Que rocha?
Agora só se fala nesse tal de Arrocha. Dizem que é um ritmo que veio da seresta. Por seresta, na Bahia, entende-se música para dançar, tocada ao vivo, com o auxílio luxuoso (!) de órgão com bateria eletrônica. Nada que lembre a seresta de antigamente, em que músicos iam a lugares tocando para conquistar as moças.
Lembro que o meu pai contava que participava de serestas, indo cantar, em noite de lua, na janela da minha mãe, na época em que eram namorados. E eram cantados boleros, do cantor ou cantora que estivesse em evidência na época. Estrelas como Orlando Silva e Silvio Caldas davam o tom das músicas. "A deusa da minha rua, tem os olhos onde a lua..." ou "Receba as flores que lhe dou. Em cada flor um beijo meu".
O Arrocha seria a versão apimentada da dança de casais, nas serestas com o famigerado órgão eletrônico. É aquela música beeeem brega, abolerada, que toca naqueles lugares que as pessoas vão a qualquer momento ou quando já não há mais programação noturna disponível na cidade, no interior ou na capital. Ou seja, postos de gasolina, bares com música ao vivo e dança, puteiros, etc. Nada que lembre o romantismo do passado. Dá para imaginar um pobre-coitado, hoje em dia, cantando músicas românticas na janela para a sua namorada?
Ele seria trucidado pelas amiguinhas venenosas e invejosas da namorada. Talvez até por ela própria, que provavelmente ficaria incomodada de ser tão bem tratada...
Crônicas e comentários de Danilo Menezes. Jornalista brasileiro da Bahia, atualmente morando em Toronto, Ontario, Canada.
31.5.04
Digitação
Sistema off-line no trabalho. Faço os textos em arquivos .txt para depois postá-los. Às vezes penso que um palm top poderia me ajudar. Eu poderia digitar em qualquer hora ou lugar e bastaria só chegar em casa e descarregar o arquivo. Outras vez, penso que não ajudaria em muita coisa, pois estou sempre na frente de um micro, no trabalho ou em casa. Preciso juntar grana para trocar de carro daqui a um tempo.
Sistema off-line no trabalho. Faço os textos em arquivos .txt para depois postá-los. Às vezes penso que um palm top poderia me ajudar. Eu poderia digitar em qualquer hora ou lugar e bastaria só chegar em casa e descarregar o arquivo. Outras vez, penso que não ajudaria em muita coisa, pois estou sempre na frente de um micro, no trabalho ou em casa. Preciso juntar grana para trocar de carro daqui a um tempo.
30.5.04
Domingo, dia de almoço no shopping, de Bicicletas de Belleville e de crepe na Barra.
O filme, em cartaz no Cinema do Museu, é uma animação falada em francês. Achei ótimo o tom irônico. Os personagens tem narizes enooormes. Os franceses, em sua grande maioria, são mostrados como gordos imensos e vivem comendo rãs e girinos secos. Uma das velhinhas, do grupo de três irmãs ex-cantoras de cabaré, chega ao cúmulo de jogar bomba no rio para pescar as rãs. Elas consomem até picolé de rã.
O cachorro é gordo com as pernas finas, o ciclista é quase um esqueleto, com as pernas hipertrofiadas de exercícios. Os vilões, vestidos em seus ternos escuros e estruturados, têm forma retangular ou quadrada. São quase caixões ambulantes.
O maitre do restaurante faz contorcionismos para atender as mesas. Quando as coisas dão errado, simplesmente se ajoelha no chão pedindo perdão. Dá para imaginar como são os clientes dos restaurantes na França. Fiquei imaginando que nem de perto as crianças têm como perceber essas sutilezas. É um filme também para adulto se divertir. O cinema estava lotado.
O filme, em cartaz no Cinema do Museu, é uma animação falada em francês. Achei ótimo o tom irônico. Os personagens tem narizes enooormes. Os franceses, em sua grande maioria, são mostrados como gordos imensos e vivem comendo rãs e girinos secos. Uma das velhinhas, do grupo de três irmãs ex-cantoras de cabaré, chega ao cúmulo de jogar bomba no rio para pescar as rãs. Elas consomem até picolé de rã.
O cachorro é gordo com as pernas finas, o ciclista é quase um esqueleto, com as pernas hipertrofiadas de exercícios. Os vilões, vestidos em seus ternos escuros e estruturados, têm forma retangular ou quadrada. São quase caixões ambulantes.
O maitre do restaurante faz contorcionismos para atender as mesas. Quando as coisas dão errado, simplesmente se ajoelha no chão pedindo perdão. Dá para imaginar como são os clientes dos restaurantes na França. Fiquei imaginando que nem de perto as crianças têm como perceber essas sutilezas. É um filme também para adulto se divertir. O cinema estava lotado.
29.5.04
Trabalho voluntário
Plano de comunicação para uma ONG. Sem retorno financeiro, mas atividade muito interessante. Organizar toda a comunicação. Reunir experiências, consultar livros. É um trabalho que fica no meio termo entre a comunicação e a administração. Daqui para a frente, seremos todos assessores em vez de noticiadores?
O assessor fornece muita matéria-prima (sem trocadilho) para o jornalista. Às vezes até a matéria já elaborada. É um trabalho em que há duas trajetórias. Seria difícil para o jornal preencher todas as páginas somente com o trabalho dos seus repórteres. E os assessores conseguem a tão-sonhada divulgação.
Plano de comunicação para uma ONG. Sem retorno financeiro, mas atividade muito interessante. Organizar toda a comunicação. Reunir experiências, consultar livros. É um trabalho que fica no meio termo entre a comunicação e a administração. Daqui para a frente, seremos todos assessores em vez de noticiadores?
O assessor fornece muita matéria-prima (sem trocadilho) para o jornalista. Às vezes até a matéria já elaborada. É um trabalho em que há duas trajetórias. Seria difícil para o jornal preencher todas as páginas somente com o trabalho dos seus repórteres. E os assessores conseguem a tão-sonhada divulgação.
28.5.04
Livros e comida
Quando leio um livro, uma das coisas que mais me fascina é a culinária do local onde a história se passa. Adoro autores que fazem referências aos pratos e bebidas que os personagens consomem. Será que vem daí a minha atração pela gastronomia? No livro Small g, que estou lendo, a história transcorre na Suíça. A escritora Patrícia Higsmith volta e meia faz alguma referência à culinária da região: salsichas, saladas de batata, goulash, cervejas, vinhos, pães.
Quando eu era adolescente, li As Brumas de Avalon. Era o correspondente ao "Senhor dos Anéis" na época. Aliás, não sei por que não foi filmado até hoje. Lembro que no livro os personagens consumiam basicamente queijo, carne assada ou cozida, vinho e pão. Eu ficava intrigado como as pessoas poderiam consumir tanto queijo. O tempo foi passando e fui aprendendo que os queijos são mais do que simples fatias para colocar no pão. São verdadeiras refeições, ainda que os franceses prefiram consumí-los após terminar os pratos principais. Nos dias em que passei na França, fiz questão de passar em queijarias, experimentar alguns tipos e trazer para o hotel, para devorá-los acompanhados de uma saborosa baguette.
Na literatura brasileira, um autor genial na inclusão dos pratos típicos nos enredos é Jorge Amado. Não dá para esquecer que Dona Flor era exímia cozinheira, além de professora de culinária, dona da escola "Sabor e Arte". A riqueza de informações é tão extensa, que a filha de Jorge, Paloma, tem dois livros publicados só com receitas de pratos citados nos livros do pai. Um interessante é o "Doce de Puta", que aparece, se não me engano, em Tieta do Agreste. É aquele feito com banana cortada em rodinhas. O nome, segundo Jorge Amado, é porque era encontrado em toda casa de rapariga que se prezasse. Salve, Jorge.
Quando leio um livro, uma das coisas que mais me fascina é a culinária do local onde a história se passa. Adoro autores que fazem referências aos pratos e bebidas que os personagens consomem. Será que vem daí a minha atração pela gastronomia? No livro Small g, que estou lendo, a história transcorre na Suíça. A escritora Patrícia Higsmith volta e meia faz alguma referência à culinária da região: salsichas, saladas de batata, goulash, cervejas, vinhos, pães.
Quando eu era adolescente, li As Brumas de Avalon. Era o correspondente ao "Senhor dos Anéis" na época. Aliás, não sei por que não foi filmado até hoje. Lembro que no livro os personagens consumiam basicamente queijo, carne assada ou cozida, vinho e pão. Eu ficava intrigado como as pessoas poderiam consumir tanto queijo. O tempo foi passando e fui aprendendo que os queijos são mais do que simples fatias para colocar no pão. São verdadeiras refeições, ainda que os franceses prefiram consumí-los após terminar os pratos principais. Nos dias em que passei na França, fiz questão de passar em queijarias, experimentar alguns tipos e trazer para o hotel, para devorá-los acompanhados de uma saborosa baguette.
Na literatura brasileira, um autor genial na inclusão dos pratos típicos nos enredos é Jorge Amado. Não dá para esquecer que Dona Flor era exímia cozinheira, além de professora de culinária, dona da escola "Sabor e Arte". A riqueza de informações é tão extensa, que a filha de Jorge, Paloma, tem dois livros publicados só com receitas de pratos citados nos livros do pai. Um interessante é o "Doce de Puta", que aparece, se não me engano, em Tieta do Agreste. É aquele feito com banana cortada em rodinhas. O nome, segundo Jorge Amado, é porque era encontrado em toda casa de rapariga que se prezasse. Salve, Jorge.
Escolhas
Um amigo está em crise profissional. Mal entrou em um daqueles empregos públicos e já está insatisfeito. O cara é talentoso, um profissional da arte, formação superior. Mas, como grande parte dos artistas, vivia o velho dilema: cadê o dinheiro no início do mês?
Então ele estudou, fez concurso, passou e está trabalhando. O salário é pequeno, suficiente para não sobrar nada no fim do mês. O serviço não tem nada muito interessante. E, pior de tudo, o trabalho artístico foi deixado de lado. Ele pensa em voltar.
As aspirações de ter veículo, apartamento e independência financeira fazem parte do imaginário de todos os profissionais. Assalariados, liberais ou que tem na arte o seu ganha-pão. E, no Brasil, esse mínimo que se deseja, é cada vez mais difícil.
Pode-se até ter um emprego, achando que está salvo das tempestades. Mas não está. As empresas vivem dando reviravoltas. As pressões vêm de todos os lados. O dinheiro é curto. Nunca é fácil, tanto para quem é autônomo, quanto para quem tem um salário.
Em qualquer escolha que fazemos, ganhamos algumas coisas e perdemos outras. Aí reside um dos nossos grandes desafios - e uma grande conquista. Feita a melhor escolha, de acordo com o coração, fecha-se os olhos para o que se perdeu. Torço para que o rapaz volte para a arte.
Um amigo está em crise profissional. Mal entrou em um daqueles empregos públicos e já está insatisfeito. O cara é talentoso, um profissional da arte, formação superior. Mas, como grande parte dos artistas, vivia o velho dilema: cadê o dinheiro no início do mês?
Então ele estudou, fez concurso, passou e está trabalhando. O salário é pequeno, suficiente para não sobrar nada no fim do mês. O serviço não tem nada muito interessante. E, pior de tudo, o trabalho artístico foi deixado de lado. Ele pensa em voltar.
As aspirações de ter veículo, apartamento e independência financeira fazem parte do imaginário de todos os profissionais. Assalariados, liberais ou que tem na arte o seu ganha-pão. E, no Brasil, esse mínimo que se deseja, é cada vez mais difícil.
Pode-se até ter um emprego, achando que está salvo das tempestades. Mas não está. As empresas vivem dando reviravoltas. As pressões vêm de todos os lados. O dinheiro é curto. Nunca é fácil, tanto para quem é autônomo, quanto para quem tem um salário.
Em qualquer escolha que fazemos, ganhamos algumas coisas e perdemos outras. Aí reside um dos nossos grandes desafios - e uma grande conquista. Feita a melhor escolha, de acordo com o coração, fecha-se os olhos para o que se perdeu. Torço para que o rapaz volte para a arte.
27.5.04
Solidão em todo lugar
No mínimo inquietante. Dois homens encontram-se em um ambiente escuro, que tanto pode ser um campo sem iluminação, na zona rural, quanto a noite da cidade. Há uma negociação em curso. Os desejos são escondidos. Há um embate de forças entre o que se quer e o que se oferece: drogas, sexo ou qualquer outro produto ou emoção. É a peça Na Solidão dos Campos de Algodão, texto do francês Bernard-Marie Koltès, direção de Adelice Souza.
Em um cenário pouco iluminado, metálico e árido, Gideon Rosa e Narcival Rubens discutem sem entendimento. Um homem conservador (Rosa), em trajes sociais, e um ser urbanóide (Rubens) em trajes futuristas, usando um sobretudo sintético à la Matrix. O ser social e o anti-social. Opostos que se repulsam e se atraem.
O misterioso personagem de Narcival Rubens oferece alguma coisa. Gideon Rosa representa um burguês fragilizado. Aos poucos, a relação de dominação vai se invertendo e ficando mais clara. O homem de aspecto marginal vai revelando a sua fragilidade, enquanto o conservador mostra-se cada vez mais refratário a qualquer tipo de aproximação ou oferta.
É como se fosse a venda de drogas ou de sexo barato nas esquinas. O rapaz quer se entregar ou entregar algo, receber por isso e, ao mesmo tempo, manter o poder que a sua oferta o faz crer. O burguês vai sofrendo, talvez pela afluência do desejo que percebe pelo outro, mas demonstra-se incapaz de estender a mão à aproximação, ou mesmo a um pedido de socorro da outra parte. Solidão e incomunicabilidade ficam claras.
O espetáculo acontece no Teatro Moliere, da Aliança Francesa. O palco é isolado por placas de metal. A platéia e suas poltronas são descartadas, atores e público - que dispõe de pouco espaço - dividem o proscênio. Há certo desconforto, por conta do ambiente diminuto, do assentos sem encosto e dos sons inquietantes, compensados pela quase inserção dentro do espetáculo. É emocionante. Quando o espectador entra no teatro, depara-se com um recinto escuro com música eletrônica de fundo. Uma boate, uma estrada sem luz ou um ambiente futurista? Uma aventura, seja em um campo de algodão ou em uma esquina escura da cidade grande.
No mínimo inquietante. Dois homens encontram-se em um ambiente escuro, que tanto pode ser um campo sem iluminação, na zona rural, quanto a noite da cidade. Há uma negociação em curso. Os desejos são escondidos. Há um embate de forças entre o que se quer e o que se oferece: drogas, sexo ou qualquer outro produto ou emoção. É a peça Na Solidão dos Campos de Algodão, texto do francês Bernard-Marie Koltès, direção de Adelice Souza.
Em um cenário pouco iluminado, metálico e árido, Gideon Rosa e Narcival Rubens discutem sem entendimento. Um homem conservador (Rosa), em trajes sociais, e um ser urbanóide (Rubens) em trajes futuristas, usando um sobretudo sintético à la Matrix. O ser social e o anti-social. Opostos que se repulsam e se atraem.
O misterioso personagem de Narcival Rubens oferece alguma coisa. Gideon Rosa representa um burguês fragilizado. Aos poucos, a relação de dominação vai se invertendo e ficando mais clara. O homem de aspecto marginal vai revelando a sua fragilidade, enquanto o conservador mostra-se cada vez mais refratário a qualquer tipo de aproximação ou oferta.
É como se fosse a venda de drogas ou de sexo barato nas esquinas. O rapaz quer se entregar ou entregar algo, receber por isso e, ao mesmo tempo, manter o poder que a sua oferta o faz crer. O burguês vai sofrendo, talvez pela afluência do desejo que percebe pelo outro, mas demonstra-se incapaz de estender a mão à aproximação, ou mesmo a um pedido de socorro da outra parte. Solidão e incomunicabilidade ficam claras.
O espetáculo acontece no Teatro Moliere, da Aliança Francesa. O palco é isolado por placas de metal. A platéia e suas poltronas são descartadas, atores e público - que dispõe de pouco espaço - dividem o proscênio. Há certo desconforto, por conta do ambiente diminuto, do assentos sem encosto e dos sons inquietantes, compensados pela quase inserção dentro do espetáculo. É emocionante. Quando o espectador entra no teatro, depara-se com um recinto escuro com música eletrônica de fundo. Uma boate, uma estrada sem luz ou um ambiente futurista? Uma aventura, seja em um campo de algodão ou em uma esquina escura da cidade grande.
Mau tempo
A poluição atmosférica vai aumentando a temperatura ambiental a tal ponto que as calotas polares começam a derreter, esfriando as correntes marítimas quentes que mantêm as temperaturas amenas do hemisfério norte. Por causa da mudança climática, começam a ocorrer furacões, granizo, nevascas e frio glacial. Em O Dia Depois de Amanhã (The Day After Tomorrow, EUA, 2004), é esse o cenário pouco encorajador para o futuro terrestre.
Dirigido por Roland Emmerich, de Independence Day e Godzilla, o filme traz Dennis Quaid no papel de um cientista que alerta o governo para os efeitos maléficos da poluição. É uma crítica à posição política americana, resistente às normas do Tratado de Kyoto, que rege a redução das emissões de poluentes no mundo. A série de destruições faz o filme lembrar aqueles antigos exemplares do cinema-catástrofe, como Inferno na Torre e Terremoto.
Em busca de temperaturas suportáveis, os americanos vão se deslocando para o sul do país, até atravessar a fronteira com o México. A ironia é que o acesso só é permitido depois do perdão da dívida externa do Terceiro Mundo. Seria o ponto positivo da catástrofe.
A poluição atmosférica vai aumentando a temperatura ambiental a tal ponto que as calotas polares começam a derreter, esfriando as correntes marítimas quentes que mantêm as temperaturas amenas do hemisfério norte. Por causa da mudança climática, começam a ocorrer furacões, granizo, nevascas e frio glacial. Em O Dia Depois de Amanhã (The Day After Tomorrow, EUA, 2004), é esse o cenário pouco encorajador para o futuro terrestre.
Dirigido por Roland Emmerich, de Independence Day e Godzilla, o filme traz Dennis Quaid no papel de um cientista que alerta o governo para os efeitos maléficos da poluição. É uma crítica à posição política americana, resistente às normas do Tratado de Kyoto, que rege a redução das emissões de poluentes no mundo. A série de destruições faz o filme lembrar aqueles antigos exemplares do cinema-catástrofe, como Inferno na Torre e Terremoto.
Em busca de temperaturas suportáveis, os americanos vão se deslocando para o sul do país, até atravessar a fronteira com o México. A ironia é que o acesso só é permitido depois do perdão da dívida externa do Terceiro Mundo. Seria o ponto positivo da catástrofe.
26.5.04
Ô dia
Conserto de pia vazando, almoço voando, chateações no trabalho, porta de casa batida com a chave por dentro. Para compensar, fui na Brahma Kumaris meditar um tantinho. Foi a sorte. Agora já estou confortavelmente banhado (como se diz lá no oeste), perfumado e instalado em frente ao computador. Só não estou pelado. A rima até caberia.
Lendo Small g, de Patrícia Highsmith, autora de O Talentoso Ripley. Estou na página cem e o livro ainda não disse a que veio. Não é policial, é um romance. Talvez por isso a escritora não esteja em sua melhor forma. Comprei na última bienal por cinco conto, tem quase 400 páginas.
Comprei Amestrando Orgasmos, último de Ruy Castro. Estava em promoção na livraria da cidade em que tenho mais crédito: o hipermercado. Como assim? É que compro com tíquete-alimentação. :-) Comida para a alma.
La Highsmith
Conserto de pia vazando, almoço voando, chateações no trabalho, porta de casa batida com a chave por dentro. Para compensar, fui na Brahma Kumaris meditar um tantinho. Foi a sorte. Agora já estou confortavelmente banhado (como se diz lá no oeste), perfumado e instalado em frente ao computador. Só não estou pelado. A rima até caberia.
Lendo Small g, de Patrícia Highsmith, autora de O Talentoso Ripley. Estou na página cem e o livro ainda não disse a que veio. Não é policial, é um romance. Talvez por isso a escritora não esteja em sua melhor forma. Comprei na última bienal por cinco conto, tem quase 400 páginas.
Comprei Amestrando Orgasmos, último de Ruy Castro. Estava em promoção na livraria da cidade em que tenho mais crédito: o hipermercado. Como assim? É que compro com tíquete-alimentação. :-) Comida para a alma.
La Highsmith
25.5.04
Em forma 2004
Com inspiração nos programas de vendas da empresa, do tipo Vendas 2004, Extrapolação 2004, e coisas da espécie, a minha equipe de trabalho radicalizou: lançou o programa Redução de Peso 2004.
Comprar frutas para o lanche, reduzir o consumo de pães, diminuir o rango nos eventos de confraternização e coquetéis, foram algumas das sugestões para melhorar a forma física dos componentes da equipe, mas nada deu certo. Até que veio a idéia da redução coletiva.
O programa consta de alguns passos. Primeiro, pesa-se toda a equipe, de uma vez só, em uma balança daquelas de pesar caminhão ou gado. Não há identificação do peso individual, por conta do sigilo adiposo.
Com o peso total, estima-se, de comum acordo, uma meta de redução. Por exemplo, 5%. Daí é estabelecido um prazo para alcançar o número. Claro que, por conta das diferenças de porte, alguns perderão mais, outros perderão menos. Mas o que importa é o espírito de companheirismo para deixar a comilança de lado e alcançar a meta.
Os participantes da empreitada devem assinar um termo de adesao com previsão de multas em caso de abandono. Sempre com o sigilo adiposo mantido.
Com inspiração nos programas de vendas da empresa, do tipo Vendas 2004, Extrapolação 2004, e coisas da espécie, a minha equipe de trabalho radicalizou: lançou o programa Redução de Peso 2004.
Comprar frutas para o lanche, reduzir o consumo de pães, diminuir o rango nos eventos de confraternização e coquetéis, foram algumas das sugestões para melhorar a forma física dos componentes da equipe, mas nada deu certo. Até que veio a idéia da redução coletiva.
O programa consta de alguns passos. Primeiro, pesa-se toda a equipe, de uma vez só, em uma balança daquelas de pesar caminhão ou gado. Não há identificação do peso individual, por conta do sigilo adiposo.
Com o peso total, estima-se, de comum acordo, uma meta de redução. Por exemplo, 5%. Daí é estabelecido um prazo para alcançar o número. Claro que, por conta das diferenças de porte, alguns perderão mais, outros perderão menos. Mas o que importa é o espírito de companheirismo para deixar a comilança de lado e alcançar a meta.
Os participantes da empreitada devem assinar um termo de adesao com previsão de multas em caso de abandono. Sempre com o sigilo adiposo mantido.
24.5.04
Os doces baianos
Trabalhar em escritório é bem assim: come-se o dia inteiro, com poucos intervalos. Comer se torna uma certa válvula de escape para a mesmice que empurra os dias corporativos.
Hoje, alguém resolveu comprar uma torta de tapioca. Deliciosa. Pronto, foi o suficiente para atiçar o apetite de todos. Há uma peregrinação incansável à copa. A torta é imensa. Daquelas com cobertura de doce de leite. Guloseima bem comum na cozinha baiana, pode ser encontrada com facilidade nos tabuleiros da "baianas" que, em lugar de vender acarajé e abará, vendem tortas e doces.
No Porto da Barra, no domingo, sempre dá para encontrar alguma dessas baianas em trajes típicos. Há alguns anos, naquela região, existia a Ceia do Porto. Era uma reunião de baianas que vendiam comidas e doces. Cocadas, doce de tamarindo, amoda, bolo de tapioca, carimã e aipim. Entre os pratos salgados, torta de bacalhau, frigideira de repolho e camarão, caruru completo. Era mais que uma ceia, era um banquete.
Quando eu ainda era pré-adolescente, vim uma vez a Salvador. Fiquei com uns primos mais velhos, que já estudavam por aqui. Passamos no Porto para a ceia. Era início dos anos oitenta, ainda havia no ar um clima de contracultura. Meu primo acendeu um e ficou fumando na balaustrada. Quando estávamos indo embora, a irmã dele reclamou: "O carro vai ficar fedendo". Eu, pobre criança inocente, não entendi nada.
Trabalhar em escritório é bem assim: come-se o dia inteiro, com poucos intervalos. Comer se torna uma certa válvula de escape para a mesmice que empurra os dias corporativos.
Hoje, alguém resolveu comprar uma torta de tapioca. Deliciosa. Pronto, foi o suficiente para atiçar o apetite de todos. Há uma peregrinação incansável à copa. A torta é imensa. Daquelas com cobertura de doce de leite. Guloseima bem comum na cozinha baiana, pode ser encontrada com facilidade nos tabuleiros da "baianas" que, em lugar de vender acarajé e abará, vendem tortas e doces.
No Porto da Barra, no domingo, sempre dá para encontrar alguma dessas baianas em trajes típicos. Há alguns anos, naquela região, existia a Ceia do Porto. Era uma reunião de baianas que vendiam comidas e doces. Cocadas, doce de tamarindo, amoda, bolo de tapioca, carimã e aipim. Entre os pratos salgados, torta de bacalhau, frigideira de repolho e camarão, caruru completo. Era mais que uma ceia, era um banquete.
Quando eu ainda era pré-adolescente, vim uma vez a Salvador. Fiquei com uns primos mais velhos, que já estudavam por aqui. Passamos no Porto para a ceia. Era início dos anos oitenta, ainda havia no ar um clima de contracultura. Meu primo acendeu um e ficou fumando na balaustrada. Quando estávamos indo embora, a irmã dele reclamou: "O carro vai ficar fedendo". Eu, pobre criança inocente, não entendi nada.
23.5.04
Massa
Fui almoçar na Cantina Cortille, restaurante italiano na orla de Salvador. Aniversário da minha amiga E., comemorado com um grupo de amigos. Nada como ficar a tarde toda conversando, comendo e bebendo bem. Chegamos às 13 e saímos às 17 horas. Além dela, havia outras pessoas fazendo aniversário. Os garçons traziam tortas e viram fazendo barulho, batendo as bandejas e cantando parabéns.
Provei um prato básico. Massa com molho de quatro queijos. Estava excelente, não estava enjoativo, como frequentemente ocorre com este tipo de molho. Achei melhor que os demais pratos, que levavam molhos a la putanesca (tomates, azeitonas, alcaparras e anchovas) e napolitana, com berinjela. Tomamos um bom vinho, um Miolo Reserva. Sobremesa. Coca-cola. Expresso com chatilly. Hummm...
Quando eu preparo em casa o molho a la putanesca, não ponho anchovas. Fica mais suave. Também não uso os tomates pelati (sem pele) enlatados. Prefiro-os na forma natural, fica menos ácido. E uso bastante alho e azeite de oliva. Uma diliça!
Depois do almoço, algumas das moçoilas foram para casa de uma delas ver o capítulo gravado de ontem da novela. E conferir o beijo dos personagens de Malu Mader e Fábio Assunção. Dá pra crer?
Fui almoçar na Cantina Cortille, restaurante italiano na orla de Salvador. Aniversário da minha amiga E., comemorado com um grupo de amigos. Nada como ficar a tarde toda conversando, comendo e bebendo bem. Chegamos às 13 e saímos às 17 horas. Além dela, havia outras pessoas fazendo aniversário. Os garçons traziam tortas e viram fazendo barulho, batendo as bandejas e cantando parabéns.
Provei um prato básico. Massa com molho de quatro queijos. Estava excelente, não estava enjoativo, como frequentemente ocorre com este tipo de molho. Achei melhor que os demais pratos, que levavam molhos a la putanesca (tomates, azeitonas, alcaparras e anchovas) e napolitana, com berinjela. Tomamos um bom vinho, um Miolo Reserva. Sobremesa. Coca-cola. Expresso com chatilly. Hummm...
Quando eu preparo em casa o molho a la putanesca, não ponho anchovas. Fica mais suave. Também não uso os tomates pelati (sem pele) enlatados. Prefiro-os na forma natural, fica menos ácido. E uso bastante alho e azeite de oliva. Uma diliça!
Depois do almoço, algumas das moçoilas foram para casa de uma delas ver o capítulo gravado de ontem da novela. E conferir o beijo dos personagens de Malu Mader e Fábio Assunção. Dá pra crer?
22.5.04
Da cozinha
Soube que entre esses salsichões com chucrute ou salada de batatas, servidos pela cidade, a melhor marca é uma produzida aqui mesmo na região, lá pelas bandas da Estrada do Coco. Toda a comunidade alemã de Salvador consome esse produto.
Da última vez que fui no Bistrô PortoSol, além do salsichão, provei também o linguição. Muito bom, sabor defumado mais forte. A salada de batata, normalmente excepcional, não estava lá grande coisa. Parecia que as batatas haviam sido cozidas algumas horas antes, denúncia feita pelas manchas levemente arroxeadas e esbranquiçadas de alguns pedaços.
Na receita da salada, picles de pepino bem picado, típico alemão, e endro (dill). O restaurante lançou um nova entrada: uma pasta de berinjela picante, uma delícia. O local está ficando caro. Até a mostarda está sendo cobrada por fora.
Soube que entre esses salsichões com chucrute ou salada de batatas, servidos pela cidade, a melhor marca é uma produzida aqui mesmo na região, lá pelas bandas da Estrada do Coco. Toda a comunidade alemã de Salvador consome esse produto.
Da última vez que fui no Bistrô PortoSol, além do salsichão, provei também o linguição. Muito bom, sabor defumado mais forte. A salada de batata, normalmente excepcional, não estava lá grande coisa. Parecia que as batatas haviam sido cozidas algumas horas antes, denúncia feita pelas manchas levemente arroxeadas e esbranquiçadas de alguns pedaços.
Na receita da salada, picles de pepino bem picado, típico alemão, e endro (dill). O restaurante lançou um nova entrada: uma pasta de berinjela picante, uma delícia. O local está ficando caro. Até a mostarda está sendo cobrada por fora.
Seu Bonfim
Sábado de chuva, fui ver Seu Bonfim, encenado por Fábio Vidal no Theatro XIII, Pelourinho. Cabra bom esse Fábio. Ele também é autor do texto e co-diretor. Devido à boa temporada em 2003, o espetáculo voltou a cartaz.
Seu Bomfim é inspirado no conto A Terceira Margem do Rio, de Guimarães Rosa. Fábio Vidal está no papel de um personagem que é um misto de mendigo, louco, beberrão e sem uma das pernas. Maltrapilho, por vezes o personagem causa asco. Fábio Vidal tem boa dicção e expressão corporal muito bacana, ainda que haja algum excesso, especialmente nas cenas de bebedeira.
O texto mescla a história do homem que embarca em uma canoa e toma o destino misterioso do rio, relatada no conto, com a percepção de mundo e dos arredores pelos olhos do mendigo, instalado nas areias do rio.
O espectador baiano sempre acha graça das ironias teatrais que fazem troça com o modo de agir e falar dos seus conterrâneos. O texto não tem esse viés cômico. É o ator que dá o tom.
Sábado de chuva, fui ver Seu Bonfim, encenado por Fábio Vidal no Theatro XIII, Pelourinho. Cabra bom esse Fábio. Ele também é autor do texto e co-diretor. Devido à boa temporada em 2003, o espetáculo voltou a cartaz.
Seu Bomfim é inspirado no conto A Terceira Margem do Rio, de Guimarães Rosa. Fábio Vidal está no papel de um personagem que é um misto de mendigo, louco, beberrão e sem uma das pernas. Maltrapilho, por vezes o personagem causa asco. Fábio Vidal tem boa dicção e expressão corporal muito bacana, ainda que haja algum excesso, especialmente nas cenas de bebedeira.
O texto mescla a história do homem que embarca em uma canoa e toma o destino misterioso do rio, relatada no conto, com a percepção de mundo e dos arredores pelos olhos do mendigo, instalado nas areias do rio.
O espectador baiano sempre acha graça das ironias teatrais que fazem troça com o modo de agir e falar dos seus conterrâneos. O texto não tem esse viés cômico. É o ator que dá o tom.
21.5.04
Acordeon, sanfona ou concertina
Ele é advogado, costuma chefiar outros advogados. Natural do sertão do interior de Bahia. Terra de fluidos musicais e do forró de raiz, aquele que nos últimos tempos andam chamando de pé-de-serra. No papel de advogado, é sério, compenetrado, disciplinado e respeitado. Foi com esforço e dedicação que galgou a carreira do Direito.
Garoto de família simples, mas organizada, com sacrifício ele foi para a cidade grande estudar. Morou em "Casa do Estudante" e república. Penou, passou apertado. A sanfona sempre presente, desde a adolescência, sua diversão e seu relax. Ele se formou, fez concurso público e se dedica às leis.
Mas é nos finais de semana que emerge aquele que lhe dá equilíbrio. O músico que deixa fluir da sanfona o néctar dos deuses: o mais puro som do forró. A sandália de couro ocupa o lugar do sapato social, tradicionalmente usado no trabalho. O terno sai de cena, entra a calça simples e a camisa de manga curta.
O forrozeiro toma conta. Parece uma possesão. Sanfona em punho, zabumba e triângulo segurando bem, a animação vem a galope. É festa que dura a noite toda. Para manter a energia lá em cima, um gole ou outro de licor, cerveja ou pinga de boa qualidade.
A festa termina, é hora de dormir. Espírito sertanejo satisfeito, é hora de recompor as energias para encarar a semana de trabalho. Petições, laudos, inquéritos, processos, requisições, causas. Ambiente pedante e prepotente. O maior trabalho é lidar com os egos inflados dos doutores da lei.
Herdeiros dos escribas, únicos detentores do conhecimento impresso, que eram considerados os grandes sábios. Deles herdaram o palavreado rebuscado, quase indecifrável. Aos poucos, vão perdendo espaço na sociedade digital, à medida que o conhecimento se dissemina e a burocracia dos documentos diminui.
O advogado forrozeiro anda na trilha correta, pelo menos a que indica o seu coração. Imune às verborragias e aos palavreados difíceis, tem fé no ser humano e na celebração da alegria. É nos finais de semana que seu coração pulsa com mais vigor.
Ele é advogado, costuma chefiar outros advogados. Natural do sertão do interior de Bahia. Terra de fluidos musicais e do forró de raiz, aquele que nos últimos tempos andam chamando de pé-de-serra. No papel de advogado, é sério, compenetrado, disciplinado e respeitado. Foi com esforço e dedicação que galgou a carreira do Direito.
Garoto de família simples, mas organizada, com sacrifício ele foi para a cidade grande estudar. Morou em "Casa do Estudante" e república. Penou, passou apertado. A sanfona sempre presente, desde a adolescência, sua diversão e seu relax. Ele se formou, fez concurso público e se dedica às leis.
Mas é nos finais de semana que emerge aquele que lhe dá equilíbrio. O músico que deixa fluir da sanfona o néctar dos deuses: o mais puro som do forró. A sandália de couro ocupa o lugar do sapato social, tradicionalmente usado no trabalho. O terno sai de cena, entra a calça simples e a camisa de manga curta.
O forrozeiro toma conta. Parece uma possesão. Sanfona em punho, zabumba e triângulo segurando bem, a animação vem a galope. É festa que dura a noite toda. Para manter a energia lá em cima, um gole ou outro de licor, cerveja ou pinga de boa qualidade.
A festa termina, é hora de dormir. Espírito sertanejo satisfeito, é hora de recompor as energias para encarar a semana de trabalho. Petições, laudos, inquéritos, processos, requisições, causas. Ambiente pedante e prepotente. O maior trabalho é lidar com os egos inflados dos doutores da lei.
Herdeiros dos escribas, únicos detentores do conhecimento impresso, que eram considerados os grandes sábios. Deles herdaram o palavreado rebuscado, quase indecifrável. Aos poucos, vão perdendo espaço na sociedade digital, à medida que o conhecimento se dissemina e a burocracia dos documentos diminui.
O advogado forrozeiro anda na trilha correta, pelo menos a que indica o seu coração. Imune às verborragias e aos palavreados difíceis, tem fé no ser humano e na celebração da alegria. É nos finais de semana que seu coração pulsa com mais vigor.
Blogs
Eta! O povo já tá de olho.
O crescimento no número de blogs e de pessoas que os lêem está atraindo atenção das empresas como forma de comunicação direta com seus funcionários, parceiros e clientes.
"O que os blogs e as notificações significam é que se torna muito fácil se comunicar", disse Bill Gates, ontem, quinta-feira, aos executivos reunidos na sede da Microsoft para a conferência anual de presidentes-executivos que a empresa promove.
Eta! O povo já tá de olho.
O crescimento no número de blogs e de pessoas que os lêem está atraindo atenção das empresas como forma de comunicação direta com seus funcionários, parceiros e clientes.
"O que os blogs e as notificações significam é que se torna muito fácil se comunicar", disse Bill Gates, ontem, quinta-feira, aos executivos reunidos na sede da Microsoft para a conferência anual de presidentes-executivos que a empresa promove.
20.5.04
Leitura
Os livros são uma praga. Eles vão se acumulando e acumulando pó. Vão exigindo, cada vez mais, espaço em nossas vidas e em nossas diminutas casas e apartamentos.
Compra-se livros, gasta-se dinheiro, enche-se as prateleiras. Exibem-se os livros como troféus do intelecto. Há sábios que dizem que os livros não produzem inteligência. Produzem bagagem intelectual, pois a inteligência estaria relacionada com a criatividade, não às leituras acumuladas.
Os livros trazem uma ponta de perplexidade. De pequenez frente à produção humana. Ninguém conseguirá ler todos os livros. Nem mesmo todos aqueles que gostaria de ter lido.
Sendo assim, o passeio por uma boa livraria é um gozo e um suave desespero. Satisfação de ver novas capas em belas edições. Uma pontinha de dor por não poder adquirir aqueles exemplares caros.
Mas, pensando bem, quanto de livros temos ao nosso alcance e não temos tempo - ou disposição - para ler? As estantes mostram exemplares comprados em sebos e feiras, a baixo custo, que ainda não foram lidos. Quanto existe na estante, que poderia ser relido, agora em outra etapa e com outra percepção da vida? Quantos estão lidos pela metade?
A mesma coisa acontece com CDs e - fenômeno mais recente - os DVDs, que vão se empilhando. Agora, mais ainda, com a facilidade de reprodução. E não dedicamos tempo a eles. A preocupação em comprar se torna mais importante do que fruí-los.
Com livros, vídeos e discos, as pessoas se apegam e não gostam de emprestá-los. Também não gostam de pedir emprestado, algo fácil em bibliotecas públicas. Preferem comprá-los e exibir na estante. Como desafios vencidos.
Outros livros estão, coitados, na prateleira com a esperança de que algum dia serão lidos. Na aposentadoria, se é que isso existe, ou na maturidade - um ponto imaginário do tempo, quando o dia conterá mais horas, a vista não estará cansada e as histórias escritas terão mais força na mente do que os filmes do cinema.
Compra-se livros, gasta-se dinheiro, enche-se as prateleiras. Exibem-se os livros como troféus do intelecto. Há sábios que dizem que os livros não produzem inteligência. Produzem bagagem intelectual, pois a inteligência estaria relacionada com a criatividade, não às leituras acumuladas.
Os livros trazem uma ponta de perplexidade. De pequenez frente à produção humana. Ninguém conseguirá ler todos os livros. Nem mesmo todos aqueles que gostaria de ter lido.
Sendo assim, o passeio por uma boa livraria é um gozo e um suave desespero. Satisfação de ver novas capas em belas edições. Uma pontinha de dor por não poder adquirir aqueles exemplares caros.
Mas, pensando bem, quanto de livros temos ao nosso alcance e não temos tempo - ou disposição - para ler? As estantes mostram exemplares comprados em sebos e feiras, a baixo custo, que ainda não foram lidos. Quanto existe na estante, que poderia ser relido, agora em outra etapa e com outra percepção da vida? Quantos estão lidos pela metade?
A mesma coisa acontece com CDs e - fenômeno mais recente - os DVDs, que vão se empilhando. Agora, mais ainda, com a facilidade de reprodução. E não dedicamos tempo a eles. A preocupação em comprar se torna mais importante do que fruí-los.
Com livros, vídeos e discos, as pessoas se apegam e não gostam de emprestá-los. Também não gostam de pedir emprestado, algo fácil em bibliotecas públicas. Preferem comprá-los e exibir na estante. Como desafios vencidos.
Outros livros estão, coitados, na prateleira com a esperança de que algum dia serão lidos. Na aposentadoria, se é que isso existe, ou na maturidade - um ponto imaginário do tempo, quando o dia conterá mais horas, a vista não estará cansada e as histórias escritas terão mais força na mente do que os filmes do cinema.
Da gastronomia Acaba de ser fundada a primeira universidade de comida. Na cidade que tem o sugestivo nome de Pollenzo, localizada no norte da Itália. É a Universidade de Ciências Gastronômicas.
Nham nham
Nham nham
Vendas a metros
O mundo da mídia e publicidade adora lançar novos rótulos. Um dos mais recentes, o tal dos "metrossexuais", tem simplesmente a finalidade de estimular o crescimento de um nicho de mercado ainda pouco explorado: a moda e a estética corporal masculina - leia-se maquiagem e cuidados com corpo e cabelos.
No Festival de Cannes, o estilista Jean Paul-Gaultier distribuiu aos atores uma nécessaire de maquiagem, que incluia "creme 'anti-cansaço', pó compacto (com pincel aplicador), delineador, corretivo e até batom para um 'sorriso irresistível'".
Os estilistas também encheram os jornalistas com releases que "descreviam detalhadamente quem vestiram e como fizeram, caso suas roupas viessem a aparecer em fotos".
Não tem nada de fenômeno de comportamento. É tudo para vender mais.
Fonte: Folha
O mundo da mídia e publicidade adora lançar novos rótulos. Um dos mais recentes, o tal dos "metrossexuais", tem simplesmente a finalidade de estimular o crescimento de um nicho de mercado ainda pouco explorado: a moda e a estética corporal masculina - leia-se maquiagem e cuidados com corpo e cabelos.
No Festival de Cannes, o estilista Jean Paul-Gaultier distribuiu aos atores uma nécessaire de maquiagem, que incluia "creme 'anti-cansaço', pó compacto (com pincel aplicador), delineador, corretivo e até batom para um 'sorriso irresistível'".
Os estilistas também encheram os jornalistas com releases que "descreviam detalhadamente quem vestiram e como fizeram, caso suas roupas viessem a aparecer em fotos".
Não tem nada de fenômeno de comportamento. É tudo para vender mais.
Fonte: Folha
19.5.04
O Santo
Parece até história de teatro ou cinema, mas é verdade.
Junho se aproximava e começavam as homenagens aos santos do mês. Informada e convencida de que a posse de uma imagem roubada de Santo Antônio é fundamental para conquistar ou garantir o amor, ela, sempre muito responsável, ousou. Afanou uma das imagens do santo, que estavam em uma exposição pública.
Discreta e destemida, depois de dois segundo de hesitação, escolheu a menor e passou a mão rápida, escondendo a estátua na bolsa larga de design moderno. Olhar rápido para os lados, não havia alma encarnada por perto, ninguém viu a movimentação.
De início, ela, mulher formada, administradora, trabalhadora independente, relutou em acreditar e aceitar a tradição popular. Foi persuadida com o argumento de que deveria, sim, roubar a imagem e ficar com ela durante um ano. E depois devolvê-la, para que outra - mais carente e necessitada - também pudesse realizar o pequeno furto, no ano seguinte. Para conquistar a felicidade - que vai passando de mão em mão.
O tempo passou, ela, ainda reticente com a tradição, mas de vida amorosa fluente, esqueceu a imagem no fundo do armário de roupas. Três anos depois, em uma conversa informal com três amigas, em um restaurante da moda, na cidade grande, ela lembrou do santo e contou a história. Foi quase trucidada.
"Como você faz isso? Que absurdo!", foi o coro. Mas a inquisição não foi pelo roubo. Foi pela não devolução da imagem. "Egoísta! Você está deixando outra pobre-coitada desamparada. Trate de devolver a imagem", exigiu a mais exaltada das amigas.
Meio envergonhada, ela se viu na impossibilidade de devolver o santo. O local, em que a imagem estava, foi modificado, não existe mais. A detentora do santo agora prepara três embalagens, três caixinhas enfeitadas. Em cada uma delas vai colocar um pequeno Santo Antônio. Para presentear as amigas e sossegar os ânimos exacerbados.
Parece até história de teatro ou cinema, mas é verdade.
Junho se aproximava e começavam as homenagens aos santos do mês. Informada e convencida de que a posse de uma imagem roubada de Santo Antônio é fundamental para conquistar ou garantir o amor, ela, sempre muito responsável, ousou. Afanou uma das imagens do santo, que estavam em uma exposição pública.
Discreta e destemida, depois de dois segundo de hesitação, escolheu a menor e passou a mão rápida, escondendo a estátua na bolsa larga de design moderno. Olhar rápido para os lados, não havia alma encarnada por perto, ninguém viu a movimentação.
De início, ela, mulher formada, administradora, trabalhadora independente, relutou em acreditar e aceitar a tradição popular. Foi persuadida com o argumento de que deveria, sim, roubar a imagem e ficar com ela durante um ano. E depois devolvê-la, para que outra - mais carente e necessitada - também pudesse realizar o pequeno furto, no ano seguinte. Para conquistar a felicidade - que vai passando de mão em mão.
O tempo passou, ela, ainda reticente com a tradição, mas de vida amorosa fluente, esqueceu a imagem no fundo do armário de roupas. Três anos depois, em uma conversa informal com três amigas, em um restaurante da moda, na cidade grande, ela lembrou do santo e contou a história. Foi quase trucidada.
"Como você faz isso? Que absurdo!", foi o coro. Mas a inquisição não foi pelo roubo. Foi pela não devolução da imagem. "Egoísta! Você está deixando outra pobre-coitada desamparada. Trate de devolver a imagem", exigiu a mais exaltada das amigas.
Meio envergonhada, ela se viu na impossibilidade de devolver o santo. O local, em que a imagem estava, foi modificado, não existe mais. A detentora do santo agora prepara três embalagens, três caixinhas enfeitadas. Em cada uma delas vai colocar um pequeno Santo Antônio. Para presentear as amigas e sossegar os ânimos exacerbados.
18.5.04
Memória deletada
Em Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças (EUA, 2004) Joel (Jim Carrey) e Clementine (Kate Winslet) formam um casal que não deu certo. Desiludida com o fracasso, Clementine decide esquecer Joel para sempre e, para tanto, aceita se submeter a um tratamento experimental, que retira de sua memória os momentos vividos com ele. Joel descobre e decide também se submeter ao tratamento. Porém ele acaba desistindo de tentar esquecê-la e começa a encaixar a ex-namorada na memória de situações nas quais ela não esteve presente, inclusive na infância.
O roteirista Charlie Kaufman (de Quero Ser John Malkovitch) fez um trabalho bem inteligente, construindo uma história reúne amor, humor, filosofia e ficção científica. Em boa parte da projeção, o roteiro alterna as cenas da memória e o trabalho do médico e técnicos. Passado e presente se misturam, o que exige bastante concentração do espectador para acompanhar o desenrolar dos acontecimentos.
Apesar de classificado como comédia romântica, o humor é esporádico em Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, título retirado de um poema. Situa-se basicamente nas cenas do trabalho bizarro dos técnicos no apagamento. No elenco estão Mark Ruffalo, Kirsten Dunt e Elijah Wood (de Senhor dos Anéis)
16.5.04
O Beijo no Asfalto
A direção primorosa O Beijo no Asfalto valeu a Paulo Cunha o prêmio Braskem 2004. Um trabalho empolgante a partir do texto de Nelson Rodrigues. É um primor a coordenação dos 15 atores em cena. Alguns são novos rostos no teatro baiano.
Os personagens principais são representados por mais de um ator. No papel de Arandir, aquele que beija o moribundo no asfalto, revezam-se três atores. É um luxo, que permite que as atuações sejam comparadas entre si. Apesar de muito interessante, a comparação acaba por deixar mais claras algumas debilidades dos atores.
A grandiosidade da direção já começa no cenário. No palco, somente um sofá no centro. Na altura da platéia, antes do proscênio, cinco máquinas de escrever. Em determinada parte, o diretor consegue intercalar duas sequências de diálogo - de forma independente e que se tangenciam ao mesmo tempo -, com os atores iluminados somente pelas luminárias que acompanham as máquinas de escrever. É genial.
A encenação de um texto de grande qualidade, com jovens atores, e um ótimo resultado, deixa uma boa impressão: uma certeza que o teatro baiano sempre terá continuidade. No elenco estão: Adson Silvério, Aurora Dias, Bruno Neves, Danilo Rebouças, Juliana Zacharias, Kleper Gomes, Luisa Proserpio, Rita Leone, Val Perré, Bernardo D'el Rey, Eva Kowalska, João Paranhos, Margareth Xavier, Neiva Cristtall e Sergio Maia.
A direção primorosa O Beijo no Asfalto valeu a Paulo Cunha o prêmio Braskem 2004. Um trabalho empolgante a partir do texto de Nelson Rodrigues. É um primor a coordenação dos 15 atores em cena. Alguns são novos rostos no teatro baiano.
Os personagens principais são representados por mais de um ator. No papel de Arandir, aquele que beija o moribundo no asfalto, revezam-se três atores. É um luxo, que permite que as atuações sejam comparadas entre si. Apesar de muito interessante, a comparação acaba por deixar mais claras algumas debilidades dos atores.
A grandiosidade da direção já começa no cenário. No palco, somente um sofá no centro. Na altura da platéia, antes do proscênio, cinco máquinas de escrever. Em determinada parte, o diretor consegue intercalar duas sequências de diálogo - de forma independente e que se tangenciam ao mesmo tempo -, com os atores iluminados somente pelas luminárias que acompanham as máquinas de escrever. É genial.
A encenação de um texto de grande qualidade, com jovens atores, e um ótimo resultado, deixa uma boa impressão: uma certeza que o teatro baiano sempre terá continuidade. No elenco estão: Adson Silvério, Aurora Dias, Bruno Neves, Danilo Rebouças, Juliana Zacharias, Kleper Gomes, Luisa Proserpio, Rita Leone, Val Perré, Bernardo D'el Rey, Eva Kowalska, João Paranhos, Margareth Xavier, Neiva Cristtall e Sergio Maia.
15.5.04
Brega demais! Um amigo copiou um CD de música brega para mim. A seleção é maravilhosa. Uma pérola. As músicas foram buscadas na internet. De Gretchen até Odair "Pare de tomar a pílula" José, passando por Sidnei Magal e Amado Batista. O disco fez o maior sucesso lá no trabalho. Foi um barato, uma gozação, com direito a chefe cantando "Não se vá", o hino de Jane e Herondi, em falsete. Enquanto eu cantava a outra parte.
Isso mesmo, acredite. O chefe imitava Jane e eu, Herondi. Bizarro. Que o povo de jornalismo nunca me veja fazendo isso...
Será que Paulinha vai convencer Caetano a cantar também "Pare de tomar a pílula" ou "Cadeira de Rodas" algum dia? Aí já é demais.
Isso mesmo, acredite. O chefe imitava Jane e eu, Herondi. Bizarro. Que o povo de jornalismo nunca me veja fazendo isso...
Será que Paulinha vai convencer Caetano a cantar também "Pare de tomar a pílula" ou "Cadeira de Rodas" algum dia? Aí já é demais.
As batalhas de Tróia
A maior parte dos fabulosos recursos do filme Tróia (EUA, 2004), com Brad Pitt, Eric Bana, Orlando Bloom e a bela Diane Kruger no papel de Helena, parece ter sido gasta, além de altos cachês, para construir os cenários do reino de Tróia e nas cenas de guerra. E a história se resume a isso: batalhas e mais batalhas, no gênero saia-e-sandália, reinaugurado no cinema por Gladiador.
Pelo menos são cenas em que a violência não é mostrada com detalhes sórdidos, no quais o cinema americano atual vem se consagrando. Dá para assistir sem pensar em fechar os olhos. O destaque é para a luta entre Aquiles (Pitt) e Heitor (Bana). Por vezes, os traços finos e delicados de Brad Pitt não combinam com a aridez do guerreiro. O ator está mais convincente em Clube da Luta.
O diretor Wolfgang Petersen se sai bem na criação das cenas de luta. Mas, após quase três horas de duração, nas sequências da última batalha, o som é substituído por uma cantilena monótona - ainda que bela. É como se o diretor atestasse que já estava cansativo e repetitivo demais.
Os deuses da mitologia grega, presentes em A Ilíada, de Homero, em que o filme se baseou, foram esquecidos. A obra original, que relata a guerra de Tróia, é um dos cânones, isto é, uma das obras fundamentais da literatura ocidental. O cinema fica devendo uma produção mais instrutiva, que conte, por exemplo, a origem do ponto fraco de Aquiles: o famoso calcanhar. Aí o roteiro teria que entrar de cabeça no mundo dos deuses gregos.
A maior parte dos fabulosos recursos do filme Tróia (EUA, 2004), com Brad Pitt, Eric Bana, Orlando Bloom e a bela Diane Kruger no papel de Helena, parece ter sido gasta, além de altos cachês, para construir os cenários do reino de Tróia e nas cenas de guerra. E a história se resume a isso: batalhas e mais batalhas, no gênero saia-e-sandália, reinaugurado no cinema por Gladiador.
Pelo menos são cenas em que a violência não é mostrada com detalhes sórdidos, no quais o cinema americano atual vem se consagrando. Dá para assistir sem pensar em fechar os olhos. O destaque é para a luta entre Aquiles (Pitt) e Heitor (Bana). Por vezes, os traços finos e delicados de Brad Pitt não combinam com a aridez do guerreiro. O ator está mais convincente em Clube da Luta.
O diretor Wolfgang Petersen se sai bem na criação das cenas de luta. Mas, após quase três horas de duração, nas sequências da última batalha, o som é substituído por uma cantilena monótona - ainda que bela. É como se o diretor atestasse que já estava cansativo e repetitivo demais.
Os deuses da mitologia grega, presentes em A Ilíada, de Homero, em que o filme se baseou, foram esquecidos. A obra original, que relata a guerra de Tróia, é um dos cânones, isto é, uma das obras fundamentais da literatura ocidental. O cinema fica devendo uma produção mais instrutiva, que conte, por exemplo, a origem do ponto fraco de Aquiles: o famoso calcanhar. Aí o roteiro teria que entrar de cabeça no mundo dos deuses gregos.
14.5.04
Esconde-esconde
Gato adora caixa de papelão, qualquer uma. De televisão, de panela, de sapato. De qualquer produto novo que entra em casa. O gato pula dentro da caixa e fica arranhando as unhas no papelão. Ele gosta de ficar olhando de dentro para fora, esticando as orelhas, os olhos amarelos e o focinho. Disposto a brincar, avançando as patas para dar susto em quem se aproxima. Sim, gato gosta de assustar.
O gato fica embaixo do sofá, encondido pela beira da manta. Quando alguém passa, ele estica as patas rápidas para assustar. Não é para arranhar ou agredir. Canso de tomar sustos. Ás vezes ele fica no assento da cadeira, embaixo da mesa da sala. Quando vou passando por perto, lá vem aquele movimento rápido da pata. É susto na certa. Parece que o gato fica dando risada. Algumas vezes sei que ele está ali e passo devagarzinho, só para vê-lo tentar me dar susto.
Gato adora entrar dentro de qualquer armário ficar lá quietinho, escondido. Quando alguém se esquece e fecha a porta, ele fica lá miando, para que alguém abra. Outro dia, eu estava no computador e ouvindo aquele miado bem distante. Comecei a procurar o gato pela casa - e nada. Comecei a imaginar - pesadelo dos pesadelos - que o gato havia se jogado janela abaixo. Fui procurando, procurando. O gato estava dentro do armário da cozinha, embaixo da pia, junto das panelas. Miando pela liberdade.
O gato fica embaixo do sofá, encondido pela beira da manta. Quando alguém passa, ele estica as patas rápidas para assustar. Não é para arranhar ou agredir. Canso de tomar sustos. Ás vezes ele fica no assento da cadeira, embaixo da mesa da sala. Quando vou passando por perto, lá vem aquele movimento rápido da pata. É susto na certa. Parece que o gato fica dando risada. Algumas vezes sei que ele está ali e passo devagarzinho, só para vê-lo tentar me dar susto.
Gato adora entrar dentro de qualquer armário ficar lá quietinho, escondido. Quando alguém se esquece e fecha a porta, ele fica lá miando, para que alguém abra. Outro dia, eu estava no computador e ouvindo aquele miado bem distante. Comecei a procurar o gato pela casa - e nada. Comecei a imaginar - pesadelo dos pesadelos - que o gato havia se jogado janela abaixo. Fui procurando, procurando. O gato estava dentro do armário da cozinha, embaixo da pia, junto das panelas. Miando pela liberdade.
13.5.04
Os dias passam inertes e cheios de dúvidas. A maior expectativa, sempre, é a chegada do final de semana e as suas horas livres de descanso, bate-papo, leitura e programações extras. Hoje, no entanto, alguma coisa muda no cenário. O bate-papo vai rolar no Bistrô PortoSol, na Barra. Cervejinha e salsichón. Quem sabe até um prato de goulash. Uma pequena porção de saída da rotina.
Ontem, lá mesmo no bistrô, teve lançamento da "última" edição da Província da Bahia, conforme o e-mail recebido. Achei "última" uma palavra dúbia. Última seria a mais recente ou a edição terminal do jornal? A saber.
Ontem, lá mesmo no bistrô, teve lançamento da "última" edição da Província da Bahia, conforme o e-mail recebido. Achei "última" uma palavra dúbia. Última seria a mais recente ou a edição terminal do jornal? A saber.
Fescenino [do latim fescenninus] ADJ. E S. M. 1. que ou o que tem caráter obsceno, licencioso; difamador , devasso 2. gênero de versos licenciosos e injuriosos, muito cultivados entre os antigos romanos; ou o que se diz sobre esse gênero.
Diário de um Fescenino é uma tentativa de Rubem Foseca em sair do gênero policial que o consagrou. Escrito em forma de diário, o autor tenta enveredar pelo terreno da concupiscência. Só que as melhores partes do livro são justamente aquelas em que a narrativa torna-se ágil por conta dos acontecimentos que envolvem assuntos criminosos. É aí que o talento de Rubem Fonseca brilha: é o momento em que o leitor é conquistado - e não consegue mais largar a leitura.
Cheio de referências a clássicos da literatura universal, o texto (o autor?) por vezes parece um tanto pedante, dando a impressão de dizer ao leitor: "Olhe quantos livros já li, você não leu nem a metade". Em Diário de um Fescenino, Rubem Fonseca tem uma estratégia de escrita semelhante à de João Ubaldo Ribeiro. Em meio à narrativa predominantemente coloquial, salpica algumas palavras difíceis, pouco conhecidas, que fazem o leitor ir ao dicionário.
A parte inicial do livro se mantém no diário de aventuras sexuais do protagonista, um libidinoso escritor em decadência, que inicia um romance secreto com duas mulheres, mãe e filha, ao mesmo tempo. Do meio para o fim, acontecem as acusações e crimes.
Até entrar na parte policialesca, o personagem a todo momento questiona o seu trabalho de escrita. Há uma espécie de brincadeira, em forma de metanarrativa, em que o escritor fictício reclama ser confundido com seus personagens. Dá a impressão que Rubem Fonseca quis mandar o recado para não o confundirem com as suas criações.
Diário de um Fescenino é uma tentativa de Rubem Foseca em sair do gênero policial que o consagrou. Escrito em forma de diário, o autor tenta enveredar pelo terreno da concupiscência. Só que as melhores partes do livro são justamente aquelas em que a narrativa torna-se ágil por conta dos acontecimentos que envolvem assuntos criminosos. É aí que o talento de Rubem Fonseca brilha: é o momento em que o leitor é conquistado - e não consegue mais largar a leitura.
Cheio de referências a clássicos da literatura universal, o texto (o autor?) por vezes parece um tanto pedante, dando a impressão de dizer ao leitor: "Olhe quantos livros já li, você não leu nem a metade". Em Diário de um Fescenino, Rubem Fonseca tem uma estratégia de escrita semelhante à de João Ubaldo Ribeiro. Em meio à narrativa predominantemente coloquial, salpica algumas palavras difíceis, pouco conhecidas, que fazem o leitor ir ao dicionário.
A parte inicial do livro se mantém no diário de aventuras sexuais do protagonista, um libidinoso escritor em decadência, que inicia um romance secreto com duas mulheres, mãe e filha, ao mesmo tempo. Do meio para o fim, acontecem as acusações e crimes.
Até entrar na parte policialesca, o personagem a todo momento questiona o seu trabalho de escrita. Há uma espécie de brincadeira, em forma de metanarrativa, em que o escritor fictício reclama ser confundido com seus personagens. Dá a impressão que Rubem Fonseca quis mandar o recado para não o confundirem com as suas criações.
12.5.04
Disposição
"Há escritores que escrevem para viver, como Balzac, e outros que vivem para escrever, como Flaubert. Depois que escrevi esses dois nomes, lembrei-me que o primeiro dizia que a sua capacidade de escrever dependia de quanto esperma mantivesse no corpo enquanto se dedicava à literatura; e que o segundo afirmava que desperdiçar uma onça de esperma fatigava mais do que perder três litros de sangue.", Diário de um Fescenino, Rubem Fonseca.
Eu havia gostado muito desse trecho. Por coincidência, é o pedaço selecionado do livro no site do escritor, no portal Literal.
"Há escritores que escrevem para viver, como Balzac, e outros que vivem para escrever, como Flaubert. Depois que escrevi esses dois nomes, lembrei-me que o primeiro dizia que a sua capacidade de escrever dependia de quanto esperma mantivesse no corpo enquanto se dedicava à literatura; e que o segundo afirmava que desperdiçar uma onça de esperma fatigava mais do que perder três litros de sangue.", Diário de um Fescenino, Rubem Fonseca.
Eu havia gostado muito desse trecho. Por coincidência, é o pedaço selecionado do livro no site do escritor, no portal Literal.
Tentações
Jane (Frances McDorman) é veterana produtora de discos e moradora da rua Laurel Canyon, em Hollywood, Los Angeles. Ela produz o disco de uma banda de pop-rock inglês e namora o vocalista, que é 16 anos mais jovem. O filho de Jane, Sam (Christian Bale) é médico recém-formado em Harvard e volta, junto com a noiva Alex (Kate Beckinsale), para continuar os estudos em Los Angeles. Conservador, Sam não aceita bem o modo de vida da mãe. Mas, aos poucos, Alex, a noiva, se deixa seduzir pelo estilo de vida que inclui sexo, drogas e rock’n’roll. O filme é Laurel Canyon - rua das tentações (EUA, 2002).
Pais loucos, filhos caretas é o assunto principal de um drama que vai adquirindo tons de comédia inteligente. No filme, o conservadorismo é mostrado como uma capa que encoberta vários medos. O jovem médico tem medo dos seus sentimentos, medo de ousar em seus relacionamentos, medo de se mostrar por inteiro. Já a mãe, a “louca”, tem mais coerência entre o que sente e suas ações.
O tema não é inédito, mas a diretora e também roteirista Lisa Cholodenko dá um ritmo agradável à narrativa. Ousada, em algumas cenas, mas sem conseguir escapar de clichês, em outras. O som, como é de se esperar, é ponto alto no filme. As músicas são cantadas pelo ator Alessando Nivola, que faz o papel de Ian, o vocalista da banda.
Pais loucos, filhos caretas é o assunto principal de um drama que vai adquirindo tons de comédia inteligente. No filme, o conservadorismo é mostrado como uma capa que encoberta vários medos. O jovem médico tem medo dos seus sentimentos, medo de ousar em seus relacionamentos, medo de se mostrar por inteiro. Já a mãe, a “louca”, tem mais coerência entre o que sente e suas ações.
O tema não é inédito, mas a diretora e também roteirista Lisa Cholodenko dá um ritmo agradável à narrativa. Ousada, em algumas cenas, mas sem conseguir escapar de clichês, em outras. O som, como é de se esperar, é ponto alto no filme. As músicas são cantadas pelo ator Alessando Nivola, que faz o papel de Ian, o vocalista da banda.
11.5.04
Cores
O local em que trabalho, no oitavo andar de um prédio da Avenida Sete de Setembro, em Salvador, tem uma bela vista do pôr-do-sol na Baía de Todos os Santos. A depender da estação do ano, as cores mudam, variando a mescla do azul, prata, dourado, alaranjado, chegando ao vermelho que lembra o poente do cerrado, no centro do país.
O pôr-do-sol do verão é o mais belo de todos. Na Barra, no finalzinho da Baía de Todos os Santos, o sol se torna uma bola enorme, de contorno delimitado. Um espetáculo, já cantado por Baby Consuelo na época dos Novos Baianos. "Quando o sol se põe, vem o farol, iluminar as águas da Bahia". Lembrança de uma época em que o Farol da Barra amontoava hippies cabeludos, dispostos a gastar o tempo tranquilamente observando os espetáculos da natureza.
Em Salvador, a região da Avenida Contorno, Gamboa, Aflitos, Rua dos Ingleses, além dos prédios mais altos no Centro da cidade, têm o privilégio da bela visão da Baía e seu pôr-do-sol. O Hotel Clock, na região do Largo Dois de Julho, que um dia teve muito charme e hoje é conhecido como motel das criaturas noturnas que perambulam pela Avenida Carlos Gomes, tem uma vista fenomenal, quase debruçada sobre águas tranquilas.
A Avenida Contorno, Gamboa e Aflitos formam uma região até algum tempo decadente e pouco valorizada. O contexto está mudando. Vários empreendimentos comerciais e turísticos voltam a se instalar no local, aumentando o preço dos imóveis.
A desvantagem de quem mora por alí é que a visão da beleza das águas contrasta com o calor que faz nos imóveis, em grande parte voltados para o poente. Mas nada que um bom ar-condicionado não resolva.
10.5.04
Diários de Motocicleta
O filme Diários de Motocicleta retrata a viagem de moto por vários países sul-americanos, feita pelo estudante de Medicina Ernesto Guevara de la Serna (Gael García Bernal), de 23 anos, antes de se tornar o líder guerrilheiro Che Guevara, em companhia de seu amigo Alberto Granado (Rodrigo de la Serna), um bioquímico de 29 anos. O ator Rodrigo é primo em segundo grau de Che Guevara. A aventura a bordo da motocicleta La Poderosa, que cai aos pedaços, é menos importante do que a descoberta de um mundo de pobreza e desigualdade social que irá motivar o futuro guerrilheiro a lutar por melhores condições sociais na América Latina.
Ernesto e Alberto partem da Argentina até chegar no Leprosário de San Pablo, na Amazônia peruana, onde os dois trabalham por três semanas. Em algumas sequências, o filme deixa a ficção de lado e adquire certo tom documental, com a interação dos atores em conversas com habitantes e trabalhadores das regiões em que passam.
O filme é baseado nos livros “Notas de Viaje”, de Guevara e “Con Che por Sudamerica”, de Granado. O projeto, que levou cinco anos para ficar pronto, contou com a participação do próprio Granado, hoje com 82 anos, que veio para o lançamento do filme no Brasil.
O ator mexicano Gael Garcia Bernal está primoroso como o jovem Ernesto. Acerta ao conjugar a imagem de um jovem médico, de saúde frágil, que sofre de asma, com o idealista que começa a surgir a partir da viagem.
Com mais de 30 locações na Argentina, Chile e Peru, Diários de Motocicleta relata a viagem por uma América tão próxima dos brasileiros e ao mesmo tempo tão desconhecida. A bela fotografia, além das paisagens, mostra em preto-e-branco alguns tipos humanos característicos dos países em que há a filmagem. Nessas cenas, o enquadramento estático feito pela câmera transforma os personagens em fotos vivas, situadas no ano de 1952, quando a história transcorre. Mas que podem ser encontradas até hoje, com as mesmas expressões faciais que revelam o sofrimento da pobreza. Dá a impressão de que a história da América Latina ainda está por ser contada pelo cinema.
O filme Diários de Motocicleta retrata a viagem de moto por vários países sul-americanos, feita pelo estudante de Medicina Ernesto Guevara de la Serna (Gael García Bernal), de 23 anos, antes de se tornar o líder guerrilheiro Che Guevara, em companhia de seu amigo Alberto Granado (Rodrigo de la Serna), um bioquímico de 29 anos. O ator Rodrigo é primo em segundo grau de Che Guevara. A aventura a bordo da motocicleta La Poderosa, que cai aos pedaços, é menos importante do que a descoberta de um mundo de pobreza e desigualdade social que irá motivar o futuro guerrilheiro a lutar por melhores condições sociais na América Latina.
Ernesto e Alberto partem da Argentina até chegar no Leprosário de San Pablo, na Amazônia peruana, onde os dois trabalham por três semanas. Em algumas sequências, o filme deixa a ficção de lado e adquire certo tom documental, com a interação dos atores em conversas com habitantes e trabalhadores das regiões em que passam.
O filme é baseado nos livros “Notas de Viaje”, de Guevara e “Con Che por Sudamerica”, de Granado. O projeto, que levou cinco anos para ficar pronto, contou com a participação do próprio Granado, hoje com 82 anos, que veio para o lançamento do filme no Brasil.
O ator mexicano Gael Garcia Bernal está primoroso como o jovem Ernesto. Acerta ao conjugar a imagem de um jovem médico, de saúde frágil, que sofre de asma, com o idealista que começa a surgir a partir da viagem.
Com mais de 30 locações na Argentina, Chile e Peru, Diários de Motocicleta relata a viagem por uma América tão próxima dos brasileiros e ao mesmo tempo tão desconhecida. A bela fotografia, além das paisagens, mostra em preto-e-branco alguns tipos humanos característicos dos países em que há a filmagem. Nessas cenas, o enquadramento estático feito pela câmera transforma os personagens em fotos vivas, situadas no ano de 1952, quando a história transcorre. Mas que podem ser encontradas até hoje, com as mesmas expressões faciais que revelam o sofrimento da pobreza. Dá a impressão de que a história da América Latina ainda está por ser contada pelo cinema.
8.5.04
Boemia
Na varanda, na rede, lendo Diário de um Fescenino, de Rubem Fonseca. Na rua em que moro, não há prédios altos. Na calçada daquele que fica quase em frente ao meu apartamento, há uma árvore enorme, mais alta que o prédio de três andares. Se deito na rede virado para um lado, vejo o Hotel Pestana e o Ibis. Se deito virado para o outro, vejo somente a copa da árvore e o céu azul da orla de Salvador. Dá para me sentir como se estivesse no campo.
Depois de preparar o almoço, convidei minha amiga E. para me acompanhar. Ela trouxe cervejas pretas para a gente bebericar e um sorvete fino para a sobremesa. Conversamos, ela me contou sobre a sua última viagem. Os seus olhos, agora mais vivos, ainda trazem um resíduo de tristeza pelos últimos acontecimentos. Depois do almoço e de um cálice de licor, ela foi para casa e carregou o DVD de Amnésia, com Guy Pearce, para assistir.
Voltei para a rede, para continuar a leitura e dormi o sono ingênuo da tarde. Acordei já anoitecendo. Eu sou bem aquilo que a piada infame chama de "bom de cama": é só encostar que já estou dormindo. Antes de sair, E. me convidou para a reinauguração da Casa Oito, um misto de bar e espaço cultural que fica na Rua Fonte do Boi. Preferi ficar em casa, lendo e escrevendo.
Aquela região do Rio Vermelho está cada vez mais fervilhante. Companhia da Pizza, Aogobom, Toca do Caranguejo, um novo bar mexicano, que ainda não conheci, entre vários outros bares e restaurantes. O centro boêmio do bairro parece estar se deslocando da tradicional Rua da Paciência para lá.
Depois que o Alambique fechou, parece que a Rua da Paciência perdeu um pouco da sua agitação. Bares e boates abrem e fecham num piscar de olhos. Só o restaurante Las Margaritas tem se mantido firme.
O Alambique foi um caso especial na noite de Salvador. Era um bar que virava danceteria aos sábados. Aquilo que se costuma chamar de inferninho: quente e entupido de gente. Som bacana, variado, sem a impessoalidade da música eletrônica, ainda que o bate-estaca também marcasse presença. Ed Motta, Lisa Stansfield, Daúde, Carlinhos Brown, Diana King, Jamiroquai estavam sempre no set list dos DJs. Foi no Alambique que Luiz Santoro e Adriana Prates começaram a colocar som.
Coroando o astral do recinto, a antológica imagem de Iemanjá, no topo da escada de madeira, que une os dois andares da casa. Das janelas do bar era possível ver a Praia da Paciência. O Alambique era quase um clube, uma confraria. Muita gente que se conhecia de frequentar o Extudo, que até hoje fica ali perto, na rua da Medalha Milagrosa. É este o nome da rua, se não me engano. O Extudo já teve um público mais agitado. Quando as mesas lotavam, as pessoas ficavam na calçada, pegando cerveja no Rio de Janeiro, o boteco que havia ao lado, e consumindo algumas cositas para relaxar e animar a noite. Tempos bons.
Bom, o comentário do livro de Rubem Fonseca fica para depois. O Rio Vermelho falou mais alto.
Depois de preparar o almoço, convidei minha amiga E. para me acompanhar. Ela trouxe cervejas pretas para a gente bebericar e um sorvete fino para a sobremesa. Conversamos, ela me contou sobre a sua última viagem. Os seus olhos, agora mais vivos, ainda trazem um resíduo de tristeza pelos últimos acontecimentos. Depois do almoço e de um cálice de licor, ela foi para casa e carregou o DVD de Amnésia, com Guy Pearce, para assistir.
Voltei para a rede, para continuar a leitura e dormi o sono ingênuo da tarde. Acordei já anoitecendo. Eu sou bem aquilo que a piada infame chama de "bom de cama": é só encostar que já estou dormindo. Antes de sair, E. me convidou para a reinauguração da Casa Oito, um misto de bar e espaço cultural que fica na Rua Fonte do Boi. Preferi ficar em casa, lendo e escrevendo.
Aquela região do Rio Vermelho está cada vez mais fervilhante. Companhia da Pizza, Aogobom, Toca do Caranguejo, um novo bar mexicano, que ainda não conheci, entre vários outros bares e restaurantes. O centro boêmio do bairro parece estar se deslocando da tradicional Rua da Paciência para lá.
Depois que o Alambique fechou, parece que a Rua da Paciência perdeu um pouco da sua agitação. Bares e boates abrem e fecham num piscar de olhos. Só o restaurante Las Margaritas tem se mantido firme.
O Alambique foi um caso especial na noite de Salvador. Era um bar que virava danceteria aos sábados. Aquilo que se costuma chamar de inferninho: quente e entupido de gente. Som bacana, variado, sem a impessoalidade da música eletrônica, ainda que o bate-estaca também marcasse presença. Ed Motta, Lisa Stansfield, Daúde, Carlinhos Brown, Diana King, Jamiroquai estavam sempre no set list dos DJs. Foi no Alambique que Luiz Santoro e Adriana Prates começaram a colocar som.
Coroando o astral do recinto, a antológica imagem de Iemanjá, no topo da escada de madeira, que une os dois andares da casa. Das janelas do bar era possível ver a Praia da Paciência. O Alambique era quase um clube, uma confraria. Muita gente que se conhecia de frequentar o Extudo, que até hoje fica ali perto, na rua da Medalha Milagrosa. É este o nome da rua, se não me engano. O Extudo já teve um público mais agitado. Quando as mesas lotavam, as pessoas ficavam na calçada, pegando cerveja no Rio de Janeiro, o boteco que havia ao lado, e consumindo algumas cositas para relaxar e animar a noite. Tempos bons.
Bom, o comentário do livro de Rubem Fonseca fica para depois. O Rio Vermelho falou mais alto.
7.5.04
Contradição
O amor me conquistou, me dominou. O amor me fez rezar todas as orações de amparo. O amor me provocou com todos os seus cheiros e suas delícias. O amor recusou todos os meus convites. Um dia, o amor cedeu.
O amor me convidou a entrar em um mundo desconhecido. O amor me instigou a me desconhecer. O amor revelou a sua face mais bondosa e a mais perversa.
O amor conquistou todos os meus pertences, as minhas insinuações. Devorou os meus conflitos, gerou várias inquisições. O amor concebeu um ser renovado. O amor criou um ente disforme, com suas leis e razões.
O amor me deu um beijo de alívio e um suspiro renovado. O amor, que legou ao mundo as rídículas ações, e a poesia contida. O amor me desbancou no comando dos meus atos. Fez, refez e desfez. Conteve o meu desespero e instituiu nova realidade. O amor é um ser mitológico de dez cabeças, de todos os dez mil pecados do mundo.
O amor lustrou o meu orgulho e decretou a minha prisão. O amor me separou de todos os meus utensílios de perversão. O amor realizou um trabalho inimaginável. Dançou comigo por toda a festa dos meus 300 anos e algumas encarnações.
O amor dedicou-se a apertar todos os pinos da máquina do meu tempo. A ativar os cavalos de batalha da mente. A desativar os assuntos dolorosos. A reagir contra provocações.
O amor me transformou em uma criança reticente. O amor descontrolou o meu peso e as infiltrações da alma. O amor me cegou, me fez perder o ego e recuperar a estima. O amor criou vários conflitos. O amor escreveu um monte de palavras desconexas. E desaguou em um rio de prazeres.
O amor me conquistou, me dominou. O amor me fez rezar todas as orações de amparo. O amor me provocou com todos os seus cheiros e suas delícias. O amor recusou todos os meus convites. Um dia, o amor cedeu.
O amor me convidou a entrar em um mundo desconhecido. O amor me instigou a me desconhecer. O amor revelou a sua face mais bondosa e a mais perversa.
O amor conquistou todos os meus pertences, as minhas insinuações. Devorou os meus conflitos, gerou várias inquisições. O amor concebeu um ser renovado. O amor criou um ente disforme, com suas leis e razões.
O amor me deu um beijo de alívio e um suspiro renovado. O amor, que legou ao mundo as rídículas ações, e a poesia contida. O amor me desbancou no comando dos meus atos. Fez, refez e desfez. Conteve o meu desespero e instituiu nova realidade. O amor é um ser mitológico de dez cabeças, de todos os dez mil pecados do mundo.
O amor lustrou o meu orgulho e decretou a minha prisão. O amor me separou de todos os meus utensílios de perversão. O amor realizou um trabalho inimaginável. Dançou comigo por toda a festa dos meus 300 anos e algumas encarnações.
O amor dedicou-se a apertar todos os pinos da máquina do meu tempo. A ativar os cavalos de batalha da mente. A desativar os assuntos dolorosos. A reagir contra provocações.
O amor me transformou em uma criança reticente. O amor descontrolou o meu peso e as infiltrações da alma. O amor me cegou, me fez perder o ego e recuperar a estima. O amor criou vários conflitos. O amor escreveu um monte de palavras desconexas. E desaguou em um rio de prazeres.
6.5.04
O Senado derrubou a MP que proibia os bingos. Com as todas as implicações -a exemplo de negociatas e muita lavagem de dinheiro -, para o descrédito do Governo Federal. Agora, aqueles que vão às jogatinas para passar o tempo e se socializar, voltam a ter o seu espaço. Tem muita gente que não precisa de bingo. As pessoas se reunem em suas casas ou locais alugados. Conheço um apartamento quarto-e-sala, em local aprazível de Salvador, utilizado somente para reuniões de jogo entre conhecidos.
Particularmente, acho a jogatina uma perda de tempo. Prefiro ler livro, jornal, revista, ver filme, navegar na internet, caminhar ou simplemente bater-papo com os amigos. De vez em quando, tudo bem, é até interessante um joguinho de cartas. Mas acho que uma reunião com amigos pode ser melhor aproveitada, com tanta coisa para ser conversada e discutida, em lugar de ficar raciocinando com jogadas. Por vezes, tenho a impressão de que o tempo gasto de jogo é algo que nada acrescenta.
Também acho, por outro lado, que o jogo é um bom passatempo para aqueles que têm espírito competitivo e algum tempo livre. Não é o meu caso.
Particularmente, acho a jogatina uma perda de tempo. Prefiro ler livro, jornal, revista, ver filme, navegar na internet, caminhar ou simplemente bater-papo com os amigos. De vez em quando, tudo bem, é até interessante um joguinho de cartas. Mas acho que uma reunião com amigos pode ser melhor aproveitada, com tanta coisa para ser conversada e discutida, em lugar de ficar raciocinando com jogadas. Por vezes, tenho a impressão de que o tempo gasto de jogo é algo que nada acrescenta.
Também acho, por outro lado, que o jogo é um bom passatempo para aqueles que têm espírito competitivo e algum tempo livre. Não é o meu caso.
5.5.04
Terrir
Mesmo com a ilustre presença do Conde Drácula, Lobisomem e da criatura Frankenstein, o filme Van Helsing - O Caçador de Monstros (EUA, 2004) transforma o terror em aventura e faz lembrar os filmes de Indiana Jones e Tarzan. A direção e o roteiro são de Stephen Sommers.
Hugh Jackman (o Wolverine, de X-Men) faz o papel de Gabriel Van Helsing, contratado pela Igreja para caçar o conde Drácula (Richard Roxburgh). Ao seu lado ele terá a ajuda de Anna Valerious (Kate Beckinsale, de Anjos da Noite e Pearl Harbor), descendente de uma família destruída pelo vampiro. A história se passa no século XIX.
Com muitos efeitos em computador e a ironia característica dos hérois de filmes de aventura, Van Helsing tende para a comédia em ritmo frenético da aventura. O filme tem aquele padrão de superprodução que só os americanos sabem fazer - ou têm condição para tanto. Van Helsing foi inicialmente planejado para ser uma sequência de Drácula de Bram Stoker (1992). As filmagens ocorreram em Praga, na República Tcheca.
Mesmo com a ilustre presença do Conde Drácula, Lobisomem e da criatura Frankenstein, o filme Van Helsing - O Caçador de Monstros (EUA, 2004) transforma o terror em aventura e faz lembrar os filmes de Indiana Jones e Tarzan. A direção e o roteiro são de Stephen Sommers.
Hugh Jackman (o Wolverine, de X-Men) faz o papel de Gabriel Van Helsing, contratado pela Igreja para caçar o conde Drácula (Richard Roxburgh). Ao seu lado ele terá a ajuda de Anna Valerious (Kate Beckinsale, de Anjos da Noite e Pearl Harbor), descendente de uma família destruída pelo vampiro. A história se passa no século XIX.
Com muitos efeitos em computador e a ironia característica dos hérois de filmes de aventura, Van Helsing tende para a comédia em ritmo frenético da aventura. O filme tem aquele padrão de superprodução que só os americanos sabem fazer - ou têm condição para tanto. Van Helsing foi inicialmente planejado para ser uma sequência de Drácula de Bram Stoker (1992). As filmagens ocorreram em Praga, na República Tcheca.
4.5.04
Impressionista
Os dias de inverno andam lentos, mas ansiosos. Andam quase tristes, andam meio inertes. Andam gulosos pelo frio. Querem chocolate . Andam com a lua fora de curso e quase retrógrados. Beiram os infernos astrais. Desfilam princípios de angústia, que logo, logo passam. Esses dias tentam os paladares com pratos encorpados e untuosos.
São esses dias em que o dendê esfria rápido e que o acarajé perde a malícia. O tempo dos queijos e quejandos. Tempo dos quereres e dos vinhos para banhar o corpo. Das luzes para explodir em cores. O ciclo lento que emperra o caminho natural das correntes.
Em breve, as cantigas falarão alto, os tambores arderão. As imagens abrirão os olhos. Tudo será brilhante e ofuscante. Os frutos serão coloridos, retornam a Cezanne. As ondas estalarão como açoites. O passeio não será interrompido. E tudo volta a ser como uma vez, quase inesquecível, foi.
Os dias de inverno andam lentos, mas ansiosos. Andam quase tristes, andam meio inertes. Andam gulosos pelo frio. Querem chocolate . Andam com a lua fora de curso e quase retrógrados. Beiram os infernos astrais. Desfilam princípios de angústia, que logo, logo passam. Esses dias tentam os paladares com pratos encorpados e untuosos.
São esses dias em que o dendê esfria rápido e que o acarajé perde a malícia. O tempo dos queijos e quejandos. Tempo dos quereres e dos vinhos para banhar o corpo. Das luzes para explodir em cores. O ciclo lento que emperra o caminho natural das correntes.
Em breve, as cantigas falarão alto, os tambores arderão. As imagens abrirão os olhos. Tudo será brilhante e ofuscante. Os frutos serão coloridos, retornam a Cezanne. As ondas estalarão como açoites. O passeio não será interrompido. E tudo volta a ser como uma vez, quase inesquecível, foi.
A gente nunca sabe se essas coisas que são publicadas na Internet são verdadeiras. Este site dedica-se a contar algumas versões cabeludas sobre o atentado de 11 de setembro e sobre a presença de tropas americanas no Iraque, incluindo a informação de que existiriam bombas dentro do WTC e que não havia árabes dentro do avião que caiu próximo da Casa Branca. Será que é verdade?
2.5.04
Balé com tempero popular
Ela é baixinha, ágil e leve. Ana Botafogo, a primeira-bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Uma pluma bailando no Teatro Castro Alves, no espetáculo Três Momentos de Amor, em turnê nacional, acompanhada por dois bailarinos (um deles, Edyfrank Alves, de Salvador), em parceria com a pianista Lilian Barretto e mais cinco instrumentistas tocando violino, viola, violoncelo, sopros e percussão.
As coreografias foram embaladas por canções de amor de Villa-Lobos, Piazolla, Cartola, Vinícius de Moraes, Tom Jobim e Chico Buarque. Ana Botafogo executa movimentos delicados do balé clássico, sob o som de músicas populares. Um casamento perfeito. Ela parece voar, parece não pesar mais do que alguns gramas. Uma energia menos agressiva do que se costuma ver nos espetáculos de dança moderna, permeados muitas vezes de experimentalismos, distensões físicas pesadas e excessivas, além de críticas sociais. Ainda que tudo isso tenha o seu lugar na arte.
Em algumas sequências, os músicos tocam sem a presença dos bailarinos. Um outro espetáculo, dentro do espetáculo de dança. É fascinante acompanhar, por exemplo, "Eu sei que vou te amar", de Tom Jobim e Vinícius, na forma instrumental, ao vivo. Um resultado quase divino. Não era para revelar isso, mas quase fui à lágrimas. :-)
As coreografias foram embaladas por canções de amor de Villa-Lobos, Piazolla, Cartola, Vinícius de Moraes, Tom Jobim e Chico Buarque. Ana Botafogo executa movimentos delicados do balé clássico, sob o som de músicas populares. Um casamento perfeito. Ela parece voar, parece não pesar mais do que alguns gramas. Uma energia menos agressiva do que se costuma ver nos espetáculos de dança moderna, permeados muitas vezes de experimentalismos, distensões físicas pesadas e excessivas, além de críticas sociais. Ainda que tudo isso tenha o seu lugar na arte.
Em algumas sequências, os músicos tocam sem a presença dos bailarinos. Um outro espetáculo, dentro do espetáculo de dança. É fascinante acompanhar, por exemplo, "Eu sei que vou te amar", de Tom Jobim e Vinícius, na forma instrumental, ao vivo. Um resultado quase divino. Não era para revelar isso, mas quase fui à lágrimas. :-)
A sexta-feira foi de muita chuva e muito trabalho. Sem disposição para sair à noite. O sábado teve sushi, filme meia-boca e uma peça teatral. Domingo de feijoada light (se é que isso é possível), a quinta temporada de Sex and the City - isso mesmo, já tem na locadora. Daqui a pouco tem Ana Botafogo no TCA. Junto a tudo isso, uma preguiça incrível de raciocinar e escrever alguma coisa no blog.
Só quero ver e ler. Não há muita energia disponível para exprimir o que penso. Acho que não ando pensando em nada com muita consistência. Talvez um pouco anestesiado pela semana conturbada de mudanças no trabalho. Momentos que mexem com a gente. E nos provocam ações. É também época de dizer coisas, verbalizando aquilo que nos incomoda. Pausa para pensar.
Renoir (detalhe)
Só quero ver e ler. Não há muita energia disponível para exprimir o que penso. Acho que não ando pensando em nada com muita consistência. Talvez um pouco anestesiado pela semana conturbada de mudanças no trabalho. Momentos que mexem com a gente. E nos provocam ações. É também época de dizer coisas, verbalizando aquilo que nos incomoda. Pausa para pensar.
Renoir (detalhe)