capa de revistas como a Caras ou a Quem, seja por motivo de casamento badalado na igreja ou por um novo caso de amor, revelado por vias torpes?

Na coluna da Danuza Leão desta semana, ela desce o malho em Ronaldinho e Daniela Cicarelli. O casal apareceu na TV fazendo uma doação de 150 mil reais a uma entidade filantrópica. A jornalista acredita que a doação é ínfima perante o poder de fogo (financeiro) do jogador. Ela diz que tem gente ajuda com muito mais grana e não faz a mínima questão de aparecer.

O casal Fiona e Shrek parece ter mais uma parceria comercial do que qualquer outra coisa voltada à afeição mútua. Tudo é divulgado. Cada passo dado. Cada adiamento do casório. Cada charmosa e elegante liberação de gases dela. Se o monstro dublado por Bussunda fosse ator ou apresentador de TV, ainda caberia tanta exposição, já que a sua profissão, de certa forma, estaria próxima a isso. Mas o cara é jogador de futebol. E, como se não bastasse, milionário.

A vaidade de aparecer nas revistas parece que não os deixa antever a sede que a população tem de presenciar, mais do que casas, roupas ou festinhas, os escândalos que poderão vir - e que as revistas bem sabem mostrar, em forma de doce vingança contra os exibidos. Mas - loucura, loucura, loucura, como diria uma outra celebridade -, tem gente que insiste em repetir o velho clichê "falem mal, mas falem de mim". Não parece masoquismo?

3.12.04

Cordeiros de Glauber

Os dicionários não registram a palavra cordeiro na acepção utilizada popularmente na Bahia. Os cordeiros são a mão-de-obra contratada pelos blocos de Carnaval para segurar a corda que isola o povão dos foliões pagantes e das estrelas da música baiana.

A peça Esse Glauber, em cartaz no Theatro XVIII, tem texto de Aninha Franco, direção de Márcio Meireles e atuação de Rita Assemany e Diogo Lopes Filho. A peça retrata o trabalho dos cordeiros, que formam a parede humana que separa pobres de ricos, bonitos dos feios, instruídos dos ignorantes. Um tema atual e pouco abordado pelos meios de comunicação. Uma realidade local e muito própria, mas que, pelo alcance que o Carnaval tem, talvez seja possível de levar a qualquer lugar do país.

Os dois cordeiros Qualquer Um e Todo Mundo, enquanto aguardam a chegada daquele que virá fazer o pagamento, conversam sobre a vida e o trabalho. A personagem de Rita Assemany insurge-se contra a exploração daquela atividade e - pior dos piores - a possível falta de pagamento após dias e dias de labuta. Ela tenta despertar em seu colega de corda a consciência para os seus direitos. No que parece não ter muito sucesso, já que a propalada alegria do Carnaval, somada à ignorância, parece dissolver qualquer tipo de angústia causada por questionamentos econômicos e sociais. Enquanto isso, o seu colega tenta assediá-la.

O Carnaval no qual os cordeiros trabalham tem o tema "Deus e o Diabo na Terra do Sol", o que foi utilizado para fazer um gancho para o assunto Glauber Rocha. "Quem é esse Glauber?", perguntam-se os cordeiros, deixando clara a ignorância sobre um personagem do contexto histórico-cultural em que estão inseridos - e tema da festa da qual efetivamente fazem parte.

Um espetáculo tocante, fundo e pungente, mas suavizado pelo tom alternadamente cômico dos personagens. Uma conquista do texto, da direção e das atuações. Se não fosse pelas risadas despertadas, o assunto daria um tom tristíssimo ao espetáculo, conduzido pelas inquietações da personagem sob a emocionante atuação de Rita Assemany. O personagem de Diogo Lopes Filho faz o contraponto. É o marmanjo que só quer curtição, que "não tá nem aí". O ator tem ótima atuação, incluindo os trejeitos, modos de fala e expressões faciais do povo de Salvador, sem cair na caricatura.

A peça tem vários números musicais, interpretados pelos atores, acompanhados de músicos no palco. As letras são interessantíssimas. Escrachadas do primeiro ao último verso, são provenientes da verve de Aninha Franco. Se a presença dos músicos é destacada pelo som ao vivo e pela caracterização de uma banda de bloco de Carnaval, a proximidade com o público causa certo estranhamento. O palco do XVIII é pequeno, os percussionistas ocupam muito espaço e não parecem estar à vontade.

Exploração - Esse Glauber toca em um ponto doloroso do mercado de trabalho baiano. Pessoas são contratadas por diárias míseras, ficam sujeitas à violência, maus tratos, até fome e sede, uma vez que o lanche fornecido não é considerado suficiente. E ainda precisam investir os seus calçados - será que as solas chegarão inteiras aos últimos dias de Carnaval?

Até bem pouco tempo, os cordeiros ainda estavam expostos, sem nenhuma proteção, ao som ensurdecedor dos trios elétricos. Agora, pelo menos, eles possuem protetores auriculares. A discussão é levantada em um momento em que associações de cordeiros são formadas. Será essa a solução? A peça não toca nesse ponto, preferiu dar ênfase aos temas da pobreza, da falta de educação e da relação homem-mulher nas classes mais baixas. Os cordeiros são o resultado da baixa escolaridade, de falta de perspectiva profissional e da ganância dos donos dos blocos. Sai mais barato contratá-los do que a empresas de segurança, por exemplo. O trabalho de pesquisa do roteiro foi feito a partir de material em vídeo da jornalista Amaranta Cesar.

Mas não pense que tudo é dificuldade e desprazer. Os cordeiros tem a compensação de participar da festa, próximos dos cantores e bandas, além de ganhar algumas sobras de bebidas dos foliões. De algum modo, eles se sentem incluídos alí, naquele microcosmo social temporário. O grande sonho é chegar até o bufê dos camarotes. Mas isso não é privilégio deles, é algo compartilhado por boa parte da classe média.

Esse Glauber consegue conectar o tema dos cordeiros com a figura de Glauber Rocha, concebendo um gancho interessante para abordar um tema tão presente na atualidade baiana: os limites que separam as diferenças econômicas e sociais. Sendo assim, a corda dos blocos de Carnaval, que separa o povão da elite, é talvez um dos mais representativos símbolos.

1.12.04

Terror em família
Após quarenta anos de abandono, uma casa no interior da Espanha volta a ser ocupada, desta vez por uma família americana. Acontecimentos estranhos começam a ocorrer. A luz elétrica some sem explicação. O filho mais novo corre perigo. Dirigido pelo espanhol Jaume Balagueró e contando com um bom elenco, A Sétima Vítima (Darkness, EUA, Espanha, 2002) é suspense do início ao fim.

Mark (Ian Glen), o pai, após temporada na América, onde se casou, retorna para o país de origem e volta a sofrer de uma estranha doença, que o deixa fora da realidade. Maria (Lena Olin), a mãe, é enfermeira, mas não consegue reagir aos acontecimentos. A filha adolescente Regina (Anna Paquin) e o namorado Carlos (Fele Martínez, de A Má Educação) vão tentar resolver o mistério.

O filme traz uma série de clichês de filmes de terror e engasga em alguns pontos do roteiro, mas tem a vantagem de quase não utilizar cenas de sangue e violência e evitar o abuso de efeitos especiais, que normalmente deixam o aspecto artifical. O que vale aqui é a tensão sufocante que permeia a narrativa, lenta e angustiante. A Sétima Vítima ainda tem a vantagem de fugir dos finais óbvios dos filmes de terror.