25.6.04



Saudade, palavra intraduzível

Ele tinha a serenidade de uma alma bem vivida. Tinha a sabedoria do tempo. Respeitava as ações irrefreáveis da juventude. Sabia que tudo estava contido em um instante ínfimo. Ele tinha pouca instrução. Trabalhou no campo, na estrada, na cidade grande. Foi retirante na metrópole. Sofreu as dores do desemprego. Voltou para o campo verde e úmido para encontrar a sua felicidade, contida na paz da família.

Pai, avô e criança em um corpo que o tempo levou a agilidade. De pouca formação escolar, sabia citar trechos de Raquel de Queiroz. Resquício de uma época em que os livros falavam forte, só comparados à vozes do rádio. Em uma era de poucas imagens, era um atento colecionador de fatos da história, que a televisão lhe trouxe aos poucos.

Participou de duas guerras, de conflitos, revoluções. Observou tudo atentamente. Teve malária e doenças do campo e dos homens. Sobreviveu às ideologias políticas. O seu maior desafio era a educação e o bem-estar familiar.

Criou pássaros, gatos, cágados e papagaios. Tratava-os com as mãos estendidas, como quem oferta o amor, como um santo despojado de seus bens materiais. Homem com a sapiência que não está nos livros, aquela que só a bondade traz. Viveu até os 90 anos, ao lado daqueles que as misteriosas leis do universo fizeram questão de aproximá-lo.

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