Em homenagem aos santos gêmeos Cosme e Damião - e ao meu estômago-, resolvi fazer vatapá e caruru, aproveitando alguns quiabos que ganhei de presente. Mesmo quem mora em cidade grande, às vezes, se o santo ajuda, abocanha alguma lembrancinha que vem da zona rural.
Vatapá, eu já tinha feito uma vez. Caruru, nunca. Fui seguindo as instruções do fabuloso "Meu Caderno de Receitas para Todos dos Dias", de Maria Célia Midlej, a fada madrinha da cozinha do Sul da Bahia. Antes de ser dona de buffet, ela dava aula de culinária. Por isso, o livro é simples e bem didático.Para começar, toca a cortar os quiabos. Que dureza. Primeiro é preciso selecionar os que estão macios e serão utilizados. Para isso, pressiona-se a ponta inferior, mais fina. Se partir o pedaço inteiro, está bom. Se não partir, e em vez disso abrir, é porque o quiabo está duro e fibroso, não serve para cozinhar. Entre os quiabos que havia ganho, nem todos estavam macios, tive que descartar alguns.
Lavei os quiabos e cortei fora as cabeças. Cortei em cruz e fui picando tudo. A epopéia começou aí. Tem que cortar bem pequeno. Meia hora depois, quiabos picotados, pus em um pouco de água com sal e levei a ferver. Enquanto isso, moí os camarões secos e defumados no liquidificador, separando alguns inteiros para colocar na panela. Peneirei e joguei fora o que não passou pela peneira. Para os gatos (em meu caso) ou para o cachorro. A mesma coisa com os amendoins e as castanhas.
Nas receitas dos vatapá e caruru, a única coisa fácil de fazer é quanto aos temperos. Basta jogar cebolas, alhos, tomates e temperos verdes no liquidificador e bater tudo.
Primeira vez no preparo, achei de colocar muita água e sal nos quiabos. Tive que esperar um tempão para a água evaporar. Aí joguei os temperos batidos no liquidificador e previamente refogados em um pouco de óleo. Adicionei camarão, amendoins e castanhas. Deixei cozinhar. Quase pronto, joguei o dendê, deixei a ferver só mais um pouco. Fim da primeira etapa.Fiz o vatapá com farinha de trigo. Também pode ser usada farinha de mandioca ou pão francês (de sal) embebido (parece bêbado, mas não é!) no leite. Pus a farinha no liquidificador junto com leite de coco e um pouco de leite de vaca, para misturar sem embolar.
Joguei a massa na panela com os temperos e fui mexendo, mexendo, mexendo (a colher de pau, não as cadeiras!), adicionando mais leite para não ficar grosso. No final do cozimento, o toque de cor e sabor: o dendê.
Entre uma coisa e outra, ainda coloquei alguns pedaços de bacalhau para aferventar e tirar o sal. Retirei peles e espinhas, desfiei. O objetivo era misturar no vatapá, mas, atendendo a pedidos, deixei separado. Coloquei um pouco do tempero (o mesmo do vatapá, que serviu para tudo), azeite de oliva e salsa picada. Depois de tudo pronto, ainda preparei o arroz branco.
A brincadeirinha durou mais de duas horas e meia. Ainda acham que comida baiana é simples. Muito pelo contrário. É trabalhosa, refinada e os ingredientes não são baratos - são todos especiais para a ocasião. Não é aquela comida que se faz com "o que tem na geladeira". Mas o resultado compensa.
Se for bem feita, a comida de dendê não é pesada. O problema é que os pratos quase sempre são sobrecarregados de azeite e leite de coco. Procuro usar o mínimo possível. Comida, para estar saborosa, não precisa de muita gordura. Aliás, comida gordurosa está sempre mal-feita, pode reparar. O que dá sabor é o tempero.


Escolhas
Na época da ditadura de Mao Tse-Tung, na China dos anos 70, dois jovens burgueses são enviados para uma aldeia nas montanhas para "reeducação", ou seja, para verificar como é dura a vida no campo. Lá os dois amigos conhecem uma moça, a costureirinha, que vai balançar os seus corações. Balzac e a Costureirinha Chinesa (França, China, 2002) é dirigido por Daí Sijie (foto), chinês radicado na França, também autor do romance de mesmo título, sucesso de vendas, que gerou o filme.
O filme é delicado, uma bela narrrativa, de ritmo envolvente, que aborda um período histórico só possível de ser mostrado agora, no atual momento de abertura econômica e cultural chinesa.
Conta, vai
Vamos repartir o bolo
A lenda dos Cavaleiros da Távola Redonda já teve várias versões para o cinema e TV. Em Rei Arthur (King Arthur, EUA, 2004), que entra em cartaz a partir de sexta-feira, o foco é menos na fábula e mais na tentativa de arrumação das circunstâncias no período histórico.
O Martim Gonçalves é um teatro em construção: sem poltronas, sem ar-condicionado, sem isolamento acústico, iluminação precária. Não tem nem porta. Aparece até um morcego ou outro voando. O local faz lembrar aquela música: "Era uma casa muito engraçada, não tinha teto não tinha nada".
Na época do lançamento da primeira montagem, Otto Lara Resende, jornalista e escritor mineiro, que fazia parte das relações de Nelson Rodrigues, ficou indignado com o título. Mais irritado ainda por imaginar que o público poderia achar que a "bonitinha mas ordinária" poderia ser ele. Recusou-se então a assistir à peça. Nelson era mesmo um mestre no teatro e na pirraça. No texto, a expressão "O mineiro só é solidário no câncer" guia os personagens e é repetida à exaustão.
Havia quase quatro anos que Virgínia Rodrigues não se apresentava na Bahia. A cantora baiana promove a carreira musical fora do país. O último disco, Mares Profundos, foi gravado na Alemanha. O show ocorrido no Pelourinho, hoje, foi presenciado por uma platéia educada que demonstrava boa aproximação com o trabalho da mezzosoprano.
É nas festas populares que a criatividade fica em alta. Cabelos descoloridos, lentes de contato de todas as cores, roupas customizadas. Vários brincos para mulheres e homens. Sobrancelhas delineadas também para homens. Colares e anéis sempre presentes. Roupas de cores ácidas e motivos tribais. Cabelos quase raspados com desenhos. Òculos escuros de camelôs. Cabelos com gel para umedecer.
Eram livros que continham alguma dose de rebeldia na adolescência ou na vida jovem. As pessoas sempre gostam de se ver espelhadas na literatura. Aliás, até hoje, quem não tem a impressão de que ainda não leu aquele livro fantástico que contenha as suas idéias? Eu precisava ter eco para as minhas inquietações. Precisava entender o despertar do sexo e a minha nova posição no mundo.



No final do século XIX, os habitantes de um vilarejo norte-americano vivem pacatamente distantes da cidade. A paz é ameaçada pelo terror que vem do bosque vizinho, onde vivem criaturas misteriosas, chamadas pelos moradores de "Aquelas de Quem Não Falamos".